MINISSÉRIES

Griselda Blanco: a violência de ser mulher

Sofia Vergara interpreta a rainha da cocaína em série da Netflix

Laura C. Bender
Published in
3 min readFeb 12, 2024

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Reprodução: Netflix

O único homem de quem já tive medo foi uma mulher chamada Griselda Blanco. — Pablo Escobar

Tudo começou em 1978, na cidade de Medelín, Colombia. Uma mulher ensanguentada entrou em sua casa. Ela subiu as escadas até o banheiro e fez um curativo em seu ferimento, então foi até o quarto e acordou seus filhos. Disse que precisavam fugir dali, rápido. Ela os ajudou a fazer as malas e todos correram para o carro. Juntos, a família saiu da Colombia rumo a Miami, nos Estados Unidos.

Mas havia um quilo de cocaína roubado dentro de uma das malas, e foi esse mísero quilo que deu início a um império do narcotráfico.

É assim que a Netflix decidiu começar a contar a história de Griselda Blanco em sua nova minissérie de seis episódios, “Griselda”, que estreou no dia 25 de janeiro.

Conhecida pelos apelidos La Madriña, Viúva Negra e rainha da cocaína, Griselda Blanco foi uma narcotraficante, pioneira do crime organizado e considerada madrinha do Cartel de Medelín durante as décadas de 1970 e 1980, mesma época em que criou as rotas do tráfico para a cidade de Miami, nos EUA. Teve quatro filhos e três maridos. Ainda é dito que ela matou dois de seus cônjuges, mas nada foi confirmado.

Na minissérie, quem brilha ao entrar na pele da criminosa é Sofia Vergara, conhecida por seu papel cômico como Glória Pritchett em Modern Family. No entanto, como Griselda, Sofia ganha espaço para explorar seu talento no drama e interpreta uma mulher que assume diversas faces ao longo de sua história: a ex-prostituta, a esposa, a assassina, a amiga, a narcotraficante, a mafiosa e a mãe.

Porém, mesmo com tanta personalidade, Griselda ainda é subestimada por ter sido uma mulher atuante em uma esfera predominantemente masculina, embora seus feitos não tenham sido pouca coisa e não possam mais ser ignorados. Afinal, estou falando da mulher que desafiou os reis do tráfico em Miami — a família Ochoa —, faturou 80 milhões de dólares com a venda de cocaína e que tinha operações nas principais metrópoles americanas, como Nova York e Los Angeles. Ela amedrontava até mesmo o maior e mais conhecido dos narcotraficantes: Pablo Escobar.

É uma lástima que o nome Griselda tenha vindo à tona somente agora, com a minissérie que conta o início, o auge de sua carreira e, por fim, sua derrocada na prisão. Se soubesse que seu nome voltou a ser falado apenas mais de uma década após sua morte, presumo que ela fosse se revirar debaixo da terra. Podemos chamá-la como uma vítima de apagamento histórico? Creio que sim. Nem mesmo o mundo do crime escapa do machismo.

Já falando de aspectos mais gerais da minissérie, além de Sofia Vergara, outros atores merecem ser mencionados: Alberto Guerra, que interpreta o terceiro e último marido de Griselda, Dario Sepulveda, foi uma surpresa que me agradou, junto com Martín Rodriguez interpretando Rivi Ayala, o braço direito de Griselda assim que ela começou a enriquecer. Além disso, creio que o cenário de uma Miami sob constante ameaça das guerras do tráfico também foi muito bem construído.

Em suma, a Netflix fez justiça à trajetória de Griselda Blanco. Há um pouco de romantização em seu caráter na minissérie? Sem dúvida, porém, sua história — ou ao menos parte dela — ainda é contada de forma visceral, mostrando os capítulos bons: o amor, a fortuna, a família; e os ruins: a loucura, as mortes e a violência.

“Griselda” é um aviso, assim como um lembrete, de que a tradição de subestimar mulheres — sejam elas criminosas ou não — não começou em 1978 na cidade de Medelín, mas já tem data para terminar. É um discurso violento, quase um grito, de que uma mulher pode se destacar onde bem quiser, até mesmo no tráfico de drogas. Isso não é suficiente para mudar a realidade em que vivemos, mas basta por enquanto.

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