Cap. 2 — Faísca, pólvora e poeira

ravi freitas
Cacto0083
Published in
3 min readMay 15, 2020

Maria colocou os dois pés na parede e ficou admirando o teto do esconderijo. Não que houvesse muito a se admirar, mas pra ela os buracos entre as telhas em que o Sol passava contavam uma história interligada. Pensar nisso fazia o tempo passar mais rápido.

Se levantou com velocidade quando viu que se aproximava a hora de sair, mas foi pegando cada ferramenta necessária com lentidão, como quem tem medo de esquecer algo. Do lado de fora um veículo já a esperava, ligado.

A poeira subia com a velocidade do carro passando pelo chão árido de Tumalina. O plano era simples, mas difícil: entrar na cidade de Cordel De Aço e resgatar Baleia, preso em uma das penitenciárias da cidade.

Sem seu líder, o grupo de revolucionários obteve nada além de derrota nos últimos dias. Os últimos quatro membros estavam perdidos sem o direcionamento e a coragem dele. O resto do bando havia sido assassinada ou levada pelos Cactos que protegiam as terras dos Coronéis.

Há anos eles dominavam as áreas propícias pra cultivo, alimentando a população como bem entendiam e mantendo todos sobre a dura vigilância dos Cactos. As minas locais eram movimentadas por trabalhadores explorados, e o trabalho servia apenas pra que conseguissem comprar o necessário para sobreviver, enquanto aumentava o poder e a fortuna dos mandantes.

Os índices de criminalidade na cidade eram baixíssimos, pelo menos entre moradores. Mas os mortos eram muitos pelas mãos dos tiranos, que não ligavam para esses números. Pior: incentivavam, já que rebelião era retribuída com morte. Exceto em dia de feira, a cidade era habitada por um silêncio opressor.

Por esse motivo, o estrondo que se ouviu naquela tarde pareceu ainda mais alto. O grupo de Maria explodiu uma das paredes da delegacia, surpreendendo todos na cidade e mais ainda quem estava lá dentro. Alguns policiais saíram, acompanhados por 2 Cactos que ficavam de plantão na cadeia.

A troca de tiros durou pouco tempo, até que a cabeça de um dos Cactos foi destruída pela Carabina de Papo Amarelo de Maria. Ela era a única sobrevivente do bando que ainda sabia usá-la. Cada tiro gerava uma reação do seu corpo, que girava com o coice da arma. Seus movimentos circulares junto com o piso seguro e rápido dos seus pés faziam parecer que ela dançava, envolta por faísca, pólvora e poeira.

Todos se calaram após presenciar essa cena, facilitando ainda mais de ouvir o disparo que veio de dentro da cela do líder revolucionário. O entreolhar do bando mostrava que eles já haviam entendido o que aconteceu: Baleia estava morto. Pelas grades, que se tornavam cada vez mais visíveis com o baixar da poeira, era possível ver seu rosto sem vida sendo pressionado contra as barras de metal por uma mão mecânica.

A figura era aterradora. Um homem branco de quase 2 metros de altura erguia o corpo de Baleia, para mostrar aos companheiros do morto o destino que os esperava. De cabelo e barba loira e um suspensório que segurava sua calça, única peça de roupa que ele vestia, era impossível confundir ele com qualquer outra pessoa. Caçador, um dos mais famosos Jagunços da cidade.

Ver o terror no rosto de Maria trouxe apenas uma reação do monstro: um sorriso de canto de boca e o erguer da sua arma em direção a ele.

“Vocês são os próximos!”, gritou Caçador.

--

--

ravi freitas
Cacto0083

eu sou o inverno russo matando todos aqueles que se aproximam