O empata-rolê (9)
Eu nunca tinha visto nem escutado nada parecido com aquilo. Levou algum tempo para os meus olhos e ouvidos se situarem. A levada era estranhamente agradável e as imagens, ao mesmo tempo inteligentes e tortas, eram divertidas, eram hipnotizantes, eram sedutoras. Foi um baque indescritível. Que música era aquela?
Era Banana Man, da banda americana Tally Hall.
A música parecia um rico buffet de ritmos, gostos e texturas. Deixei-me ficar à deriva sobre aquelas águas sonoras. Depois do estranhamento inicial, foi fácil gostar…
Foi, sem dúvida, o único momento daquela noite (e, quem sabe, de todas as outras interações minhas com aqueles dois) em que eu, sem esforço masoquista, estava razoavelmente integrado e de fato me divertindo. Os egos do Lohan e do meu amigo eram enormes e, por serem enormes, tinham sempre essa dinâmica engolidora, atropeladora, anuladora, uniformizadora. A troca era raridade. Eles eram o dono do rolê, e eu deveria correr sempre para acompanhá-los, ceder nas minhas discordâncias, negar a minha vibe, me despersonalizar se fosse preciso. Não era de ontem que o universo deles era um mosaico sufocante de babaquices problemáticas e pílulas politicamente corretas. Às vezes eu me sentia rodeado de padres que decidiram se tornar comediantes de humor pesado, mas que não passaram ainda da transição. Ou seria justamente o contrário?
Mas ali, naquele instante quase mágico, nem lá, nem cá: por alguns minutos, uma leveza muito suave pairou sobre nós. Por alguns minutos, eu pude esquecer de todas as nossas diferenças. E eles, acredito, esqueceram também das minhas.
Breve, porém, foi a leveza que se instaurou; nem cinco minutos. A música mal acabou quando o dedo nervoso de meu amigo enfiou o Gimme Danger dos Stooges, a banda-fetiche dos dois. Lohan tirou do nada um baseado. Acenderam, me ofereceram, eu recusei conforme o protocolo. Os mesmos olhares estranhos, o mesmo clima ruim calculado. E se eu roubasse o controle? Tocar um Raça Negra ali seria um baita gesto político. As grossas volutas da fumaça adocicada chegavam mais e mais ao meu rosto. Mesmo com isso, era evidente a caretice do rolê, o vácuo da programação, a frustração que era perder Metrópolis por toda aquela bosta. Nem uns pães de queijo, nem umas gatinhas loucas, nem uns alcoólicos para a gente misturar. Só diamba e tevê. Sequer havia um cafezinho quente para dizer que eu também possuía a minha droga-coxinha.