Tudo o que você precisa saber sobre Gestão do Conhecimento Disperso em Ecossistemas de Inovação

Aline Faria
Bridge Ecosystem
Published in
6 min readJan 29, 2021

Se fossemos listar os principais desafios empresariais do novo cenário de negócios, certamente a gestão do conhecimento estaria entre os mais urgentes. Isso porque a evolução tecnológica possibilitou a ampliação do acesso ao conhecimento, fazendo com que todos nós fiquemos sufocados em uma enxurrada de informações. Nesse contexto, perguntas como ‘qual conhecimento é realmente relevante para o meu negócio?’ e ‘como posso criar um ambiente propício para a aplicação e a internalização desses conhecimentos?’ se tornaram centrais no nosso dia a dia.

Fonte: Pixabay

A gestão do conhecimento é o conjunto de processos e práticas para manipular o conhecimento, seja ele novo ou não. Isso é, toda e qualquer prática relacionada à aquisição, desenvolvimento, aplicação, retenção ou atualização de conhecimento é parte do guarda-chuva da gestão do conhecimento. Historicamente, a gestão do conhecimento se preocupou com os fluxos de informação dentro das empresas. A ideia era criar processos para otimizar o desenvolvimento de novos conhecimentos, além de instituir práticas para que as empresas retivessem e internalizassem esse conhecimento por meio de manuais e protocolos. Nesse contexto, uma das principais dores das empresas era o conhecimento tácito que ficava sob a posse de determinados colaboradores. O fato desse conhecimento não estar registrado na empresa, fazia com que ela se tornasse refém desses colaboradores, caso decidissem sair da organização. Contudo, com a transformação digital, o cenário competitivo das empresas tem mudado para uma lógica de ecossistemas, algo que fez com que a preocupação da gestão do conhecimento se ampliasse para além das fronteiras organizacionais.

Os ecossistemas de inovação são grupos de empresas que atuam de forma interdependente na criação e captura de valor por meio de projetos de inovação. Nesse sentido, a manipulação de novos conhecimentos pode envolver os mais diversos atores, algo que traz à tona um desafio extra para as empresas: a gestão do conhecimento disperso.

O conhecimento disperso enfatiza a ideia de que a informação dificilmente existe de forma concentrada ou integrada, mas apenas como um pedaço disperso de conhecimento incompleto e frequentemente contraditório. Como resultado, pessoas diferentes sabem coisas diferentes em momentos e lugares diferentes e, por esse motivo, a centralização do conhecimento geralmente não é uma estratégia plausível ao lidar com esse tipo de contexto, exigindo abordagens distintas.

Pensando nisso, elencamos a seguir os primeiros passos para a definição de uma estratégia de gestão do conhecimento disperso. A partir desses passos você poderá ter uma visão mais ampla sobre como otimizar os fluxos de informação dentro da sua empresa, assim como aqueles entre a sua empresa e seus parceiros.

1. Identifique os projetos que sua empresa desenvolve com parceiros externos. 🔍

Se você chegou até esse post, dificilmente a sua empresa desenvolve novos projetos utilizando apenas recursos internos. Provavelmente a sua empresa possui parcerias com centros de pesquisas, universidades, clientes ou fornecedores. Por um lado, a diversificação de parceiros pode trazer recursos e tecnologias complementares que podem tornar o desenvolvimento de projetos mais ágil e menos custoso. Por outro lado, a gestão desses projetos pode se tornar tão complexa que os fluxos de informação fiquem ineficientes ou até mesmo se percam. Por esse motivo, é essencial que você liste e sistematize todos os projetos que sua empresa desenvolve com parceiros externos. Afinal, antes de ter uma boa gestão de conhecimento disperso, é necessário que a sua empresa tenha uma boa capacidade de gestão de projetos.

2. Identifique os atores externos envolvidos em cada projeto. 👋🏻

O conjunto de parceiros pode ser muito distinto entre projetos, sendo normal que alguns departamentos não conheçam todos os componentes desse conjunto. Com isso, é possível que algum líder de projeto busque novos acordos com organizações que oferecem as mesmas qualificações ou capacidades daqueles já disponíveis nos contratos vigentes. Por esse motivo, é crucial que você tenha uma visão clara de todos os atores que trabalham com a sua empresa.

