Uber ou Busão?

Um caso em que o cansaço anuviou o bom senso.

Asafe Gonçalves Pereira
Brevidades
3 min readJan 6, 2017

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Não é Belo Horizonte na foto, não se enganem.

Estava eu na rua, na madrugada, voltando de um ensaio bem-sucedido (leia-se: sucedido por pizza), perto de 1h da manhã, vindo da Lagoinha pro Betânia — dois bairros meio distantes aqui de BH. A questão óbvia logo me veio: Uber ou Busão? “não vou gastar 25 conto de uber se eu posso gastar 3,70 de busão; espero até uns 40min, tô de boa… o ônibus noturno sempre vem vazio mesmo…”, a esperança é a última que morre, né?

Acontece, meus queridos e minhas queridas, que nem sempre a gente pode confiar no que está escrito nos horários que a Bhtrans¹ divulga, não é mesmo? Pois é. Ônibus Noturno acaba de entrar pro time de entidades como a Mula Sem Cabeça, a Loira do Bonfim², a Meritocracia Brasileira… cês sabem, tudo lenda. E não me entendam mal, o Ônibus Noturno existe, ele vem; só que nunca é o seu. Geralmente estão todos indo pra garagem. Um desses parou e me ofereceu carona até o centro, “já é a segunda vez essa noite que eu passo por aqui e você está aí plantado!” mas, depois de ouvir que eu esperava o Betânia, se emendou: “é… é melhor cê esperar aí mesmo… aqui ou no centro num faz diferença não”. Esperei ali mesmo, afinal a esperança é a última que morre, né? Vai vendo…

Passa minuto, passa hora, mais de três da manhã e nada. Só eu e os sacos de lixo, juntos aguardando nossas conduções. A figura da balança permanecia na minha cabeça: $25 ou $3,70?… é. Busão vence.

Esperei, esperei, fiz cara feia pra quem eu achei que fosse assaltante, dei boa noite pra quem parecia boa gente, e esperei mais… Felizmente dei mais boas noites que fiz cara feia, e não precisei colocar em prática nenhuma das estratégias de fuga que acabei bolando caso me enganasse de boa noite; sobrevivi. Nessa história a esperança é a única que morre. Graças a Deus!

Finalmente a figura majestosa vem crescendo do horizonte com seus valorosos guerreiros: o Caminhão de Lixo. Logo atrás dele, meu ônibus! Adivinha se deu certo!

Quando eu corri em direção ao ônibus, o caminhão parou pra pegar o lixo e desceu a galera! No meio da muvuca eu consegui driblar uns três lixeiros, pular um saco de lixo, meus braços balançando loucamente pro alto (quase um boneco do posto com pernas)… Sim, você adivinhou: o motorista, não sei se por medo ou miopia, sequer relou o pé no freio. Meu ônibus, como veio, assim se foi: veloz e vazio; tal como me trazia a alegria, também a levou. Agora nem mais o lixo me era companhia… ok, vocês já entenderam que foi triste.

A essa altura eu já não queria mais pagar 25 conto de uber por puro desaforo! Ia chegar em casa tarde de qualquer jeito… Em minha defesa, eu estava com sono e meu cérebro em modo de economia de energia. Não dava pra ser muito lógico.

Deu 4h da manhã, a estação do MOVE abriu. Eu entrei, murcho e cabisbaixo feito um Ross³, cumprimentei o guarda, contei toda minha tribulação esperando alguma empatia — ninguém sabe o que é empatia hoje em dia. O guarda me fala, “Eu vi tudo! Se você tivesse aceitado aquela carona, não tinha sido janelado lá no centro”. Um pouco tarde demais pra essa solução, mas ele tinha razão.

Quando o busão finalmente veio, eu entrei, sentei e apaguei. Claro que passei do ponto e só fui acordar no ponto final. Bom, pelo menos o ponto final do Betânia é só dois pontos depois do meu, olha que maravilha!

Moral da história: não sei, ainda tô com sono.

NOTAS:
¹Bhtrans: empresa de transportes e trânsito aqui de BH.
²Loira do Bonfim: figura mitológica que assombra os arredores do cemitério do bairro Bonfim.
³Ross: personagem muito chorão de Friends… desculpa, mas tem gente que não sabe.

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Asafe Gonçalves Pereira
Brevidades

Impostor em vários frontes. Usuário de drogas pesadas, a saber, café e transporte público. Viciado numa, dependente da outra.