Música

Sendo uma Brat num mundo de Barbies

Atitude, ousadia e irreverência são alguns dos elementos que preenchem o novo álbum de Charli XCX

Bárbara Corrêa
Caderno 2
Published in
5 min readJul 15, 2024

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Reprodução: Wikipédia

Se 2023 foi o ano das Barbies, 2024 veio para ser o ano das “Brats”. Mas, se você está pensando que vamos falar sobre a linha de bonecas ousadas e descoladas, que vieram para fugir do padrão da boneca loira, alta, de olhos azuis e que mora num mundo cor de rosa… bem, até que você não está tão errado assim, porém vamos falar de garotas reais.

Assim como as Bratz dos anos 2000, o álbum Brat, da cantora inglesa Charli XCX, chegou em 7 de junho de 2024 revolucionando o mercado pop e alcançando um público majoritariamente feminino e LGBTQIAP+, saturados de estéticas rasas como “clean girl” e de tanta perfeição que nos cerca. No inglês, o termo brat é usado para referenciar alguém desobediente, geralmente uma criança rebelde, ou “pirralha”, que muitas vezes não é levada a sério por ter coragem de ser quem é e não seguir o que os outros dizem. Desse modo, Charli veio para nos lembrar de que para ser brat é preciso ter a ousadia de ser você mesmo.

A própria estética do álbum é ousada e disruptiva. Uma simples capa verde — num tom nada convencional — com a palavra Brat foi suficiente para chamar a atenção do público, que logo transformou o álbum em um verdadeiro movimento pop. Durante a época de lançamento, Charli revelou que “queria algo ofensivo, um tom de verde fora de moda para provocar a ideia de que algo estava errado”. A cantora também disponibilizou um site chamado brat generator, onde era possível qualquer pessoa personalizar a sua capa, podendo escrever o que quisesse naquele espaço verde chamativo. Isso foi suficiente para que milhares de estáticos do álbum se espalhassem pela internet de maneira divertida, fazendo com que marcas de todos os lugares também entrassem na brincadeira e adotassem o “verde brat”, agora um fenômeno consagrado na música, moda e publicidade.

Reprodução: Twitter (X)

E por falar em música — a parte mais importante de todas — , aqui o álbum também revoluciona. A produção das faixas transita entre diferentes vertentes do gênero pop, como eletropop e hyperpop, o que também pode ser traduzido como aquelas músicas que ouvimos mais em boates e danceterias. Se Renaissance de Beyoncé veio para reviver a essência da cultura ballroom, Brat veio para popularizar sonoramente e reacender a chama da cultura clubber formada nos anos 90. Já em suas composições, Charli aborda com um tom atrevido temáticas que sempre estiveram presentes no cotidiano de garotas, em toda sua pluralidade, mas geralmente são mascaradas pela sociedade com discursos unicamente positivos e muitas vezes incompreensivos. Empoderamento? Sim! Mas também inseguranças, rivalidade feminina, sorrisos forçados, se apaixonar inúmeras vezes e errar mais vezes ainda, não se importar com a opinião alheia ou somente fingir que não se importa… it’s so confusing sometimes to be a girl — e todas passam por isso. Brat é sobre se divertir sendo uma garota e se divertir também com os conflitos que isso traz. A realidade é que precisamos encarar aquilo que nos atormenta, mas isso não precisa ser um problema, talvez só precisamos colocar uma roupa que gostamos, um fone de ouvido e decidirmos facilitar as coisas para nós mesmos. Isso é ser Brat.

Um dos pontos que mais chamou atenção nessa era da artista também foi o lançamento de um remix da música Girl, so confusing, intitulado The girl, so confusing version with lorde, com participação da cantora neozelandesa Lorde. O remix causou uma grande surpresa nos fãs por colocar um ponto final na rixa de anos entre as duas artistas, que usaram da composição para dizer como se sentiam uma sobre a outra e esclarecer tudo.

Ainda do ponto de vista musical, o álbum conquistou incríveis 95 pontos no Metacritic (site que reúne todas as avaliações da crítica especializada), sendo essa a nota mais alta para um disco no ano, superando artistas como Beyoncé, Billie Eilish e Taylor Swift. Também é possível encontrá-lo em primeiro lugar na lista “Melhores Álbuns de 2024 Até Agora”, disponível no site de acordo com as notas.

A realidade é que até mesmo as Barbies têm uma Brat dentro de si… a questão é se elas aceitam esse lado ou o reprimem por medo do que as pessoas irão pensar. Não tem problema algum ser uma Barbie, afinal as mulheres serem diferentes entre si é o que torna tudo mais especial; no entanto, é necessário lembrar que não precisamos descartar nosso lado Brat para alcançar padrões e estereótipos que talvez não nos pertençam. Curiosamente, Charli também esteve presente na trilha sonora do filme Barbie com a canção Speed Drive, tocada em uma cena que ilustrava o lado mais audacioso da boneca se libertando… coincidência? até poderia ser, mas Charli hoje definitivamente é sinônimo de atitude e ousadia.

Reprodução Charli XCX/Instagram

Brat nos ensina uma lição sobre essa atitude e ousadia, assim como autenticidade e irreverência. Talvez a maior lição do conjunto da obra é a de que não precisamos de nada além da nossa essência para sermos especiais. O álbum fez sucesso por si só, por ser — sem medo — quem ele é, independente de influências externas e de todo o jogo que existe para se manter no topo da indústria pop musical. Ele nos ensina que o simples pode ser suficiente para cativar os outros, se tivermos personalidade e acreditarmos em nós mesmos, e de que ser uma Brat num mundo de Barbies pode ser desafiador, mas igualmente libertador.

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