Mudança de país e empresa internacional: vale a pena?

Larissa Barra
Brazilians in Tech
Published in
6 min readOct 24, 2023

Olá! Meu nome é Larissa e eu saí de BH pra morar em Londres. Hoje em dia sou engenheira de software no Spotify. Vim contar um pouco sobre como é viver fora do Brasil e trabalhar numa companhia internacional. Resumidinho, pra dar uma ideia!

Texto escrito por Larissa Barra Conde

Foto: Tower of London e Tower Bridge vistas do mirante do Sky Garden

O Spotify, como é?

Spotify é uma empresa sueca, e dá pra notar. Quer dizer, dá pra notar o quão não americana ela é. Tem uma atenção especial ao equilíbrio entre vida e trabalho, o modo de trabalho é primeiramente remoto e não me lotaram de brindes assim que entrei. Não sei vocês, mas eu não preciso de mais um caderninho, mochila, boné e sacola reutilizável.

Pessoalmente, eu já sinto que minha experiência lá vai ser bem melhor que na Google. Digo isso por vários fatores, mas um deles, que me chamou atenção desde o início, é a transparência.

Eu comecei no Spotify duas semanas atrás, e assim como na Google o onboarding é longo. Isso é de se esperar de qualquer empresa grande, aliás: tem muitas políticas pra aprender, o código é enorme, e é comum usarem tecnologias proprietárias. Meu time repetiu várias vezes que eu posso relaxar e levar tudo no meu tempo.

Tenho bastante autonomia pra conduzir meu onboarding, e meu time já está me ajudando com tarefas pequenas que vão me ensinando coisas que eu tenho que aprender e me dando a oportunidade de contribuir desde cedo. Tenho acesso a informações sobre o modelo de negócio, todo tipo de documentação e muito material educacional também.

Outra coisa que gosto bastante é a importância que se dá à diversidade, inclusão, equidade, senso de pertencimento, impacto social e ambiental. Tem eventos acontecendo, recursos pra estudar, benefícios pra funcionários e vários grupos de discussão.

Mesmo não tendo ainda muito o que contar, posso dizer que é uma empresa super bacana. Pra começo de conversa, é o Spotify! Imagina trabalhar em algo que milhões de pessoas usam todo dia? Claro, todos os seus amigos vão vir falar com você sobre todos os bugs que eles acham e as funcionalidades que querem, é a mesma vibe da família querendo que você arrume a impressora só porque você sabe programar. Mas super vale a pena! Se quiser saber mais, dá uma olhadinha em https://www.lifeatspotify.com/

E a vida na gringa… é tudo isso?

Cheguei a Londres pra ficar no dia 1º de janeiro de 2020 depois de uns 6 meses de espera, desde aceitar uma oferta de trabalho, fazer todos os procedimentos de visto de trabalho (que levam tempo), pedir demissão, cumprir aviso, me despedir, etc. Eu estava deixando pra trás um trabalho que eu curtia demais, família e amigos — muitas amizades que fiz no trabalho, inclusive -, mas muito empolgada: estava indo pra Londres trabalhar na Google! Tudo bom demais, nada pode dar errado!

Foto: Atravessando a Abbey Road

Meu primeiro choque não foi a temperatura, mas a falta de luz. Tinha um trem lá pelas 17h e quando abri a porta às 16h pra sair pra estação, já estava escuro! Olhei no relógio mil vezes pra acreditar. Sair do quentinho do verão brasileiro direto pro frio do inverno inglês também não foi uma maravilha, mas tudo bem, eu só tinha que esperar alguns meses e já já viria a primavera, eu podia dar uma hibernadinha por agora e curtir Londres quando viesse o sol.

Meus primeiros meses passaram até rápido, entre o caos de arrumar um lugar pra morar, montar essa nova casa, fazer o onboarding no trabalho (que na Google leva eras, coisa demais pra ler e assistir e aprender). Vim sozinha de tudo, mas estava tranquila: adultos fazem amizade é no trabalho, certo? E a Google é enorme! Não demora e eu arrumo uma turma. Talvez tivesse sido o caso, se não fosse a querida…

Pandemia

De uma hora pra outra, trabalho remoto, correria pra comprar papel higiênico, o caos. Zero oportunidades de socializar, proibido sair de casa. Eu presa num contrato de aluguel novinho, pagando mais caro pela proximidade do centro, agora inútil. Mesmo quando ia ao escritório, o pessoal do meu time era muito legal, mas batia 5 e todo mundo ia pra casa. Lição número 1: ingleses (e a maioria dos gringos) não são tão sociáveis quanto brasileiros.

