Atenção ao March Madness: O que faz o basquete universitário tão atrativo?

Felipe Haguehara
buzzerbeaterbr
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7 min readMay 8, 2017

Interesse pelo torneio universitário cresce juntamente com o basquete brasileiro

Audiência do March Madness aumenta cada vez mais no Brasil

Há cerca de um mês atrás aconteceu a final da National Collegiate Athletic Association, a NCAA, nos Estados Unidos. Não tão eletrizante e histórica quanto a partida do ano passado, quando Villanova bateu North Carolina na final com um buzzer beater, Gonzaga e, novamente, North Carolina fizeram parte do respectivo show, com a segunda se sagrando campeã, o 6º título da história do time que já teve o ilustre basquete de Michael Jordan vestindo seu uniforme.

Uniforme de Michael Jordan, aposentado pelo North Carolina Tar Heels (Foto: Marco Varisco/Flickr)

A cultura norte-americana de investimento em esportes universitários, ou até high school, já é conhecida. Grande parte dos programas, que também pertencem a universidades renomadas academicamente, oferecem as conhecidas scholarships, bolsas de estudo especiais para os principais atletas de suas modalidades.

No basquete não é diferente, o número máximo de bolsas para atletas permitidas pela NCAA é 13, basicamente uma equipe inteira com 5 titulares e 8 reservas, porém a maioria acaba oferecendo menos ou bolsas não integrais, visto que o custo acaba sendo muito alto. O site Scholarships Stats estima que o custo médio de uma dessas bolsas na Divisão I do basquete masculino da associação atlética supracitada era de 14.958 dólares em 2015.

Naturalmente, existem críticas aos programas, afirmando que por mais inclusivo que pareça, uma parcela mínima dos jogadores da high school terão a chance de ingressar em uma equipe na universidade através das bolsas. Segundo o levantamento do mesmo Scholarship Stats, a porcentagem de jogadores vindos do high school competindo na Divisão 1 é de 1%. Esses poucos jogadores de basquete que conseguiram chegar na universidade ainda enfrentam a concorrência de jogadores estrangeiros, jogadores de escolas preparatórias para a universidade e os veteranos de seu próprio time para concorrer a essas uma dessas 13 bolsas. Ou seja, chegar lá não é tão simples assim.

Infográfico: Felipe Haguehara/Buzzer Beater

Porém, considerando essa ser a oportunidade de muitos jovens que dificilmente cumpririam as qualificações acadêmicas para ingressar na universidade universidade, principalmente as mais conhecidas, e têm o esporte como principal referencial de sucesso numa carreira profissional há, sim, uma noção da efetividade desses sistema.

Em 2015, haviam 5.503 jogadores de basquete no basquete masculino da primeira divisão da NCAA, distribuídos em 351 times. Pressupondo cada time ofereça a média, ou seja, 13 bolsas, integrais ou parciais, temos 4.563 indivíduos matriculados na universidade recebendo algum tipo de auxílio, ou 82% dos jogadores de basquete da Divisão I.

O pivô do Flamengo, JP Batista, passou pela faculdade nos Estados Unidos, jogando pelo recente finalista do torneio, Gonzaga Bulldogs. Ele salienta não apenas a cultura de incentivo financeiro aos atletas, como também o investimento na própria infraestrutura das facilidades que esses mesmos utilizam.

“Quando você oferece tudo de melhor, tanto na educação quanto na estrutura, o crescimentos cada atleta é inevitável. A infraestrutura oferecida para cada atleta da NCAA ou profissional nos Estados Unidos gera esse diferencial. Muitos vestiário e ginásios de universidades são melhores que muitos da NBA e outras ligas. Você ver ginásios de high school nos Estados Unidos, todo climatizado, limpo, completo com academia e etc. Enquanto aqui no Brasil o único ginásio climatizado que eu joguei foi na Arena da Barra”.

Loucura em Março

Ignorando o intertítulo com cara de tradução brasileira para comédias de Hollywood, é impossível falar de NCAA sem falar sobre o March Madness. Basquete é um mercado rentável e global, que durante a história se desenvolveu bem mais em outros países, principalmente Europa e América Latina, do que os outros grandes esportes norte-americanos. A facilidade em aplicar as regras e métodos de introdução para jovens como o mini basket são antigos e consolidados.

O torneio da NCAA apresenta as principais promessas para o futuro da liga mais importante do mundo, a NBA. Pontuado isso, é um tanto quanto lógico pensar que o torneio universitário atraia cada vez mais atenção do resto do mundo.

Final Four de 2017, que registrou diversos recordes de audiência, aconteceu em Phoenix (Foto: Marine 69–71/Wikimedia Commnons)

A popularização do March Madness apresenta qualidades positivas e negativas para a audiência de seus organizadores. No último torneio da NCAA, em 2017, foram registrados recordes de público que o acompanhou, tanto nas emissoras, quanto nos streamings. Durante as semifinais do Final Four, as emissoras registraram a segunda maior audiência dos últimos 19 anos, com uma média de 16.8 milhões de telespectadores, segundo a própria NCAA. Na transmissão dos confrontos entre Gonzaga contra South Carolina e North Carolina contra Oregon, a CBS, emissora de sinal aberto para satélite nos Estados Unidos, registrou um aumento de 44% em sua audiência em relação ao mesmo período do campeonato no ano passado.

