NBA — Semana 19: A divina comédia de Dallas Mavericks

Heitor Facini
buzzerbeaterbr
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7 min readMar 11, 2017

Dirk chegando a 30 mil pontos, jogadores não draftados fazendo sucesso, e a equipe fadada a brigar por escolhas no draft pode voltar aos playoffs

Dirk Nowitzki, com o arremesso que mais parece estar com a canela quebrada conseguiu chegar a 30 mil pontos. Que. Homem. (Ilustação: Heitor Facini/Buzzer Beater)

Dante Alighieri, em algum dos 100 anos do século 14 escreveu uma obra que ecoa até hoje. A Divina Comédia, como no nome tratava, era uma história que a princípio tratava de um final feliz. A história, se dá conta pela viagem espiritual que o autor faz pelos três reinos: inferno, purgatório e céu.

A caminhada que Dallas faz nessa temporada tem um quê de épico, um quê de inusitado e um quê de histórico. É complicado, mas é, como disse, uma das histórias mais sensacionais que a NBA proporcionou nessa temporada. É composto pelo herói de sempre, quase um deus para seus seguidores — Dirk Nowitzki — , o jovem, que veio do nada e subiu a posição de comando como um meteoro que devasta tudo aquilo que vê pela frente — Yogi Ferrell — , aquele que foi expulso do paraíso, do lugar onde todo mundo queria estar e assumiu as rédeas do futuro — Harrison Barnes — , o irmão do rei da NBA, o gemeo esquecido, o patinho feio da família — Seth Curry. Temos outros coadjuvantes, mas, a união de tudo isso, o crescimento inusitado da franquia, mostram que sim, é super divertido para alguém ser torcedor do Dallas esse ano.

De ponta a ponta desses braços, Dirk tem o Dallas em seus braços. (Sean Davis/Flickr)

O Inferno

Comecem com o Inferno. Depois de grandes e maravilhosos 15 playoffs em 16 anos o caminho do Dallas estava fadado ao fracasso. Sim, nada parecia que ia dar certo, que a era Dirk tinha acabado e no fim, o quê? Tankar e torcer para que num futuro próximo uma grande estrela poderia ser e conseguir colocar a franquia nos trilhos. Mark Cuban, dono da franquia, parecia estar mais uma vez decepcionado por ter perdido uma grande free agency e não conseguir adicionar nada de muito útil a equipe. Até a 15ª rodada eram só 2 vitórias. Até a 26ª, apenas 6. Ou seja, o time estava longe de ser o mesmo. Harrison Barnes, grande contratação de impacto, “expulso” — por expulso entenda ter de sair para liberar espaço para a contratação de Kevin Durant — da grande sensação da liga dos últimos tempos mostrava que podia ser algo,mas nada mais contribuia. Dirk não voltava da lesão — só foi jogar o seu 6º jogo na 30ª partida da equipe.

Efeito Ferrell — Purgatório?

Mas, aí, algo de mágico acontece em Dallas. Algo que qualquer analista esportivo não teria a capacidade de analisar. O Mavs, de certa forma sai do limbo do Inferno e sobe a um certo pulgatório. Tudo pela mão do jovem Yogi Ferrell, não draftado em nenhuma posição, direto da D-League, para o time titular de uma das mais regulares franquias da NBA. Aliás, que time de azarões tem o Mavs, hein? Temos, além de Ferrell, Wesley Matthews e Seth Curry no quinteto titular sem ter sido draftado. É impossível pensar que um time assim daria certo.

Enfim, após a estreia de Ferrell foram 17 jogos. 17 jogos com uma sequência linda de 4 vitórias (2 em cima de contenders ao título, Spurs e Cavaliers). Foram 17 jogos e 11 vitórias e 6 derrotas — antes eram 46 jogos, 16 vitórias e 30 derrotas. De um dos candidatos a primeira escolha no draft o Dallas virou um dos candidatos a se classificar aos playoffs.

Estão na briga, principalmente com Denver e Portland, com 2 vitórias de distância. E como isso aconteceu? Óbvio que Yogi Ferrell não é o único motivo disso acontecer. Dirk é ainda útil. Mais do que isso, é a liderança que esse time precisa em quadra.

Dirk Nowitzki decide

E a temporada do senhor alemão está mais iluminada que nunca. Se a história de Dante Alighieri é toda permeada pelas trindades e multiplos de 3 — céu, purgatório e inferno; Razão, Humano e Fé; Onça, Leão e Loba; Pai, Filho eEspirito Santo — não podia ser diferente com Dirk.

