Constelação Clarice: a hora da estrela

Victória Armando
Caderno 2
3 min readFeb 17, 2022

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A exposição “Constelação Clarice” acontece em São Paulo, no Instituto Moreira Salles na Av. Paulista, até o dia 27 de fevereiro

A exposição Constelação Clarice é como um labirinto de dois andares, com diferentes núcleos/temas difundidos, como finitude, cosmologia, e maternidade, que forma uma constelação com várias estrelas da arte brasileira, juntando os inéditos quadros pintados por Clarice Lispector, suas famosas frases, e obras de artistas como Letícia Parente, Hilda Hilst, Lygia Clark, Djanira e Wilma Martins, entre muitas outras. Em comum, as artistas, além de contemporâneas à Clarice, tratam de temas que conversam: qual o meu lugar? de onde vim? para onde vou?

Ao entrar, caminhos sem direção correta. A curadoria já começa acertando ao demonstrar exatamente o que estamos sentindo no atual momento pandêmico: não existe caminho certo. A incógnita do que vai encontrar no final do corredor persiste a cada passo. Esquerda ou Direita? Inúmeras possibilidades.

As obras e frases foram combinadas de acordo com a interpretação subjetiva da curadoria do evento, mas não deixa de ser uma experiência estética e de vida diferenciada. O que essas mulheres expressaram em vida ecoa até hoje.

Essas questões ficam claras ao aproximar a obra de Wilma Martins, Retorno, 1967, e “nasci há alguns instantes, estou ofuscada” — Água Viva, Clarice Lispector.

Wilma Martins, Retorno, 1967. Em exposição no IMS.

“nasci há alguns instantes, estou ofuscada” — Água Viva, Clarice Lispector

Considero a obra de Wilma Martins muito simbólica pois retrata a vontade de retorno à infância, ao útero da mãe, latente na vida adulta. Além disso, a ideia de nascer — ou renascer — a cada momento da vida. Um novo começo. Dói viver, como retrata Clarice em seus escritos. Mas a arte, através da busca de sentido, suaviza essa angústia.

Em determinado momento, ao fim do corredor, me deparo com Clarice, em entrevista a TV Cultura, falando “minha escrita é simples, as pessoas aumentam o que digo por ser escritora”. E percebo que ela não via a grandeza da verdade de suas palavras. É preciso coragem para admitir o vazio, a busca de sentido. E ela o fez. Merece a grandeza.

Ao mesmo tempo, a entendo: nesse lugar de grandeza, ela se desumaniza. Se sente mais ainda estrangeira, matéria latente em sua experiência de vida. Já que veio da Ucrânia muito nova, e se naturalizou brasileira aos 21 anos. Mas sua vida não foi discrepante das mulheres de seu tempo, como demonstram as obras amostradas ao lado de suas frases, elas constroem sentido com as pinturas e esculturas, se complementam. Se complementam como as estrelas em uma constelação no céu.

Uma constelação de mulheres que constroem a hora da estrela: Clarice Lispector.

Clarice Lispector fotografada por Érico Veríssimo em Washington, DC. Em exposição no IMS.

Se você se interessou pela exposição, mas não está em São Paulo, deixo abaixo o vídeo da visita guiada que os curadores preparam :)

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