The dragon of moston from Ballads and Legends of Cheshire (1867)

O que são arquétipos e como eles te ajudam a gerir sua marca

Mariana Congo
Brand Gym
Published in
6 min readFeb 1, 2021

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O livro O Herói e o Fora-da-Lei é uma das bíblias de quem trabalha com branding.

A principal característica da bíblia não é ser um livro de muitas páginas: é que, quem gosta, está sempre lendo, consultado, marcando, citando… É uma leitura sem fim. É isso que rola com O Herói e o Fora-da-Lei e o pessoal de branding.

Comecei a ler no início do ano passado, quando estávamos estudando qual seria o arquétipo de marca da Magnetis. E quando comecei a trabalhar na Brand Gym, percebi que a galera de estratégia de marcas tinha o livro sempre na mesa, literalmente, e quem não tinha, estava correndo pra comprar (as reimpressões esgotam rápido!).

Isso tudo pra dizer que, se você trabalha com branding e não conhece esse livro, deveria. As autoras, Margaret Mark e Carol S. Pearson, descrevem as características dos 12 arquétipos e trazem centenas de exemplos de marcas e campanhas que se relacionam com eles. O único defeito do livro é que o tempo passou e ele não foi atualizado, então os exemplos param em 2001, quando foi publicado, e são basicamente de marcas norte-americanas (por isso, neste texto, vou me desafiar a trazer exemplos brasileiros!).

Vem comigo? 🤓

O que são arquétipos?

Os arquétipos foram descritos por Jung, mas não inventados por ele. Toda mitologia e literatura clássicas trabalham com esses conceitos nos seus mitos e grandes personagens. Os 12 arquétipos estão no inconsciente coletivo. Eles descrevem padrões de comportamento que são facilmente identificáveis (muitas vezes inconscientemente) por qualquer um.

Arquétipos são formas de ver, lidar e se colocar no mundo que geram facilidade de reconhecimento. Esse match de significados acontece entre as pessoas, entre as marcas, e na relação das pessoas com as marcas (e em muitos outros tipos de relação no mundo, mas aqui estou falando de branding).

Sabe aquela pessoa que você conhece e consegue “ler” muito rapidamente? Provavelmente você identificou um dos arquétipos nela e por isso fez essa leitura inconsciente.

Na palavras de Jung, arquétipos são:

“Formas ou imagens de natureza coletiva, que ocorrem em praticamente toda a Terra como componentes de mitos e, ao mesmo tempo, como produtos individuais de origem inconsciente.” C. G. Jung, Psychology and Religion. (p.18)*

Os 12 arquétipos e exemplos de marcas

Essa tabela retirada do livro O Herói e o Fora-da-Lei traz os 12 arquétipos, a ideia central de cada um deles e exemplos de marcas. Acrescentei uma coluna no final com mais exemplos de marcas, já que algumas citadas pelas autoras não são conhecidas no Brasil:

Muitas marcas trabalham com arquétipos primários e secundários, ou seja, um arquétipo predominante e outro auxiliar. Por causa disso, é muito comum você encontrar análises diferentes sobre qual é o arquétipo de cada marca. Um grande exemplo é a Apple, muitas vezes chamada de fora-da-lei (“pense diferente”), mas também tem muitas características de criador pelo perfil inovador dos seus produtos.

No fim das contas, o arquétipo é um dos segredos das marcas e dos seus times de branding. Nós, que estamos analisando de fora, pegamos essas pistas dos arquétipos nos pontos de contato. Marcas valiosas e amadas são aquelas com capacidade de gerar uma conexão profunda com seus consumidores. E esse tipo de profundidade vem das bases arquetípicas.

Como os arquétipos ajudam na gestão de marcas?

Houve um tempo no marketing (longínquo…) em que existiam menos produtos e menos competição. Por isso, construir as marcas era algo que acontecia mais pelo feeling e pela descrição dos atributos funcionais dos produtos.

O vento mudou de direção especialmente na década de 1980, quando ficou visível que as marcas que se diferenciavam por meio de significados intangíveis estavam se valorizando mais e mais rápido. Olha só:

“Wall Street fez uma descoberta: empresas inteiras estavam sendo adquiridas simplesmente para o comprador obter suas marcas poderosas — embora outras marcas oferecessem produtos quase idênticos. Algo novo estava acontecendo. (…) A verdade é que aquelas marcas tinham se tornado fenomenalmente valiosas não apenas devido às suas características ou benefícios inovadores, mas também por que essas propriedades tinham se traduzido em significados poderosos. Elas valiam milhões de dólares porque tinham ganhado um tipo de significado que era universal, maior do que a vida, icônico.” (p. 23)

Por trás das marcas mais valiosas, existem arquétipos bem trabalhados ao longo de décadas na comunicação e na publicidade. Na gestão de marcas, os arquétipos são usados como um sistema de administração de significados para, num primeiro momento, posicionar uma marca. E, com o passar do tempo e com a consistência da comunicação daquela marca, ela assume essa significação simbólica e passa a representar o arquétipo “naturalmente” (as aspas aqui porque sabemos que tem muito trabalho por trás de tornar uma marca “naturalmente” incrível 😉).

O arquétipo não é para ser usado em uma campanha efêmera, é para ser parte da essência da marca e se manifestar em todos os pontos de contato.

Outra questão interessante sobre o uso dos arquétipos na gestão de marcas é o fato de ser comum muitas marcas de um mesmo setor recorrerem ao mesmo arquétipo. Nesses casos, há exemplos de marcas que conseguiram destaque e diferenciação, pois foram criadas com base em arquétipos incomuns no setor.

Um exemplo do setor bancário: é muito comum o arquétipo do governante (“solidez, segurança”) ou do prestativo (“estou aqui para ajudar, sou parceiro”). O Nubank se destacou quando chegou no mercado por se posicionar como fora-da-lei, contra a burocracia bancária, rompendo barreiras e limites.

O que motiva alguém a comprar alguma coisa?

A teoria dos arquétipos se relaciona muito com a Pirâmide de Maslow, que fala que consumidores têm diferentes níveis de prioridade e necessidades. Qualquer produto atende a necessidades básicas, mas ao mesmo tempo atende a desejos mais profundos, como de estima ou auto-realização.

Quando você vai no restaurante de uma MasterChef você atende a necessidade básica de matar a fome, mas também sente-se realizado por estar comendo uma comida diferente, de uma chef que ficou famosa na televisão.

Mesmo quem vai ao supermercado e compra as marcas mais baratas, atende a necessidades básicas (comida, limpeza, etc.), mas também outras como segurança (“estou economizando dinheiro”) e sociais (“minha família vai gostar de saber que economizei e serei mais amado”).

“Os arquétipos fazem a intermediação entre os produtos e a motivação do consumidor porque oferecem uma experiência intangível do significado.” (p. 31)

E quais são os medos e desejos do consumidor?

Administrar significados é uma ciência fina e delicada. Na nossa sociedade as marcas ocupam um espaço importante no dia a dia, na mente e no coração das pessoas. Se elas são capazes de mexer com as nossas mais profundas necessidades e manifestações arquetípicas, é muito importante que quem cuida das marcas entenda essa ferramenta poderosa que tem nas mãos — para, assim, fazer um bom uso.

*Todas as citações deste texto são do livro O Herói e o Fora-da-Lei.

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Mariana Congo
Brand Gym

Across the universe. | Head of Marketing at Brand Gym