Fogos de artifício iluminaram o céu de Tóquio nesta sexta-feira, 23 de julho (foto: Tokyo 2020)

De Los Angeles a Tóquio: 10 momentos icônicos em cerimônias de abertura de Olimpíadas

Arthur Mezacasa
Caderno 2
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8 min readJul 23, 2021

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Quase todo mundo possui uma memória marcante sobre as Olimpíadas. Às vezes ela envolve um jogo histórico do seu esporte preferido, uma performance recordista de um atleta famoso, uma medalha conquistada com superação. Mas outras vezes essas memórias inesquecíveis não estão relacionadas exclusivamente às competições. Para muitos, o que marca no maior evento multiesportivo do mundo são as cerimônias de abertura, o momento em que a cidade e o país sede preparam uma verdadeira festa para enaltecer, além dos esportistas, a cultura e a história de seu povo. Nesta sexta-feira, início oficial dos Jogos Tóquio 2020, relembramos as dez últimas aberturas olímpicas e seus momentos mais icônicos, incluindo no final os highlights da cerimônia desta manhã!

1984 — Mar de bandeiras

Los Angeles, ao sediar sua segunda Olimpíada (a primeira havia sido em 1932), escolheu dar à cerimônia de abertura um tema baseado na música americana. Os diversos segmentos da apresentação passearam pelo gospel dos corais de vozes negras, pelo jazz, pela música clássica e pelos novos clássicos: os números musicais da Broadway e as trilhas sonoras de John Williams. Porém, um dos momentos mais belos, e marcantes, da cerimônia foi quando os mais de 90 mil espectadores presentes no estádio Memorial Coliseum formaram um mosaico com as bandeiras dos 140 países participantes. Em uma época em que os Jogos Olímpicos eram assolados por constantes boicotes (promovidos principalmente em decorrência da Guerra Fria), o momento de união do público conseguiu ser um dos destaques daquela abertura.

Mosaico humano formou as bandeiras das 140 nações participantes das Olimpíadas de 1984 (foto: Gordon Henderson)

1988 — Chuva humana

Os jogos de 1988 marcaram o início da chamada Korean Wave, tendência hoje bastante comentada de consumo de cultura da Coreia do Sul pelos ocidentais. Quando a capital Seul sediou a 23ª Olimpíada, o país estava ainda engatinhando no cenário global, e tinha uma cultura completamente desconhecida por boa parte do mundo. A abertura do evento marcou, então, não apenas o início das Olimpíadas, mas também o início de uma guinada cultural sul-coreana. Um dos momentos mais impressionantes da cerimônia (repleta de demonstrações da proeza organizacional dos asiáticos) foi quando dezenas de paraquedistas, usando as cinco cores olímpicas, começaram a despencar do céu para dentro do Estádio de Seul. Um grupo inclusive formou os anéis olímpicos durante a queda.

Equipe de paraquedistas formou os anéis que representam os continentes sobre o Estádio Olímpico de Seul, em 1988.

1992 — Ópera

Os jogos de Barcelona foram embalados por uma trilha sonora nada menos que histórica. Um dos dois temas oficiais das Olimpíadas de 92 foi cantado por Freddie Mercury e pela soprano Montserrat Caballé. Infelizmente Mercury morreu alguns meses antes da cerimônia de abertura, por isso a música “Barcelona” foi utilizada apenas em uma vídeo-montagem no início da transmissão. A cerimônia, porém, foi repleta de momentos em que a ópera foi destaque. Alfredo Kraus, Teresa Berganza, e Agnes Baltsa, todos cantores líricos consagrados, performaram em diferentes segmentos da abertura. Em um dos trechos, centenas de dançarinas de flamenco se apresentaram no Estádio de Montjuic ao som da voz de Plácido Domingo, um dos mais aclamados tenores de todos os tempos.

1996 — O centenário

Os Jogos Olímpicos voltaram aos Estados Unidos no ano em que as olimpíadas modernas completaram seu centenário. Para muitos, era justo que Atenas, berço dos jogos em 1896, fosse a cidade a sediar o evento. Porém, o Comitê Olímpico Internacional (COI/IOC) votou e escolheu Atlanta, nos EUA, para organizar esse “aniversário”, o que gerou comentários negativos por parte de autoridades da época. A cidade, apesar do criticismo, montou uma abertura grandiosa, com elenco estrelado de atletas e artistas dando as caras no Centennial Stadium. Céline Dion, Gladys Knight, Muhammad Ali foram apenas alguns dos nomes presentes na cerimônia. Um dos destaques foi o encontro da tradição das Olimpíadas da Grécia Antiga com a juventude das universidades e escolas de Atlanta. Em um segmento foram relembrados os esportes olímpicos clássicos, em outro, centenas de crianças e jovens formaram o número “100” no centro do estádio.

Através de um jogo de luz e sombras, atores representaram os esportes das Olimpíadas da antiguidade, em segmento da abertura dos jogos de 1996 em Atlanta.

2000 — Pagando dívidas históricas

A cidade de Sydney, a mais populosa da Austrália, ficou responsável pela organização das Olimpíadas de 2000, os chamados “Jogos do Milênio”. Em uma cerimônia de abertura que exaltou as conhecidas belezas naturais do país, como a Grande Barreira de Corais e sua fauna exótica, o destaque foi uma valorização de grupos que por muito tempo foram excluídos de grandes eventos sociais. Em boa parte do espetáculo, tradições aborígenes foram exaltadas: no canto, nas danças e nas vestimentas típicas do povo nativo australiano. No momento em que a tocha olímpica chegou ao estádio, todas as que carregaram a chama foram mulheres, incluindo aí Cathy Freeman, atleta de origem aborígene, que acendeu a pira dos jogos ao colocar a tocha em contato com a água. Um belo truque da tecnologia a serviço de uma bela causa.

