Experiências de Leitura: Jung, Amanda Palmer,Stephen King — um comentário a Carla Soares

Stephanie Borges
Cabine Literária

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Carla, agora que você leu Jung e o Tarô vou colocar as nossas coincidências de leituras, temas e questões na conta da sincronicidade e do zodíaco, embora estejamos em decanatos diferentes, hahaha.

Li Jung e o tarô há uns seis anos, e tava pensando que era a hora de reler, mas aí o O caminho do tarô do Jodorowsky surgiu e essa releitura vai ficar para depois. No entanto, esse livro me atingiu na época porque me fez repensar várias coisas que tinha estudado até então e retomar um plano de tatuar uma carta do tarô (fiz há seis anos e está precisando ser retocada).

Não conheço a Natalie Goldberg e essa questão do acolhimento. No entanto, acho que isso não está no radar do Stephen King em Sobre a escrita. Acho que esse lance da rubrica de escritor tá muito ligado ao crescimento de cursos e faculdades nos EUA para formar escritores. Faz parte cultura deles e formatar as coisas e criar demandas e mercados. Uma oficina de escrita criativa pode ser muito útil, mas não forma um escritor, entrega um diploma. Há muitos grandes autores nunca pisaram numa oficina, leram muito, produziram muito, se formaram em outras áreas e escreveram muito bem. Eu fiz duas oficinas na faculdade e foi uma experiência que mudou a minha relação com o que eu escrevia, mas não sei se seria legal para todo mundo que quer escrever. Depende do método, do objetivo da pessoa, das questões da pessoa com a própria escrita.

Existe uma questão que é a gente se assumir escritor [e aí acho que tem tudo a ver com a fala do King]. Sem pedir desculpas, sem falar que é hobby. Se posicionar. Isso é muito delicado. O que faz de uma pessoa um escritor? Publicar um livro, num país como o Brasil em que pouquíssimas pessoas leem, não representa muita coisa. Ser descoberto por uma editora? Ter um público de leitores que te reconheçam como autor? Eu já me perguntei muito sobre essas coisas e nunca cheguei a uma conclusão, estou empenhada em escrever. Outro dia um amigo me apresentou pra um cara como poeta (hoje em dia escrevo dois poemas num ano) e tive que pensar “cala a boca, não retruca”. Consigo dizer com a maior tranquilidade ‘eu escrevo’ — mas não ‘sou escritora’. E tem muitas coisas que podemos debater pós a leitura Joanna Russ.

Sobre o livro da Amanda Palmer, eu não senti tanto a quebra da primeira para a segunda parte porque acompanho a carreira dela. Acho legal a dinâmica que ela estabelece com o fãs nas redes sociais, embora ache exposição demais. Gosto da história da amizade dela com o Anthony, que infelizmente morreu quando ela estava grávida e ele acabou nomeando o filhinho em homenagem a ele. Mais uma vez, não acho que houvesse algo ali sobre empatia, o livro é centrado da vida dela, é um relato de memórias, no máximo ela comenta sobre diferentes níveis de troca, mas que vai de um pra muitos. Ela oferece a música, uma ilusão de proximidade, certas possibilidades de contato, as pessoas devolvem com grana pra apoiar os projetos, lugares para ficar e o que mais dispõem. Não é uma troca entre dois.

No entanto, serei eternamente grata a Amanda Palmer porque ela me apresentou a Brené Brown, de quem já li dois livros sobre vulnerabilidade e acho maravilhosa.

Como você está atenta a essa questão da empatia, talvez seja legal você dar uma olhada no Exames de empatia da Leslie Jamison. Eu só li o primeiro ensaio, que é muito pessoal. A Juju Gomes leu tudo, talvez possa te falar melhor dele, mas é um livro que investiga tipos de dor, o quanto conseguimos empatizar, a necessidade de empatia no exercício da medicina, a capacidade das pessoas de expressar seus sentimentos quando buscam/precisam de empatia. Pode ter mais a ver com esse seu momento.

Espero que a zica passe, seu PC volte e que venham as leituras de dezembro!

beijo

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Stephanie Borges
Cabine Literária

Poeta e tradutora . Autora de 'Talvez precisemos de um nome para isso'. Escrevo sobre livros na newsletter: tinyletter.com/stephieborges