“Muitos vestiário e ginásios de universidades são melhores que muitos da NBA e outras ligas. Você ver ginásios de high school nos Estados Unidos, todo climatizado, limpo, completo com academia e etc. Enquanto aqui no Brasil o único ginásio climatizado que eu joguei foi na Arena da Barra” — JP Batista, Pivô do Flamengo

Nas transmissões via streaming o resultado é mais positivo ainda. Foram registrados recordes através da NCAA March Madness Live, com 4.4 milhões de pessoas acompanhando a final, e um total geral para o torneio, que compreende o pós-temporada regular, de 98 milhões.

A consolidação do March Madness como um produto frutífero, contudo, acarretou num efeito “faca de dois gumes” para a associação atlética que o organiza. Na mão em que a pós-temporada aumenta seu valor, a temporada regular desperta certo desinteresse do público num geral. Em 2017, pelo oitavo ano consecutivo a NCAA registrou um decréscimo no número de indivíduos que foram aos jogos.

Além disso a discrepância na média de espectadores nas redes de televisão entre os dois períodos é notável. Em 2015 a média daqueles que acompanharam a temporada regular através dos canais que os transmitem (ESPN, ESPN2, ESPNU, ESPNEWS, NBCSN, FS1, FS2, FOX e CBS) foi de 434 mil, uma fração bastante irrisória perto dos 9.9 milhões que acompanharam a pós-temporada.

Um dos motivos apontados por especialistas e pelos próprios jogadores para a popularidade do March Madness em relação ao período anterior do campeonato é a objetividade. Ao invés da digladiação entre as mais de 300 universidades, há apenas o mata-mata, jogos únicos no chaveamento. “Eu ficava um pouco ansioso porque era uma única chance. Perdeu tá fora, então aquele sonho poderia durar alguns dias como poderia durar um mês”, diz JP Batista sobre sua experiência em jogar o torneio, algo que também se aplica no crescimento da audiência no período. Podemos comparar com o crescimento da audiência em uma Copa do Mundo quando acaba a fase de grupos e começam as oitavas-de-final.

Competitividade que interessa ao brasileiro

Como o já colocado, o número de interessados cresce cada vez mais no Brasil, algo observado nas redes sociais. Segundo o site Socialbakers, que registra estatísticas da internet e de redes sociais, a página da NBA no Brasil é a 16ª página no Facebook sobre esportes com mais curtidas no país. A da liga nacional, o NBB, também cresce a cada dia, sendo a 34ª com mais curtidas. Além disso na página oficial da liga norte-americana, os brasileiros representam o quarto maior contingente de curtidas, sendo 3.7% dos likes, atrás apenas de Estados Unidos, Filipinas e Índia.

O efeito é semelhante quanto ao March Madness. Em 23 de Março o número de curtidores tupiniquins na página NCAA March Madness era 8.929. Em 6 de Abril, três dias após a final do torneio, o número de curtidores subiu para 9.807. Ascendência relativamente alta se considerarmos que nos 6 meses anteriores a variação era de mais ou menos 20 para mais, ou para menos (perda de curtidores).

“Eu acho essa cobertura que eles fazem para esse evento muito boa para o basquete nos EUA, porque mostram muitas coisas boas que a gente tem no basquete universitário! Mostra o clima que tem para esse evento, mostra os atletas e a qualidade que eles têm no basquete e mostra o nosso futuro do basquete também”, diz Kenny Dawkins, armador do Universo/Vitória, que jogou pelo Lamar Cardinals, na Conferência Southland da Divisão I.

O ponto que o atleta da equipe baiana salienta é um dos que atrai os espectadores brasileiros. “O futuro do basquete”, ou melhor, os futuros atletas da NBA, são pautas de interesse do fã da modalidade que tende a ser fanático e buscar as raízes de suas estrelas favoritas.

Outro aspecto sedutor do jogo universitário é o estilo completamente diferente do que se acostuma a ver na liga nacional, ou torneios de seleções. “No basquete universitário o estilo de jogo é diferente, é mais um contra um, aqui (NBB) você joga mais basquete com o time… Eu acho que no basquete universitário é mais atlético, tem jogadores mais atléticos”, compara, Kendall Anthony, armador da Macaé Basquete, que jogou a Divisão I pelo Richmond Spiders.

Anthony também salienta o quão importante é o período do March Madness em relação ao resto. “Tem mais significado em Março,todo jogo é tão importante para todo mundo, todo mundo quer ganhar e é quando seu time está em seu melhor momento. Os caras jogam tudo que podem, então você vê coisas malucas como buzzer beaters, cestas do meio da quadra. Isso é o que faz Março tão especial!”.

Se seguir a lógica da evolução em como as pessoas acompanham esportes cada vez mais via streaming, visto os recordes quebrados da NCAA, e o visível crescimento da atenção dos brasileiros ao campeonato, como observamos nas redes sociais, cada vez mais veremos bandeiras verdes e amarelas preenchendo estatísticas de na audiência global do March Madness.

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