Na última semana, ele atingiu a incrível marca de 30 mil pontos (10 mil x 3). Apenas o 6º (3x2 ) jogador que conseguiu chegar a esse patamar (os outros foram só uns tais de Kareem Abdul Jabbar, Karl Malone, Kobe Bryant, Michael Jordan e Wilt Chamberlain), o primeiro estrangeiro, o único em atividade. É curioso ver coroado isso no Mavericks, uma franquia que sem Dirk nunca teria ido a uma final, nunca seria reconhecida como é hoje. E ele mesmo diz que é feliz que isso tenha acontecido aonde tudo começou para ele.

Enfim, Dirk tem um impacto maior. Com ele em quadra o time marca em média 5 pontos a mais por jogo, melhora seu arremesso em 1%, seu arremesso de longe em 1%, movimenta mais a bola e 3 assistências a mais, e erra menos. É basicamente isso, Dirk melhora todos que estão ao seu redor.

Barnes sobe de produção

E não é apenas a somátória de Dirk + Ferrell que fazem o time ir mais longe nessa temporada. Harrison Barnes, por exemplo, passou de um jogador que era um mero coadjuvante, mais um para encaixar na equipe a um jogador que tem cacife para ser protagonista. Um dos grandes candidatos a jogador que mais evoluiu, tem tido um ganho tremendo na temporada.

Barnes deixou de ser o cara que carrega o piano (mesmo que continue fazendo essa função sem pestanejar) e passou a comandar o ataque de uma equipe. Praticamente dobrou sua média de pontos para 20 por partida saindo de 11.7 na sua última temporada — sua melhor no quesito. Aliás, pode acontecer de ele terminar a temporada com a soma de pontos das duas últimas, o que só mostra seu poderio. A porcentagem de jogadas usadas por ele, enquanto ele está em quadra subiu de 15.9% para 26.2%. Harrison está dominando as ações enquanto está jogando — e está correspondendo ao aumento de responsabilidade.

E isso numa contratação que exalava desconfiança, principalmente pelos playoffs do ano passado em que Barnes sumiu de quadra. Por todo o dinheiro investido, o Dallas parece ter realmente acertado nessa.

Curry — não o atual MVP, o irmão

Normalmente jogadores que não são escolhidos no draft não conseguem entrar na NBA. Os que entram são normalmente reservas. Além de Yogi Ferrell e Wesley Matthews, Curry chama destaque.

Primeiro pela narrativa e história. Ele é irmão do atual MVP da liga e filho de um grande jogador noventista. Ou seja, a cada 10 tentativas, em 9 ele seria o patinho feio da família. Na verdade, se você fosse um grande jogador você ainda poderia ser o patinho feio dessa família.

Se você olha a primeira vista, o que parece? Que ele conseguiu seu espaço pelo nome, não sei o que, não sei o que lá. Mas, se você olha essa temporada, sabe que isso não é verdade. Curry, apesar de não ser o irmão, vem sendo muito útil e extremamente importante para a equipe.

Ele basicamente dobrou sua pontuação (de 6.8 a 12.9), suas assistências (1.5 a 2.8), seus roubos de bola (0.5 a 1.2) e seus rebotes (1.4 a 2.6). Além de ter tido 1 jogo mais de 30 pontos e alguns com mais de 20.

Com ele dentro de quadra o time melhora a média em 2 pontos por jogo, aumenta 5 porcento o arremesso de longa distância — splash family — , aumenta o net rating para 0.4 positivo (ao invés de 1.5 negativo). É inegavel o efeito de Curry em Dallas.

O céu e a percepção quanto aos resultados

Não podemos afirmar se o Dallas vai para os playoffs. Mas, o mínimo é que esses resultados dão uma excelente perspectiva para olhar os próximos anos. Do time titular, apenas Dirk e Wesley Matthews passaram dos 30 anos. Yogi, Seth e Barnes tem 23, 24 e 26 anos respectivamente e podem virar um centro nervoso da equipe no futuro.

Nerlens Noel chegou, num excelente negócio. Isso deve mostrar um rumo de pensar mais na frente. O grande objetivo no próximo draft parece ser pegar um possível substituto a Dirk, que está em seus dois últimos anos de contrato e pode se aposentar após isso. Como as primerias posições estão recheadas de grandes armadores e alas, pode ser que sobre um ala-pivô ou pivô com essa qualidade ao Dallas.

O céu nessa temporada pode ocorrer e o time pegar a vaga no Playoff. Mas, essa história de sair do Inferno e ir direto ao céu é algo fantástico para a equipe. E mostra ainda como a percepção muda quanto os resultados veêm. Se quando tinhamos poucas vitórias e muitas derrotas a perspectiva era de terra arrasada e semm muita produtividade prum futuro próximo, agora é de que podem florescer frutos. Por fim, a comédia pode ser e mostrar o seu final feliz.

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