Televisão

Round 6: mais que apenas jogos e violência

Como o mais recente sucesso da Netflix superou expectativas e se tornou a série mais assistida da plataforma

Renato C. Marchetto
Published in
6 min readOct 21, 2021

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Personagens principais de Round 6 alinhados num ambiente iluminado e seco aparentemente observando algo surpreendente.
Personagens principais de Round 6. Reprodução: Netflix.

Este texto contém spoilers sobre a primeira temporada da série Round 6.

Lançada mundialmente em setembro de 2021 e ficando conhecida por unir drama, terror, suspense, mortes sangrentas, jogos infantis e desafios de vida ou morte, o thriller sul-coreano Round 6 (ou Squid Game, nome pelo qual ela é conhecida no resto do mundo) é o mais recente super sucesso do Netflix. A empresa de streaming anunciou recentemente que a série bateu os recordes da plataforma e se tornou a série mais vista da história, assistida por mais de 111 milhões de lares, desbancando o recordista anterior Bridgerton. Todo esse sucesso é justificado por uma trama bem desenvolvida, personagens carismáticos que geram uma forte empatia e momentos de terror psicológico que deixam quem assiste no nervosismo de talvez perder um de seus personagens favoritos.

A ideia da série não é sem precedentes, um grupo de pessoas que participa de uma espécie de jogo onde tentam sobreviver em um ambiente desfavorável que leva os participantes ao extremo. Em diversos momentos é possível perceber algumas semelhanças com outras produções como Jogos Vorazes, Jogos Mortais e mesmo com a série “3%”, outro lançamento da Netflix que foi criado por brasileiros e que também bebe dessa fonte. Ainda assim, Round 6 se diferencia destas, pois os jogos funcionam como um experimento social, quase uma demonstração de teorias sociológicas que por vezes podem ficar escondidas em meio às mortes e a violência explícita que a série traz.

Cena do primeiro episódio, Batatinha Frita 1, 2, 3. (Reprodução: Netflix)

Batatinha Frita 1, 2, 3…

O primeiro episódio da série já dá um gostinho de tudo o que o público deve esperar dela, um dos responsáveis pela viralização da série no Brasil, o episódio de nome “Batatinha Frita 1, 2, 3” é um grande cartão de visita. Ele apresenta o cerne da trama: 456 pessoas disputando jogos infantis onde perder leva a um fim trágico e ganhar leva ao prêmio de 45 bilhões de wons (moeda sul-coreana).

Com uma direção de arte e uma fotografia muito bem feitas, tudo naquele ambiente de jogos é muito colorido e simpático, causando até uma estranheza no público. Características que pensam no choque e na surpresa do primeiro momento em que um jogador falha no famigerado jogo da boneca. Daí para frente, a maioria dos participantes se tornam apenas números, que vão diminuindo a cada episódio, assim como as cores e a simpatia daquele ambiente que dão lugar à escuridão, ao suspense, e à violência.

Além disso, o primeiro episódio também apresenta o protagonista da série Seong Gi-Hun, um homem falido, pai ausente, viciado em jogos e que, pelo menos em um primeiro momento, aparenta ser um grande folgado. Um personagem que aparenta ter sido pensado para causar desconforto ou mesmo a raiva do espectador, mas que ao longo da série vai conquistando o público pelo seu carisma e sua enorme empatia com o próximo.

Seong Gi-Hun ou 456, protagonista de Round 6. (Reprodução: Netflix)

Qual é o seu favorito?

Um diferencial de Round 6 em relação a produções semelhantes são os seus personagens, na verdade, eles são o grande motivo pelo qual a série consegue prender o seu público durante toda a temporada. Carregados de apego emocional e de duras histórias que mostram a realidade dos menos privilegiados, os personagens de Round 6 deixam o público ávido por saber o que acontecerá. É impossível não se apegar a um deles, seja o imigrante paquistanês que foi para a Coréia do Sul em busca de uma vida nova, a fugitiva norte-coreana que busca trazer sua família pro sul, o pobre velhinho que está enlouquecendo com um tumor na cabeça ou o protagonista falido que deve para agiotas e tem a mãe doente. Algum deles irá despertar o seu apego e empatia e então, você vai assistir à série por horas querendo descobrir o destino do seu favorito e com medo do que o roteiro destina a ele. Certamente o ponto mais forte da série.

240 ou Ji-Yeong (esquerda) e 067 ou Kang Sae-Byeok (direita), personagens importantes de Round 6. (Reprodução: Netflix)

Críticas e questões trazidas pela série

Outro ponto interessante do enredo de Round 6 são os diversos questionamentos morais e éticos que a série levanta ao longo dos jogos. Ela tem uma crítica clara ao sistema capitalista e a desigualdade social que ele causa, coloca em xeque os seus ideais egoístas que primam pelo benefício próprio e o desejo, em detrimento do bem-estar social. Isso tudo é elevado ao extremo pelo ambiente em que os personagens são inseridos, onde mesmo o mais humano e moral competidor é forçado à corrupção dos seus ideais e a buscar maquiavelicamente aquilo que mais deseja.

Round 6 mostra a falta de humanidade em sua forma máxima, sendo inclusive ressaltada em determinado momento da história quando o organizador dos jogos compara os seus competidores a cavalos de corrida. A série é um exemplo exagerado vindo da ficção, mas que é capaz de mostrar uma difícil e existente realidade, ela traz acima de qualquer horror superficial uma desesperança e tristeza pelas vítimas daquela sociedade.

Você não aposta em cavalos? Vocês são os nossos cavalos, nós também apostamos.

Fala do líder/organizador dos jogos para Gi-Hun.

Segunda Temporada

O final de Round 6 deixou vários caminhos para uma segunda temporada:

  • O protagonista Gi-Hun perturbado com a continuação dos jogos que aparentemente buscará por vingança;
  • O arco sobre um policial infiltrado que descobre que o organizador dos jogos é na verdade seu irmão. Parte que foi mal aproveitada pelo enredo da primeira temporada;
  • Quem são os VIPs e os idealizadores dos jogos e como eles começaram;
  • Qual será o futuro dos jogos visto que o seu principal idealizador morreu ao final da temporada.

São várias aberturas para uma continuação da série, o que talvez seja o seu grande pecado. O roteiro da primeira temporada é bem amarrado e fechado, fazer mais temporadas baseadas apenas no sucesso da série e não em uma história bem feita pode ser bastante temeroso para a qualidade da série. É perceptível que o ponto mais alto da história é nos seus últimos episódios, contudo depois que os mistérios e narrativas se resolvem e a série se encaminha para suas últimas cenas, ela perde um pouco do seu objetivo e possivelmente, sela o destino e o caminho que a série vai seguir. Um caminho que talvez não seja tão interessante quanto o da primeira temporada.

A Netflix ainda não confirmou oficialmente uma segunda temporada, mas o seu criador Hwang Dong-hyuk já adiantou que tem mais histórias para contar numa possível continuação. Baseado no seu gigantesco sucesso e na forma como a Netflix trata as suas produções, é previsível que em breve ela seja renovada por pelo menos mais uma temporada.

Round 6 vale a pena?

Apesar de ter pequenos deslizes, Round 6 entrega bem o que ela se propõe a dar: uma boa história de drama contada com intensidade, suspense, terror psicológico, e, claro, com grandes doses de violência explícita. Para quem gosta, pode ser uma ótima opção para animar o halloween.

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Renato C. Marchetto
Caderno 2

Estudante de Publicidade e Propaganda na Universidade Federal do Rio Grande do Sul