Olá, eu gosto de você. Você é importante para mim.

Um texto sobre como o amor vence o ódio

Jim Anotsu
Cabine Literária

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por Jim Anotsu

Existem muitas paisagens dentro de uma pessoa.

São universos inteiros que podem ser modificados dependendo do que acontece. Pode ser que toda a euforia do mundo possa ser destruída com uma notícia ruim, pode ser que o pior dos dias se torne emocionante porque ouvimos uma música legal no rádio — se alguém ainda ouvir rádio.

Contudo, do fundo do meu estômago nauseado, acho que nada é pior do que estar apaixonado por alguém que nem sabe que você existe. Ou sabe que você existe, mas não da forma que você gostaria. Acho que podemos sempre discutir as coisas que acontecem lá fora, todos os casos de destruição social e todo o caos do mundo, mas de vez em quando, eu acho que os pequenos desastres internos são tão importantes quanto.

Uma das minhas partes favoritas de O Grande Gatsby, é quando Jay espera por Daisy Buchanan na casa de seu amigo, um bilhão de flores ao seu redor. Jay Gatsby, o cara mais famoso da ilha, que faz as maiores festas e popstar dos ricos, treme com a possibilidade de encontrar a pessoa que amava e pergunta para o amigo se havia ou não exagerado nas flores.

Podemos sentir o tremor de Gatsby nas linhas de Fitzgerald — aquele autor com um amor tempestuoso na forma de Zelda — e o medo de Gatsby é o mesmo que o de todo mundo ao menos uma vez na vida: A pessoa de quem gostamos. Pode ser que você tenha 15 anos de idade ou 20 ou 30 — isso não muda.

É o mesmo sentimento que Charles Dickens imbuiu em seu Pip, protagonista de Grandes Esperanças, destinado a amar a linda e fria Stella, o amor impossível e distante. Um amor que nos faz sentir inadequados, mas também gigantes. Acho que é por isso que gostamos tanto da literatura; ela nos mostra que existem pessoas como a gente por aí, perdidas e abandonadas. Está lá no Werther de Goethe também, o livro tão triste que, supostamente, causou vários suicídios na Europa de antigamente.

Aparentemente, poucas coisas são tão perigosas quanto gostar de alguém.

Acho que posso continuar da seguinte forma: Eu fui o rei da paixão platônica, o imperador de todos os romances que não poderiam dar certo, a porcelana dos vastos oceanos. Ninguém — vamos usar uma hipérbole — conheceu como eu a dor de ficar observando uma pessoa pela distância. Morrendo de vontade de abrir a boca e falar: Ei, eu gosto de você. A vontade, mas não a coragem, apenas o frio no estômago toda vez que a pessoa passava e eu lá com meus olhos de couve morta. É uma coisa que te corrói, porque às vezes essa pessoa é sua melhor amiga e você tem medo de falar alguma coisa e tudo dar errado e a amizade desaparecer — e se você gosta tanto e muito de uma pessoa, você não gostaria de perder a amizade dela, justamente por saber que ela não tem obrigação de corresponder ao seu sentimento, você fica ali com o coração na mão e morrendo de vergonha.

Uma história de paixões platônicas, ódio injustificado e um casamento

Minha primeira paixão platônica foi uma menina da escola que jogava Magic e futebol, baixinha e forte. A outra foi uma garota que sempre ia à locadora na qual eu trabalhava. Também teve uma que gostava de Nightwish e tinha um caderno com a Tarja Turunen na capa — eu acabei ficando com o volume único dela de “O Senhor dos Anéis”. Também gostei de uma pessoa que tinha todos os CDs de emocore do mundo — a única vez em que senti inveja profunda. Também teve a única pessoa que estragou um livro meu e não morreu — que também era a primeira garota tatuada aos 15 anos do bairro. Todos esses casos ajudaram a formar quem eu me tornaria mais tarde, o cara que escreve “livros de menina”, o cara que escreve “emo fantasy” — sim, já disseram isso em alguma resenha por aí.

Acho que a gente vive numa época em que mostrar seus sentimentos, em que sentir alguma coisa é errada e feia e brega, mas eu acho que a melhor coisa do mundo é poder, como canta Kanye West, “wear my heart on the sleeves”, andar com o coração aberto e sem colete à prova de balas.

Num mundo tão horrível quanto o nosso, tão complicado e cheio de preconceitos, concepções erradas e ódio injustificado, acho que o melhor que podemos fazer é colocar um pouco mais dos nossos sentimentos pra fora. As pessoas que pregam o ódio estão colocando os deles para fora o dia inteiro e todo dia, mas raramente a gente tem coragem de chegar para alguém e dizer:

Olá, eu gosto de você. Você é importante para mim.

É sempre mais fácil dizer na internet que “eu odeio isso, eu odeio aquilo, eu odeio tal pessoa”. Acho que precisamos parar de odiar um pouco e dizer mais das coisas boas que estão dentro da gente. Porque pode ser que isso tenha um final legal, ao invés de mais raiva e mais ódio.

Hoje eu sou uma pessoa casada, 20 e poucos anos de idade, com uma garota que era minha paixão platônica pela internet e morava em algum fim do mundo no sul do país — enquanto eu estava em BH Roça City. Foram anos pela internet. Ela tinha um namorado e tudo parecia pronto para dar errado, mas um dia ela virou e disse: “Eu estou pensando em você mais do que deveria”.

E lá se foram 5 anos morando juntos e ouvindo My Chemical Romance, Jimmy Eat World e Fresno. E Destroyer!, porque nem só de emo vive a pessoa, mas de pop canadense também, apesar de que Destroyer parece mais nome de banda de Brutal Black Death Metal.

Eu iria escrever sobre uma coisa completamente diferente, que estava relacionada a uma enxurrada de ofensas que recebi na internet por escrever contra racismo e coisas do tipo. Também iria falar sobre como a polícia me parou mais uma vez na rua e me humilhou, mas…

Whatever.

Pelo menos por hoje. Acho que posso usar meu tempo para trazer o oposto do que essas pessoas trazem, para dizer que nem só de coisa feia se faz um mundo. Então, as pessoas podem te xingar, te ofender, mas se você acredita de verdade numa coisa, se você gosta de verdade de alguém, coloque isso acima de todo ódio que estão espalhando por aí. É como o Jimmy Eat World canta numa das faixas de Bleed American:

Você vai viver sua vida com o pé atrás, olhando em volta?

Você vai perder seu tempo?

Você tem que fazer um movimento ou vai perder.

O que eu quero dizer é: Vamos ter mais coragem de dizer que gostamos de alguém, mais coragem de andar com o coração nas mãos do que coragem pra dizer que odiamos tudo. Vamos aprender com o Pip de Grandes Esperanças que podemos perdoar mais — mesmo quando pisamos na bola, como Pip pisa com Joe, ou quando as pessoas pisam com a gente, tipo o que a Stella diz para ele em certa altura — leia o livro. Então, é isso aí, se tiver alguém que você goste — pode ser namorada, namorado, amiga, amigo, pai, mãe, gato — vai lá e diz alguma coisa.

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Jim Anotsu
Cabine Literária

Autor de “Rani e o Sino da Divisão”. Emo velho. Um panda sociopata. O tipo de coisa que seus pais odiariam. Ama batatas. @jimanotsu