Dias Perfeitos: obra-prima de Wim Wenders

Lançado no Festival de Cannes de 2023, Dias Perfeitos é encantador ao explorar as faces do cotidiano sem abandonar o realismo

Georgia Cristina
Caderno 2
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3 min readApr 12, 2024

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Dias Perfeitos é o mais recente filme do cineasta alemão Wim Wenders, popularmente conhecido por seus filmes Paris, Texas (1984) e Asas do Desejo (1987). À primeira vista, o longa foca na ritualizada rotina de Hirayama (interpretado por Kōji Yakusho), um zelador de banheiros em Tóquio, mas logo veremos que sua trajetória costumeira é interrompida por uma série de eventos que afetam sua vida pessoal.

O longa foi selecionado pelo Japão para representar o país na categoria de Melhor Filme Estrangeiro no último Oscar e, merecidamente, recebeu a indicação pela Academia. Dias Perfeitos é desconcertante, apesar de simples. O roteiro, de Takuma Takasaki e Wenders, triunfa ao balancear a melancolia da bruta jornada de trabalho do protagonista (sem esquecer do elitismo, inclusive) e dos comuns impasses de sua vida particular, com a sua busca pela beleza e pequenas alegrias da rotina. Dias Perfeitos sabe explorar a magnitude que define até as menores interrupções do cotidiano e logo que nos tornamos tão familiarizados com Hirayama, entramos em seu mundo sem muita dificuldade.

Hirayama (Yakusho) e sua sobrinha, Niko (Arisa Nakano) | Foto: Divulgação

O protagonista não seria tão cativante sem a aclamada performance de Kōji Yakusho, que dá vida a Hirayama com maestria e graça, atuação que lhe rendeu o prêmio de Melhor Ator no Festival de Cannes de 2023. Gentil e de poucas palavras, o personagem de Yakusho aprecia a solitude e encontra alguns dos encantos da vida por meio da música, da literatura e através das lentes de sua câmera analógica.

Todos os dias, durante seu intervalo de almoço, Hirayama vai ao parque, se senta no mesmo banco e tira fotos da mesma árvore, mas a diferença está no detalhe: ele procura eternizar o komorebi daquele instante — “komorebi” é a palavra japonesa para o efeito dos raios solares atravessando as folhas das árvores. No meio da repetição da rotina, Hirayama encontra um singelo momento bonito nas bruscas mudanças da luz em meio às folhas de sua adorada árvore.

Dias Perfeitos sustenta que os momentos transformativos da vida também estão nos pequenos eventos, que não é necessário aguardar por um acontecimento extraordinário. É aqui que o filme comove: ele expressa a necessidade de viver o presente, culminando numa obra de superação, já que é preciso equilibrar os momentos desafiadores ou monótonos com os pequenos raios de luz que cercam e iluminam o dia. Por este motivo, Hirayama é querido por todos em sua volta — inclusive nós, telespectadores. Num mundo tão corrido e ansioso, é um desafio apreciar o minuto em que nos encontramos, e Hirayama o abraça com muita dedicação.

Hirayama (Kōji Yakusho) | Foto: Divulgação

Uma das paixões do personagem é a música, que é tão integrada aos rituais diários de Hirayama, que é capaz de reger o filme e acompanhar a trajetória do personagem de forma engenhosa. Logo, a trilha sonora, contendo canções de artistas como Van Morrison, The Velvet Underground e Lou Reed, é deslumbrante de tão bem rigorosamente selecionada, especialmente quando ouvimos a última música, que logo nos informa que nos aproximamos da conclusão do filme.

Mantendo em vista a diversificada filmografia de Wim Wenders, que varia entre documentários, longas e curtas-metragens, Dias Perfeitos surge não somente como mais uma preciosidade entre as obras do diretor, mas é, possivelmente, o ponto mais alto da carreira de Wenders até agora.

O filme, que estreou no país no final de fevereiro deste ano, segue nos cinemas e estará disponível na plataforma de streaming Mubi a partir do dia 12 de abril de 2024.

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Georgia Cristina
Caderno 2

24 anos, estudante de Publicidade e Propaganda, apaixonada por cinema e idiomas, e acho que gosto de escrever também.