Camila Lordelo da Euliricas

Viver de espalhar poesia

Mariana Castro
bradesco
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6 min readDec 3, 2018

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No Natal de 2016, Camila Lordelo chegou em casa depois de um dia exaustivo de trabalho. Sentou-se no chão, cansada. Contou quanto dinheiro tinha feito e comemorou. “Que orgulho! Se cheguei até aqui, vou adiante”, pensou. Empreendendo sozinha, ralando muito e apostando em algo feito com amor, havia transformado em realidade o sonho de viver — e de espalhar — poesia.

Ali, resolveu pegar o último freela como publicitária e se dedicar à sua empresa. Hoje, a EuLíricas vende joias e objetos com poesia, tanto pela loja on-line como no ateliê localizado em uma rua simpática da Vila Madalena. Também marca presença em feiras, como o Mercado Manual, e atende grandes empresas, para as quais faz “entregas poéticas”.

foto: intragram.com/euliricas

Camila se emociona ao contar algumas histórias de clientes que levam ou recebem poemas por meio das peças que ela produz. Uma dessas clientes foi buscar em sua casa um colar para presentear a amiga, chamada Sol, que havia perdido um bebê. No colar, a frase: Sempre sol aqui dentro. Às vezes, Camila recebe fotos de pessoas que tatuaram no corpo trechos de poemas seus. São nessas ocasiões que ela tem a certeza de estar no caminho certo, já que o seu maior desejo é deixar as pessoas mais perto da poesia.

A jornada como empreendedora começou três anos antes daquele Natal. Baiana de sotaque arrastado e bem-humorada, Camila sempre gostou de escrever. Acabou virando publicitária. Em 2013, ela trabalhava em uma grande agência, em São Paulo, como redatora. Seus textos eram orientados para atender o cliente. Faltava liberdade para criar. Ainda que todos os projetos “de chorar”, mais sensíveis e com uma pegada emotiva, fossem encaminhados para ela, ficava difícil fazer uma escrita mais autoral.

Entre um trabalho e outro, escrevia poemas — e morria de vontade de poder se dedicar bem mais a eles. Fazia cursos, estudava, pesquisava. Enquanto experimentava formatos originais de levar poesia às pessoas, bordou uma toalha de picnic com a frase: Alimentar o riso, o corpo, a alma. A toalha fez sucesso, mas era inviável como produto. Ficou muito cara.

Um dia, enquanto andava pela cidade, Camila passou em frente a uma loja de porcelana e resolveu entrar. Para ela, foi como estar em um parque de diversão. Todos aqueles objetos brancos pediam uma intervenção. Levou algumas peças e com uma delas fez um colar para ela. A joia caiu no gosto das pessoas com quem trabalhava na agência. E, embora Camila ainda não soubesse, aquele era o começo da EuLíricas: uma empresa de fazer “poesia nas coisas”.

Que seja

Não era a primeira vez que Camila tocava um projeto paralelamente ao trabalho. Também em 2013, ela inventou a página Baiano Fala Assim, com gírias do estado em que nasceu. Em uma semana, mais de 5 mil seguidores já acompanhavam as publicações de posts e cards com expressões como “me armei” ou “bolo doido”. O número de seguidores chegou a 15 mil. As gírias extrapolaram o Facebook e começaram a estampar bonés e camisetas. Apesar do sucesso rápido e de apontar para um negócio promissor, não era exatamente aquilo que Camila sonhava em fazer.

Tanto que, seis meses depois, parou de atualizar os conteúdos e outras páginas inspiradas na dela pipocaram nas redes. Camila deixou a brincadeira de lado. (Mas, se você for a Salvador, com certeza vai se deparar com alguém usando algum acessório com as gírias). Da experiência, ficou a certeza de que era capaz de criar projetos bem-sucedidos. Se na agência ela tinha boas ideias para os outros, agora queria tirar do papel boas ideias para ela.

Foi quando entrou na agência usando o colar que havia feito. No pingente, estava escrito: Que seja.

No ano seguinte, Camila pediu demissão e passou dois meses em Paris, onde sua irmã morava. Escreveu, fotografou, passeou e criou o poema Joia do tempo, para traduzir o momento em que, pela primeira vez, se sentiu dona do próprio tempo. Nesse período, se deu conta de que fazia poesia com facilidade. Que os momentos em que escrevia eram os momentos em que estava mais feliz. “Se faço isso com tanta fluência, é isso o que tenho que fazer.”

