SAÚDE

A dor que vai além do físico

Conheça a hidradenite supurativa, doença de pele que leva cerca de 10 anos para ser diagnosticada

Maria Eduarda Souza
Brasil à vista

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Pacientes com Hidradenite Supurativa costumam se isolar quando as crises aparecem | Divulgação: Unsplash

Passava das 15h30 de 15 de abril de 2014 quando Valentina sentiu que sua angústia chegava ao fim. Há mais de dois anos surgiram as primeiras bolinhas e nenhum diagnóstico havia sido concluído. Durante esse tempo, enfrentou tratamentos para pelos encravados e antibióticos para inflamações sem causas aparentes, entretanto, nenhuma informação amenizava as dores do desconhecido. “As dores me impediam de viver minha vida plenamente. A falta de diagnóstico não me trazia segurança se teria uma melhora nos sintomas. O acolhimento era humanizado, mas não era o suficiente”, disse a jovem. Após inúmeras consultas dermatológicas, chegou ao veredito que tanto esperava: hidradenite supurativa, ou HS.

A hidradenite supurativa é uma doença inflamatória crônica caracterizada pela formação de nódulos e abscessos que acomete as regiões com dobras do corpo. Além de dores físicas, ela atinge o emocional dos pacientes, que sofrem com o diagnóstico tardio, já que ele pode demorar cerca de 10 anos para ser concluído. Um dos fatores principais para que isso aconteça é a escassez de informações, tanto para profissionais quanto para população geral.

Por isso, a principal reclamação entre os pacientes com o hidradenite supurativa é a dificuldade de encontrar um profissional que conheça a doença e mostre os tratamentos disponíveis. Existem informações difundidas pelas redes, com soluções rápidas e por vezes mirabolantes, como receitas que citam borras de café e aplicações de folhas medicinais que, no fim, acabam complicando ainda mais as inflamações. Para reagir à circulação de informações equivocadas, os profissionais de saúde buscam esclarecer todas as possíveis dúvidas no momento da consulta.

Mas, como funciona o diagnóstico?

A hidradenite supurativa depende de fatores clínicos e do conhecimento sobre a doença. A observação dos abcessos, fístulas — túneis formados pela pele — e a recorrência de inflamações devem ser consideradas também. Após o diagnóstico, o médico deve explicar para o paciente quais os caminhos a serem percorridos e as opções de tratamentos disponíveis. O dermatologista Wagner Galvão, da Faculdade de Medicina do ABC e membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), diz que o médico precisa ouvir atentamente os pacientes. É um processo delicado, por muitas vezes as pessoas chegarem ao consultório fragilizadas e desacreditadas.

De acordo com a cirurgiã dermatologista Luiza d’Almeida e coordenadora da Sociedade de Dermatologia Regional do Rio de Janeiro (SBD/RJ), a hidradenite pode iniciar com a pústula, que é como uma espinha. Às vezes, aparece como uma pápula, que é uma bolinha vermelha. Há também a formação de abscessos, que são furúnculos, além de formarem fístulas, que formam túneis na pele. Em alguns casos, cravos surgem com certa frequência. Além disso, estudos recentes realizados pela SBD apontam novas comorbidades, como síndrome metabólica que aumenta o risco de doenças cardiovasculares e síndrome do ovário policístico. Outras doenças, como artrite, doença de Crohn e depressão, podem piorar os sintomas da hidradenite.

Se você identificou mais de dois sintomas, procure ajuda profissional para mais informações.

Acolhimento profissional

O acolhimento profissional tem um papel fundamental para a humanização dessa doença tão sensível e pouco conhecida pela população em geral. De acordo com a Dra. Luiza d’Almeida, existem dois passos importantes nesse processo de acolhimento. O primeiro é explicar para o paciente recém diagnosticado que a doença não tem cura, mas há tratamentos que melhoram bastante a qualidade de vida de quem sofre com ela. Segundo, o médico e o paciente têm que estar sempre alinhados para controlar a doença. “Eu não posso desistir dele, e ele não pode desistir de mim, porque o caminho é tortuoso e lento. Eu explico muito, porque ele precisa entender que é uma doença inflamatória e que vai acontecer periodicamente, para compreender o processo e tratamento adequado”, complementa Luiza.

O acompanhamento dermatológico é importante para entender que o processo de resposta da doença é lento, e que existem várias opções de tratamentos disponíveis. Além disso, também é no acolhimento dermatológico que o paciente irá identificar em qual estágio da doença ele se encontra, e assim poderá receber os direcionamentos específicos. A hidradenite supurativa apresenta três estágios característicos.

Nódulos se formam em regiões de dobras e causam extrema dor aos pacientes | Divulgação: Wiley.

O primeiro estágio é caracterizado pela formação de pequenos nódulos semelhantes a espinhas. Normalmente, aparecem nas axilas, virilhas, sob os seios, nádegas, parte interna da coxa e também podem surgir na cabeça. Os sintomas muitas vezes são confundidos com acne ou pelos encravados. Em relação ao segundo estágio, há a presença de nódulos mais recorrentes e cicatrizes costumam aparecer nas mesmas regiões que o estágio anterior, mas apresentam pus e um odor desagradável. Já o terceiro e último estágio apresenta múltiplos abscessos e cicatrizes na pele, em que eliminação de pus e odor desagradável é mais presente.A dermatologista Luiza conta que existe um ambulatório especializado em atender pacientes com a doença no Hospital da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro.

Também é importante procurar acompanhamento nutricional para melhores resultados. A nutrição funcional contribui para uma visão mais ampla do quadro clínico do paciente. Clara Fonseca, nutricionista funcional que trabalha com doenças autoimunes e com a hidradenite, explica que há um questionário de rastreamento metabólico que ajuda a entender os sinais do corpo que podem estar interferindo no processo inflamatório. A partir disso, o paciente tem a visão de como funciona bioquimicamente a doença, quais as proteínas inflamatórias que ela tem e como resolver os gatilhos causados por elas.

Buscando trazer mais informações e contribuir com o processo dos pacientes, a nutricionista elaborou o Guia de Nutrição para Doenças Autoimunes e Hidradenite. É um cardápio que ajuda a diversificar as opções de alimentação durante um mês e auxilia a evitar gatilhos inflamatórios. Um dos mais importantes é o leite e seus derivados. Clara criou também uma cartilha para a biofarmacêutica global ABBVIE com informações para leigos com bases em artigos científicos que abordam mais sobre a doença e como a alimentação influencia.

#HIDRADENITESUPURATIVAÉAPENASUMAPARTEDEMIM

Assim como Valentina, são muitas pessoas que estão em busca do diagnóstico que possam amenizar as dores da doença. O acesso e propagação de informações reais em espaços midiáticos restaura a esperança dos pacientes de HS. Recentemente, a ABBVIE, em parceria com a SBD criou uma campanha de conscientização da doença. Com essa iniciativa e as novas informações que surgiram nos últimos anos, há esperança e espaço para debate.

*Essa reportagem foi produzida para a disciplina de Fundamentos da Reportagem do curso de Jornalismo da FABICO/UFRGS.

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