Initial Coin Offer (ICO) como ferramenta para desenvolver o empreededorismo

Marcelo Dionisio
Business Drops
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7 min readFeb 22, 2018

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Muito se falou em Bitcoin e criptomoedas em 2017. O Portal do bitcoin noticiou que pesquisas por Bitcoin no Google foram a segunda maior nesse ano. Muito deste frenesi se deu porque em 2017 as cotações das criptomoedas explodiram e geraram ganhos anuais de até 30.000% como foram os casos de moedas digitais como a Ripple e a Nem. O Bitcoin sozinho valorizou mais de 1.600%.

Até o final de fevereiro de 2017, o Bitcoin reinava soberano entre as criptomoedas, com cerca de 90% de todo valor de mercado. O ano terminou com 1.476 moedas digitais e o Bitcoin com uma participação média de 35% deste mercado.

Em função desta disparada nas cotações e seu caráter descentralizado, muito se questionou sobre a função e validade das criptomoedas, gerando um debate polarizado entre defensores e opositores.

Bill Gates declarou em 2013 que o Bitcoin se tratava de uma potência tecnológica, enquanto Peter Thiel, co-fundador do PayPal, disse que o bitcoin era o “primeiro dinheiro cifrado com potencial de mudar o mundo”. Por outro lado, o analista Pedro Cerize decretou que o destino do Bitcoin é virar pó, e o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn declarou que o Bitcoin podia representar uma bolha clássica ou um esquema de pirâmide. Com isso, talvez a maior pergunta do ano tenha sido: o Bitcoin é ou não uma bolha especulativa?

“O Bitcoin é ou não uma bolha especulativa?”

Em meio a este debate, pouco se falou do potencial do lançamento de novas criptomoedas como ferramenta para alavancar novos negócios. Na prática, 1.400 moedas significam 1.400 novos negócios com base em moedas digitais e tecnologia blockchain, ou seja, novas criptocurrency startups ou startups baseadas em criptomoedas.

Esse texto se propõe a explorar as diferentes aplicações e conceitos das criptomoedas e demonstrar o potencial de ICO’s (Initial Coin Offerings) como ferramenta de captação de fundos para lançamentos de novos negócios, relacionando seu potencial com a dificuldade e necessidade de financiamento para desenvolver o empreendedorismo no Brasil.

Uma nova classe de ativos

Segundo Fernando Ulrich, considerado um dos maiores especialistas em criptomoedas no Brasil, “Dado o seu ineditismo, a própria classificação do bitcoin enquanto um ativo já é um desafio em si”, principalmente considerando que as classes de ativos mais usuais são dinheiro, commodities e ações.

Realmente ainda é necessária uma grande dose de abstração para entender e definir criptomoedas pois pode se considerar que este mercado e sua tecnologia (Blockchain) estão nos seus primórdios, mas na verdade, pode-se perceber que criptomoedas podem apresentar as características de cada um desses ativos, em alguns casos mais de uma ao mesmo tempo.

Criptomoedas podem ser consideradas “dinheiro” a partir do momento que já são utilizadas como meio para troca de bens. Hoje já existem mais de 100.000 pontos de vendas que aceitam Bitcoins e outras moedas digitais, além de mais de 2.000 caixas automáticos.

“Hoje existem mais de 100.000 pontos de vendas e mais de 2.000 caixas automáticos que aceitam criptomoedas”

Criptomoedas também podem ser consideradas commodities dadas suas características uniformes, seu preço determinado pela oferta e procura internacional, conforme definição da wikipedia.

Finalmente, criptomoedas também podem ser consideradas ações, já que seus valores representam investimentos em empresas, que em alguns casos oferecem dividendos (ex.: Bulleon e Etheroll), e são negociadas em corretoras onde seus valores podem variar com base em seus resultados e perspectivas de crescimento.

Nesse caso, startups baseadas em criptomoedas lançam seus projetos e através das ICO’s, que na prática são uma ação de financiamento colaborativo (crowdfunding), levantam fundos para iniciar seu negócio, oferecendo a seus investidores descontos, bônus e planos de dividendos, sendo assim um enorme potencial para alavancar a criação e desenvolvimento de novos negócios.

Como funciona uma ICO?

Uma ICO é um mecanismo descentralizado e desregulamentado que permite o lançamento de uma startup com base em uso de uma moeda digital. Esse mecanismo permite que empresas, através de uma ação de financiamento colaborativo, levantem fundos necessários para financiar seu projeto.

Apesar da falta de regulamentação, para se constituir uma ICO é necessário seguir várias normas e organizar um processo detalhado de preparação do projeto e montagem da equipe de empreendedores e seus conselheiros.

Uma ICO implica no desenvolvimento do plano de lançamento (bônus, moedas aceitas, etc.), whitepaper (documento legal do projeto) e site contendo todas as informações técnicas do projeto, todas as informações sobre a moeda e a equipe do projeto, visando oferecer uma visão clara que permita os investidores tomarem uma decisão bem informada.

Um site bem montado favorece os resultados de uma ICO e deve conter além do whitepaper e equipe, um roadmap detalhado com os passos do projeto, plano de alocação da moeda, orçamento, objetivos de arrecadação, parceiros, eventos, entre outros detalhes relevantes.

Estima-se que a montagem de uma ICO custa entre US$ 50 e US$ 100 mil em aspectos legais, financeiros, RP e marketing. De acordo com Alan Norman, em seu livro “Criptocurrency Investing Bible”, uma boa ICO deve: 1) Conter figuras reconhecidas em suas respectivas áreas de atuação em seu time, 2) Oferecer um Whitepaper detalhado e com uma clara definição dos planos e objetivos, 3) Apresentar o mercado e seus competidores, 4) Contar com o apoio de formadores de opinião, 5) Participar ativamente em eventos, e 6) Obter boas avaliações de experts e agências especializadas.