Medo de empreender

Ao voltar para São Paulo, em novembro de 2014, começou a dar forma à empresa. Camila usou tudo o que tinha acumulado até ali na busca de como viabilizar a vida escrevendo. Misturou o conhecimento adquirido nos cursos de arte, os formatos pouco convencionais para produzir conteúdo que aprendeu em agências e a enorme vontade de fazer com que as pessoas pudessem experimentar poesia de forma simples.

Investiu R$ 100 para comprar algumas peças nas quais trabalharia. O catálogo da primeira coleção foi fotografado em cima de sua cama. Na sequência, apresentou o catálogo em museus e galerias. Camila achava que só nesses espaços conseguiria vender poema em objetos.

O primeiro museu a comprar suas peças foi o MAR. Do galerista, ela recebeu um retorno importante: pela primeira vez, um artista entregava tudo de forma organizada, com nota fiscal, no prazo e com potencial de escala. Com esse estímulo, ela começou a ganhar confiança. Outro estímulo veio de uma reportagem sobre seu trabalho, publicada em uma revista.

Assim, foi perdendo o medo de empreender. Camila cresceu vendo o pai empreendedor trabalhar demais. Por isso, não tinha vontade de abrir um negócio seu. Tanto pela insegurança financeira como pelo receio de não ter tempo para mais nada. Achava mais fácil ser funcionária.

Até se dar conta de que estava empreendendo para construir a vida que desejava viver e, de certa forma, para contribuir para o mundo fazendo poesia de forma acessível.

“Empreender está costurado com propósito. Tem a ver com a sua contribuição para o mundo e a sua contribuição para o seu mundo.”

Que nunca falte fé no peito

Para driblar o medo de empreender, Camila também foi estudar, fazer consultoria, buscar apoio. Sempre deu atenção à gestão financeira e conta com a ajuda de uma assistente na área de contabilidade. Até hoje, não para de buscar conhecimento quando o assunto é aprender a tocar um negócio. Ela sabe que, para crescer sem deixar de ter tempo livre, as coisas precisam estar organizadas.

De olho no futuro, a empreendedora imagina aonde pode chegar com a EuLíricas. Se a missão é espalhar poesia para cada vez mais pessoas, ela quer ganhar amplitude. Por que não publicar seus poemas nos muros das cidades? As histórias daqueles que são tocados por sua poesia e o desejo de levar o projeto a outros lugares é que não deixam Camila desistir de empreender.

De qualquer forma, para os momentos em que bate muito cansaço, quando as incertezas insistem em aparecer ou quando surgem ofertas sedutoras para voltar a trabalhar em agência, Camila tem sempre à mão seu bracelete. Nele, está um poema que reforça a decisão que tomou, sentada no chão de sua casa, no Natal de 2016: o de ir adiante.

“Que nunca me falte fé no peito, força nos braços, chão para os passos, pulso, raça, graça para seguir firme no caminho.”

De empreendedor para empreendedor: “Quando você resolve se dedicar a alguma coisa, vá atrás da melhor forma de fazer aquilo. Coloque ali tudo o que você tem de melhor”.

*Conteúdo produzido em parceria com o Bradesco.

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Mariana Castro é jornalista e autora do livro Empreendedorismo criativo ‑ Como a nova geração de empreendedores brasileiros está revolucionando a forma de pensar conhecimento, criatividade e inovação, publicado pelo selo Portfolio/Penguin, da Companhia das Letras.

Empreendedorismo criativo e novas economias são temas de suas aulas na pós-graduação do Istituto Europeo di Design, o IED. É sócia da rede de produtores de conteúdo F451, que publica veículos como Gizmodo Brasil e Outra Cidade.

Como jornalista, trabalhou no Grupo Estado e na Editora Abril, antes de ir para o jornalismo on-line. Foi editora-chefe do Último Segundo e editora-executiva de Política, Mundo, Cidades e Educação.

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Mariana Castro
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Jornalista. Autora do livro Empreendedorismo Criativo. Sócia da F451, que publica o Gizmodo Brasil. Professora de Empreendedorismo e Novas Economias no IED.