Disney, por que Plus?

Guta Tolmasquim
Brand Gym

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Talvez a gente esteja assistindo pela primeira vez na história uma empresa com quase 100 anos de idade dar a volta em uma grande empresa de tecnologia. A Netflix disrompeu a indústria audiovisual, mudou a forma como consumimos conteúdo, fez os grandes produtores de conteúdo repensarem sua forma de distribuição e principais fontes de receita. Tudo parecia mudado até que a Disney anunciou que lançaria sua própria plataforma de streaming: a Disney Plus. E desde então uma pergunta não sai da minha cabeça: por que esse nome?

A escolha dos nomes e da relação entre marcas se chama arquitetura de marcas e, provavelmente, é o desafio mais estratégico com que um profissional de branding precisa lidar. A razão? Não existe escolha óbvia, é sempre um trade off. Algumas grandes empresas conseguem fazer com maestria as boas escolhas, construir meticulosamente a relação entre suas marcas para anularem seus pontos fracos e transmitirem força, além de isolar o que pode ser conflituoso. Uma delas vocês já adivinham qual é: a Disney. Em seu grupo de mídia estão ABC, Disney e ESPN com marcas devidamente separadas para dominarem diferentes nichos de mercado. Em seu conteúdo: marcas que se fortalecem, como Mickey e Disneyland.

Encontrei esse link com as marcas do grupo.

Na nova plataforma de streaming, vamos encontrar conteúdos das diversas marcas do grupo. A escolha com menos perdas seria criar uma nova marca, usar o potencial de comunicação e o calor do tema para contar a todas as pessoas que XYZ é da Disney e que lá estarão conteúdos da Disney, Marvel, NatGeo, Star Wars e Pixar. Cria-se um novo asset para o grupo com uma nova personalidade e novo tom na comunicação.

Então? Por que Disney Plus?

Talvez o caminho com menos perdas também seja o caminho com menos ganhos. E temos uma Netflix a combater.

A Disney vai com o maior trunfo, com a marca mais forte do grupo. Porém, coloca na frente de batalha o asset mais valioso da companhia. Um produto novo pode ter falhas tecnológicas, experiência de uso ruim e mau atendimento ao consumidor. Também há risco de frustrar consumidores, já que nem todos os conteúdos da marca Disney estarão na plataforma. É um movimento ousado para quem tem quase 100 anos de brand equity.

Pensando em target, usar Disney nos diz que a mira está apontada para a família. A Disney é a única marca do grupo capaz de unir adultos, crianças e adolescentes na frente de uma tela.

Provavelmente, a empresa está considerando que streaming é como vamos consumir conteúdo no futuro e que o consumidor não vai assinar mais de uma plataforma (já comunicaram que Hulu e ESPN+ serão vendidos em conjunto com a Disney+). Tendo que ser a principal plataforma de streaming, melhor usar a principal marca do grupo, mesmo que isso signifique correr alguns riscos no curto prazo pra continuar sendo a líder daqui a 100 anos.

Esse movimento também indica que provavelmente vamos ver a corporação usar a marca Disney como marca-mãe, endossando as outras marcas do grupo, como a Unilever fez no passado, por exemplo.

Vamos agora ao Plus. Decidiu-se por usar a principal e mais forte marca do grupo, porém, ao mesmo tempo, contar para as pessoas que algo é diferente. O pequeno distanciamento entre as marcas Disney e Disney Plus cria uma certa proteção e, ao mesmo tempo, uma extensão de valor de marca. A mensagem é: essa é a Disney com um pequeno twist. Um Plus. Porém, algo não tão valioso que mereça um nome próprio. Plus é incapaz de absorver valor de marca — pense, Plus não pode ser vendido separado de Disney, nem existir sem sua marca-mãe por ser uma palavra pouco proprietária. E mais, pode ser retirado sem grandes perdas. É como se a Disney já fosse tecnológica. Ela não precisa de uma nova marca para chegar lá.

Sem dúvidas é um movimento ousado e não óbvio, mas, vindo da Disney, provavelmente podemos esperar uma história bem contada. Vamos acompanhar.

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Guta Tolmasquim
Brand Gym

Empreendedora e especialista em branding, descobrindo como medir marcas de forma eficiente. Founder da Brand Gym e atualmente CEO do Purple Metrics.