Televisão

Os verdadeiros demônios em Demon Slayer

Ganhadora de inúmeros prêmios como melhor animação em 2020, a adaptação do mangá criado por Koyoharu Gotoge, Demon Slayer estreou sua segunda temporada dia 5 de dezembro de 2021.

Giulia Fogali Moreira
Published in
3 min readFeb 22, 2022

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Pôster oficial da segunda temporada de “Demon Slayer” / Distribuição: Crunchyroll

O último episódio da segunda temporada de Demon Slayer foi lançado no penúltimo domingo (13), mantendo algumas lacunas a serem discutidas provavelmente em um terceiro arco da história. Após o término de mais uma temporada, é válida a reflexão sobre o enredo que vai muito além de uma simples animação japonesa.

Em Demon Slayer, acompanhamos o personagem principal Tanjiro lutando para defender sua irmã Nezuko, a única sobrevivente de uma tragédia familiar envolvendo Onis (demônios japoneses), após o desastre Nezuko se torna uma espécie de demônio, e a partir disso, acompanhamos a jornada dos irmãos em busca da cura para essa transformação.

A empatia que sentimos por Tanjiro é gigantesca, pois além de utilizar alguns recursos como a personalização, tornando o público de certa forma parte da vida do personagem, o anime mostra constantemente o passado conturbado do menino, extremamente pobre ele precisou passar sua infância e adolescência vendendo carvão pelas ruas do Japão na era Taishô, época historicamente conhecida pelos problemas sociais e econômicos constantes. Quando conhecemos o plano de fundo de Tanjiro é inevitável a torcida para que o personagem consiga vencer os obstáculos necessários para recuperar a humanidade de sua irmã.

Falando sobre a era Taishô chegamos aum ponto crucial de nossa análise. Por mais que a animação não seja completamente baseada na realidade, muitas partes dela são fatos reais. Do século 12ao 26, a maioria dos japoneses vivia em situação de extrema pobreza e com taxas de desigualdade muito altas, muitos precisavam trabalhar desde cedo, perdendo a maior parte de suas infâncias. Acrescido a isso, nosso personagem principal também já havia passado por um trauma familiar anterior: a perda de seu pai. Com todo o contexto social e os traumas já existentes de Tanjiro, sua luta começou muito antes da aparição dos Onis, e em plena adolescência ele precisou ter uma saúde mental de ferro para continuar tendo esperança por dias melhores.

Mais um reflexo desse contexto social são os amigos de Tanjiro, Inosuke que tem muitos problemas com raiva, e Zenitsu que é extremamente medroso, ao contrário do personagem principal, não somos apresentados a muitos flashbacks da vida desses amigos (o que é muito triste pois eles são ótimos personagens), mas como já comentado aqui, sabemos que no geral a maioria dos japoneses não tinham uma vida muito fácil.

Demon Slayer mistura com criatividade contextos da vida real no Japão com antigas lendas sobre demônios. Mas sinceramente, creio que a existência desses Onis não mudou muito a vida dos Japoneses, podemos ver diversas vezes durante os episódios reações muito tranquilas e inesperadas em relação a isso, ninguém se assusta ou se afoba muito, todos já haviam lidado com situações muito mais amedrontadoras.

A história de Tanjiro e Nezuko nunca foi apenas sobre caçar demônios e buscar respostas, por muitas vezes eles precisam passar por verdadeiras provas físicas e mentais. O anime consegue abordar com leveza alguns temas como a culpa que persegue Tanjiro por não ter estado com sua família no dia do desastre, o preconceito que cerca Nezuko pois ninguém acredita na humanidade de um Oni, e por muitas vezes a morte de pessoas próximas. A mistura frenética e cativante de humor, batalhas arrepiantes e amizades em um ambiente hostil no Japão do século 20, faz com que Demon Slayer seja uma animação única e extremamente interessante.

Portanto, da próxima vez que você assistir o anime, o veja com outros olhos, sabendo que a luta de cada personagem contra “demônios” sempre fez parte de suas vidas.

Texto produzido para o projeto Caderno 2 da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

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