A atleta de ascendência aborígene Cathy Freeman acende a Pira Olímpica de 2000 (foto: AFP)

2004 — De volta ao lar

Atenas pode não ter sido escolhida para ser a sede dos Jogos do Centenário ou os do Milênio, mas em 2004 a capital grega teve o seu momento de ser novamente o coração das Olimpíadas. Para marcar essa volta ao lar, o diretor da cerimônia, Dimitris Papaioannou, optou por um visual mais sofisticado para enaltecer a riquíssima história e cultura gregas. A tecnologia foi fator essencial para alcançar esse objetivo, evidenciado quando uma estátua gigante em forma de cabeça emergiu da água que compunha o cenário da cerimônia e foi se despedaçando em esculturas menores que mostravam a evolução da arte da Grécia. Posteriormente, as peças que formavam as estátuas pousaram sobre o lago artificial, representando as centenas de ilhas gregas que se espalham pelo mediterrâneo.

2008 — A China mostra a que veio

Tal como aconteceu com a Coreia do Sul nos anos 80, a China do início dos anos 2000 estava se consolidando como uma potência econômica global, porém sem estar conectada culturalmente com o resto do mundo. A cerimônia de abertura dos jogos de Pequim, em 2008, serviu então para fazer não apenas essa aproximação, mas também para nos deslumbrar com a tecnologia e a escala do que a China é capaz de fazer. Nos primeiros minutos do show, 2.008 percussionistas encantaram com a sincronia ao batucar nos tambores iluminados por LED. Isso ocorrendo em frente a 90 mil espectadores no estádio Ninho de Pássaro, sob um céu modificado cientificamente para reduzir a probabilidade da chuva arruinar o espetáculo (sim, isso existe!).

Dois mil percussionistas deram as boas-vindas a Pequim na aberturas das Olimpíadas de 2008 (foto: Fabrice Coffrini, AFP, Getty Images)

2012 — Pandemônio

Depois do espetáculo criado por Pequim, ficou mais difícil surpreender. Porém Londres, sede das Olimpíadas de 2012, estava fazendo aquele serviço pela terceira vez, e a anterior tinha sido justamente nos primeiros jogos após a Segunda Guerra Mundial. Ou seja: os britânicos entendem de superação. O grande momento na cerimônia de abertura ocorreu mais uma vez ao som de tambores. Dessa vez, liderados pela percussionista Evelyn Glennie, que é surda desde os 12 anos, os tambores embalaram a transformação de um cenário formado por árvores e casinhas de campo em uma metrópole barulhenta e agitada. Representando as mudanças sociais e culturais causadas pela Revolução Industrial, esse trecho da cerimônia — intitulado Pandemonium — culminou na formação dos anéis olímpicos no centro do estádio, que se ergueram suspensos em cabos e se iluminaram como se fossem ferro recém forjado.

Os anéis olímpicos foram iluminados e receberam efeitos especiais para remeter à Revolução Industrial na abertura de Londres 2012 (foto: Getty Images)

2016 — O voo

O Brasil sabe fazer festa. Quando as Olimpíadas chegaram ao Rio de Janeiro em 2016, havia muitos elementos que o povo brasileiro tinha expectativa de encontrar na cerimônia de abertura: o samba, a garota de Ipanema, a beleza da fauna e flora cariocas. Porém, um dos momentos de maior surpresa — e maior orgulho para os espectadores — foi quando apareceu no estádio o inventor Santos Dumont, montado sobre seu 14-bis, reconhecido como um dos primeiros aviões da história. Em um truque bem bolado de ângulo de câmera, projeção e cabos de suspensão, o avião deu a impressão de realmente estar deixando o Maracanã e sair voando pelas praias da cidade maravilhosa.

Uma réplica do avião 14-bis voou simbolicamente sobre o Rio de Janeiro nas Olimpíadas de 2016 (foto: Ezra Shaw, Getty Images)

2020/2021 — O renascimento

Cerimônia de abertura realizada nesta sexta-feira, 23, em Tóquio (foto: Olympics)

Os jogos de Tóquio de 1964 serviram para mostrar ao mundo que o Japão havia sido capaz de se recuperar dos horrores causados pela Segunda Guerra Mundial e que estava prestes a se consolidar como um dos países mais influentes no cenário internacional. Os jogos de 2020, que foram remarcados para 2021 por causa da pandemia de Covid-19, têm como objetivo mostrar que não só o Japão, mas todos os atletas participantes são capazes de resistir até aos mais duros baques da história. Se em 64 a chama da Pira Olímpica foi acesa por um rapaz nascido no dia da explosão da bomba em Hiroshima, em 2021 foi Naomi Osaka, mulher negra e asiática, que teve o papel de iluminar Tóquio com a chama sagrada. A cerimônia de abertura desta sexta-feira foi bem mais simples que as antecessoras, o segmento artístico contou com poucos participantes ao vivo e vários trechos foram vídeos pré-gravados transmitidos pelas emissoras oficiais. Porém, a superação de organizar um evento de tal magnitude em meio à crise sanitária global teve seus momentos de destaque: um minuto de silêncio em homenagem às vítimas do coronavírus, profissionais da saúde carregando a tocha e a bandeira olímpicas, um belo show de fogos de artifício e drones coordenados por computador.

Ainda não sabemos o que marcará a cerimônia de Tóquio 2020 para a eternidade, mas cada um que assistiu ao espetáculo ao vivo tem seu próprio palpite.

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Arthur Mezacasa
Caderno 2

Estudante de jornalismo na Universidade Federal do Rio Grande do Sul