3. Modularize o conhecimento desenvolvido pelos projetos. 📚

Cada projeto de inovação pode desenvolver inúmeros produtos intermediários de conhecimento. Por exemplo, se a intenção da minha empresa é desenvolver um creme rejuvenescedor, é possível que eu também precise me preocupar com outras soluções que possibilitem a captura de valor desse novo produto no mercado, como: uma embalagem diferenciada, uma fragrância agradável, uma marca que chame a atenção e assim por diante. Uma vez que minha empresa está trabalhando com diferentes parceiros, é provável ainda que os conhecimentos gerados por essas soluções intermediárias estejam dispersos no meu ecossistema. Para evitar a perda desses conhecimentos, ou mesmo o uso não otimizado, é muito importante que a sua empresa identifique esses módulos de conhecimentos e construa um mapa do conhecimento disperso.

4. Avalie a relevância estratégica de cada módulo de conhecimento. 🚀

Ao identificar os módulos de conhecimento que cada projeto gera, o próximo passo é fazer uma avaliação a respeito da relevância que cada um desses módulos têm em relação à estratégia da empresa. Por exemplo, a sua firma pode estar interessada apenas no conhecimento a respeito da tecnologia do creme rejuvenescedor, que poderia ser uma nova molécula que reverte os sinais do envelhecimento. Nesse sentido, o desenvolvimento de novas soluções para otimizar a conservação do creme — como, por exemplo, uma embalagem com um mecanismo de fechamento mais eficiente — pode ser um conjunto de informações que a sua empresa não esteja interessada. Ou seja, nesse exemplo, o módulo de conhecimento sobre a nova molécula seria muito mais crítico para empresa do que o módulo sobre a embalagem. O interessante aqui é realizar um ranking a respeito da criticidade de cada módulo de conhecimento, sempre pensando na estratégia geral da empresa e não apenas na execução de um determinado projeto.

5. Avalie a capacidade de absorção da sua empresa. 📊

Após identificar quais são os módulos de conhecimento e a relevância estratégica de cada um, está na hora de olhar para os recursos que a empresa tem internamente. No mesmo exemplo, pode ser que ainda que a empresa tenha interesse no conhecimento sobre novas embalagens, ela não tenha capacidade de absorção desses conhecimentos. Nesse caso ela teria que escolher qual conhecimento é mais crítico para ela e escolher apenas um ou outro.

6. Implemente a estratégia de gestão do conhecimento disperso. 🎯

Uma vez avaliada a capacidade de absorção da empresa e identificados quais são os módulos críticos de conhecimento, está na hora de decidir: Quais módulos de conhecimento serão transferidos dos parceiros para a sua empresa? O que ela fará com os módulos de conhecimento que não serão transferidos para ela? Nesse ponto é importante que a empresa estabeleça as práticas de governança da gestão do conhecimento disperso. A governança do ecossistema deve ser delineada para definir os limites de uso e exploração dos conhecimentos, assim como para estabelecer incentivos e canais de transferência dos conhecimentos dos parceiros para a sua empresa. Nesse caso, os módulos que forem transferidos para a empresa devem seguir uma lógica de governança burocrática. Na lógica de governança, são priorizados contratos formais e bem definidos, especialmente no que diz respeito ao delineamento de acordos de propriedade intelectual. Por outro lado, os módulos que não forem transferidos para a empresa devem seguir uma lógica de governança de mercado, onde a empresa pode empregar diferentes práticas para capturar valor da utilização desses conhecimentos pelos parceiros.

O fluxograma a seguir apresenta uma ideia geral sobre esses primeiros passos na definição de uma estratégia de gestão do conhecimento disperso em ecossistemas de inovação.

Fonte: Desenvolvido pela autora

Esperamos que você tenha gostado! Ao final dessa matéria, você poderá encontrar algumas referências acadêmicas, caso queira se aprofundar no tema! Até uma próxima.

Referências:

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Bodin, O. (2017). Collaborative environmental governance: achieving collective action in socialecological systems. Science, 357(6352), 659–668.

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