Por essa razão, para qualquer empresa que pense em lançar seu projeto via ICO é fundamental que fique claro em sua proposta o propósito e a necessidade de uso de uma criptomoeda e sua adequação à tecnologia blockchain, base da existência de uma cripocurrency startup.

É importante ressaltar que dadas as características deste mercado, uma ICO de sucesso implica, desde seu primeiro momento, na criação de uma empresa internacional, por isso a importância de seguir os itens listados acima. Não se surpreenda ao ver projetos de empresas baseadas na Bulgária com a participação de conselheiros e parceiros do Canadá, Holanda & França, como é o caso da Lockchain, empresa que oferece um serviço similar ao AirBnB e que lançou com sucesso sua ICO em Dezembro de 2017 (www.lockchain.co).

Fora sua característica internacional, por tratar-se de uma empresa digital e em função do próprio processo de ICO, tudo que acontece com a empresa é publicado e questionado, diariamente! Isso reforça a necessidade de uma boa governança, principalmente por que se estabelece uma relação de confiança e parceria entre os investidores individuais que compraram a ideia do projeto.

Nesse ponto é bom ressaltar que apesar de ser uma ferramenta poderosa para financiar startups, existem vários tipos de ICO’s que são golpes ou projetos sem consistência, fatos que muitas vezes confundem os potenciais investidores.

Daí a importância de um bom planejamento para o lançamento de um projeto de sucesso.

“A ICO da Ethereum levantou US$ 18 MM em 42 dias!”

Os principais casos de sucesso incluem o lançamento da moeda Ethereum, atualmente sugunda moeda de maior valor atrás do Bitcoin, que levantou US$ 18 milhões em 42 dias e a EOS que levantou impresisonantes US$ 185 milhões em seu ICO.

As dificuldades e necessidades de financiamento para empreender

O relatório GEM (Global Entrepreneurship Monitor) é um projeto liderado pela London Business School e Babson College que avalia a opinião de experts e realiza uma pesquisa de mercado sobre empreendedorismo em todo o mundo. Seu relatório de 2016 servirá para ilustrar os desafios de financiamento para o emprendedorismo no Brasil.

De acordo com este relatório, o empreendedorismo é reconhecidamente um dos principais pilares do crescimento econômico sustentável, onde em média, 42% dos adultos economicamente ativos têm intenção de empreender. No Brasil o relatório GEM observou que 41,3% da população conhece alguém que iniciou um novo negócio nos últimos 2 anos e 31,7% sonham em ter seu próprio negócio. Junto com a China, o Brasil é o país que apresenta o maior potencial de empreendedores.

Essa mesma pesquisa identifica que a falta de políticas governamentais e de apoio financeiro são os principais limitadores da atividade empreendedora.

No Brasil, esse problema é apontado por respectivamente 77% e 32% dos entrevistados, representando os dois maiores índices desta pesquisa

“No Brasil, uma em cada quatro pessoas querem empreender”

No quesito investidores, observa-se que a taxa brasileira é a menor entre os BRICS, percentual que vem caindo desde 2013, o que mostra que a busca por investimentos no Brasil ocorre em um ambiente mais hostil do que em os outros países citados e consequentemente impacta de forma negativa na abertura de novos negócios.

Esses números demonstram a dificuldade de conseguir financiamento para empreender em relação inversa ao desejo de investir em novos negócios.

Em um cenário de escassez de opções de financiamentos e taxas de juros altas, a revista Pequenas Empresas, Novos Negócios de fevereiro deste ano destaca que em uma pesquisa realizada com mais de mil startups revelou que o principal motivo para o fechamento das empresas é a dificuldade de acesso a capital.

Conclusão

O Brasil apresenta o melhor e o pior dos mundos para empreender. De um lado, há um potencial de empreendedorismo entre os maiores do mundo onde, na prática, um entre quatro brasileiros tem desejo de empreender.

Do outro lado, vemos um ambiente que inibe a realização deste potencial com poucas políticas governamentais, linhas de crédito caras e escassas além da burocracia e corrupção que dominam este sistema.

Nesse caso, o desenvolvimento de criptocurrency startups e o uso de ICO's como forma de obter financiamento para empreender pode oferecer uma solução.

Apesar de seu custo, de apresentar um alto grau de dificuldade em seu desenvolvimento e exigir algum grau de internacionalização, fator que ainda é muito baixo no caso do Brasil, os resultados de uma ICO de sucesso podem valer a pena.

Agora em 2018 foi lançada a primeira ICO brasileira, a Niobium, que se propõe a lançar a nova Bolsa de moedas virtuais empresariais de São Paulo (BOMESP) e envolve participantes da Áustria, Inglaterra e Índia. Essa ICO arrecadou mais de 10 MM de moedas o que equivale a mais de R$ 100 MM.

Que este caso de sucesso sirva de exemplo para mais empresas se aventurarem no uso desta tecnologia que apesar de todas as críticas e especulações, na minha opinião, veio para ficar, tem potencial para mudar a forma de financiamento de novas empresas e alavancar o empreendedorismo no Brasil e no mundo.

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Marcelo Dionisio
Business Drops

Coordenador Acadêmico da Scholar Corporate, Professor de Varejo, Marketing e Sustentabilidade & Doutorando do Coppead/UFRJ em Inovação Social.