Chove
E quando a chuva cai dentro de você? — Reação em Cadeia.
Quando começou a chover na última quarta-feira, Leo não correu.
Os pingos começaram tímidos e, após segundos, logo caíram como se Deus estivesse desesperado. Leo não acreditava nesse tal de Deus, mas estava desesperado.
Viu pessoas correrem, em poucos minutos já não havia ninguém nas ruas de São Bernardo. Somente Leo, andando um pouco rápido, os carros e a chuva. Leo se perguntou o porquê da pressa.
Lembrou de todos os compromissos e trabalhos pendentes, de todas as mensagens que precisava responder, de todos os artigos para escrever, de todas as reuniões com os orientadores de TCC. Estava desesperado.
Parou, respirou fundo e, depois de alguns passos acelerados, andou devagar sentindo cada gota cair sobre seu corpo. E o calor da chuva que aumentava com o mormaço de fim de verão começou a deixá-lo frio. Cada passo devagar e leve levava Leo para lugar nenhum. Era onde queria estar.
Desacelerado, sentiu o vento balançar as folhas das árvores. Parecia que as árvores gritavam. Pouco depois, junto ao estrondo da chuva, ouviu o barulho dos pneus levantando água do asfalto, somado ao grito das árvores, ao seu desespero e ao de Deus.
De olhos fechados, continuou a caminhada sem ver o que era calçada ou rua. Sentindo os pingos frios em suas pálpebras, lembrou de quando era criança. De quando sua mãe pedia para correr, correr e correr pra casa, pra não se molhar, pra não esperar Deus criar poças, pra não brincar na chuva. Leo não lembrava de ter brincado na chuva. Ele nunca brincou.
Lembrou que tinha uma sombrinha na mochila, mas resolveu deixá-la lá. Queria sentir a chuva como nunca sentiu, queria se molhar.
Próximo ao semáforo, um motorista parado, vendo Leo encharcado, gritou: cê é louco? corre dessa chuva!
Leo abriu os olhos, em meio à chuva torrencial, e avistou o motorista. Respirou devagar, sentindo o vento e o cheiro da chuva, expirou devagar, fechou os olhos e respondeu: já corri demais.
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