A lição número 2 é tomar pílulas de vitamina D. Descobri na prática que a falta de vitamina D causa baixa de energia e contribui pra depressão. Tem até nome pra isso aqui: SAD (parece ironia, mas é Seasonal Affective Disorder). Literalmente depressão de inverno. Mas claro que não foi só o inverno. O isolamento não foi nada fácil, nem foi o medo, nem a saudade.

Pelo menos aquela primavera foi de sol, pra ajudar um pouquinho. Eu realmente precisava dessa ajuda, porque não estava gostando do meu cargo e me sentia meio sem saída: não posso desistir tão rápido, mas porque fui deixar tudo e todos pra trás? Um amigo que já morava fora me disse que quando a gente muda de país tem algumas crises, a dos 6/7 meses, de 1 ano, por aí vai. Eu em crise, o mundo em crise também. Entra a terceira lição: é ok pedir ajuda, é ok precisar de remédio antidepressivo, tá tudo bem não estar tudo bem.

Quando Londres começou a reabrir no verão (é muito interessante, a Europa parece que muda com as estações; é como se as pessoas fossem girassóis), eu fui a um encontro de algumas garotas que moravam por perto, organizado através de uma comunidade chamada Girl Gone International. Se você pensar em mudar de país, ou só for mesmo viajar, estiver solo e quiser companhia, recomendações, o que for: busque o grupo GGI daquela cidade! Eu ainda sou amiga das meninas que conheci nesse dia, e tem sempre muitas atividades rolando.

Concluindo

2020 foi um ano difícil, e eu não acho que vá ser o mesmo pra todo mundo que sair do Brasil, mas alguns desafios que eu tive existem independente da pandemia: a falta de sol e suas consequências, as diferenças culturais, os altos e baixos emocionais. Navegar tudo isso é estranho e gostoso ao mesmo tempo, e, pessoalmente, foi e continua sendo uma experiência muitas vezes dolorosa, mas muito enriquecedora.

Mudar de país é estranho, porque você se sente meio de lugar nenhum: o novo país é sua casa, mas ainda não é seu lar. Mas quando você visita o Brasil, você percebe que lá também não é mais lar. Você muda e quem ficou mudou também. A vida passa dos dois lados e é impossível ficar por dentro de tudo, até mesmo o fuso horário contribui pra essa dificuldade. O período de ajuste é longo, eu tenho quase 4 anos fora e diria que dá pra esperar no mínimo uns 2 com essa sensação.

Mas eu não vim aqui pra desencorajar, porque tem muita coisa boa também! Londres é uma cidade super cosmopolita. Tem restaurantes de qualquer país que você possa imaginar. Tem uma infinidade de museus, teatro, shows, noitadas, amizades do mundo todo, culturas diferentes. Transporte público de qualidade, muita atenção à sustentabilidade, muitos eventos interessantes o tempo todo. Sol até 10 da noite no verão! Voos pra todo lugar, a Europa toda pertinho.

E não só vale pra Londres, mas acho que pra qualquer lugar que a gente for a gente vai conseguir fazer uma listinha de coisas boas. A cultura brasileira é muito particular e meio insular também. Aqui vai um clichê, mas sair do Brasil realmente abre as portas pra um mundo novo enorme que a gente não conhecia e nem imaginava. Tem muita novidade, muita reflexão também. É incrível descobrir novas comidas, novas línguas, novas culturas, novos hábitos. Às vezes são descobertas enormes e impactantes, outras vezes é pequenininho, tipo descobrir na prática num papo super engraçado que os gringos também tem uma expressão popular que a gente tem.

É legal demais, eu não tenho arrependimentos. Um dia eu volto? Não sei, talvez. Mas onde quer que eu esteja, acho que sempre vou me sentir do mundo. E cá entre nós: que bom!

Para saber mais sobre Larissa, acesse:

LinkedIn: https://linkedin.com/in/larissabconde

Larissa é nascida em Juiz de Fora, crescida em Belo Horizonte e hoje em dia vive em Londres. Começou em TI com um curso técnico no CEFET-MG e nunca mais parou. Atualmente trabalha como desenvolvedora iOS no Spotify e inventa moda nas horas vagas.

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Larissa Barra
Brazilians in Tech

Engineer at Spotify, enthusiastic about many things, curious about everything // Desenvolvedora no Spotify, entusiasta de várias coisas, curiosa por quase todas