Boho-Boring

Lila Cruz
cafeinazine
Published in
5 min readJul 21, 2016

Você só pode ter um estilo nesta vida, e este estilo é o hippie- saí da praia-chic

Demorou muito até que eu entendesse o tipo de roupa que não gostava. Durante a maior parte da minha adolescência em Salvador, vesti o que estava na moda, me sentindo bem com absolutamente…nada. Já passamos por muitás épocas difíceis para mim — a da calça que ao mínimo movimento mostrava a bunda inteira, a dos shortinhos com o bolso aparecendo por baixo, a época em que se usava muita saia indiana, pra tudo na vida. Nenhuma, porém, me parece mais complicada que essa em que vivo: a fase das florzinhas. Sim, estamos na fase das florzinhas. Pelo menos aqui em Salvador, e a julgar pelo que vejo na inundação de marcas cariocas boho-chic nos shoppings de minha cidade, não vamos nos ver livres deste momento tão cedo.

Foi com uns 25 anos que olhei bem pro meu guarda-roupa e pensei: “Minhas roupas me irritam”. Num acesso taquei tudo no chão, e comecei a refletir sobre o que realmente usava, o que odiava muito mas tinha preguiça de separar e o que usava porque ganhei de presente e não queria magoar ninguém. Desta vez, tirei absolutamente tudo que não tinha razão de estar ali (inclusive os presentes), e ao observar as diferenças entre o que eu usava e o que tinha cheiro de guardado notei coisas muito interessantes sobre mim mesma:

  • Eu não curtia coisas muito coloridas;
  • Eu não curtia muitas estampas que não fossem geométricas;
  • Eu não curtia roupas que me dessem trabalho durante o dia;
  • Realmente nunca fui muito fã de usar rosa, em especial rosa clarinho;
  • Eu me sentia muito mal usando roupa cheia de florzinha.

Explico: eu me sinto usando um disfarce, uma roupa que está dizendo “olha ela, que vintage-feminina-delicada”, quando, se fosse pra ser vintage, eu gostaria de ser algo muito próximo do que a Patti Smith vestia em 1970. Tudo bem, a Patti Smith tinha uma vibe hippie, mas o que mais curtia no visual dela eram as blusas listradas, as roupas pretas, as camisas de botão e as muitas calças jeans. Aos poucos, fui decodificando eu mesma enquanto entendia o que eu parecia ser visualmente. Foi muito legal começar a me conhecer assim, até outro dia eu me vestia pra me enturmar.

Isso, porém, não tornou comprar roupa mais fácil.

Sim pfvr

Salvador é um lugar que só vende bota de junho a agosto. Onde há boas chances de você só encontrar roupas com flores, sandálias gladiadoras, desenhos engraçadinhos ou coisinhas que toda moça vintage descolada tem que ter no guarda-roupa. E lojas de shopping também não ajudam. Outro dia me vi gritando “ESSA BOSTA DE CIDADE SÓ TEM MODA PRAIA” com uma moça, coitada, que não tinha culpa de nada. Tudo porque A, a loja só vendia roupa pra mulher magra, B, todas as roupas ali pareciam ter saído de uma festa na praia e C, eu já tinha ido em mais ou menos umas 10 lojas na esperança de achar alguma coisa SEM FLOR. Só queria um mísero vestido. Voltei pra casa sem nada, obrigada. E desculpa, moça.

O fato é que quem não gosta de ser vintage, ou hippie, ou usar lantejoulas e brilhinhos simplesmente está fadado a usar blusa lisa com calça jeans pelo resto da vida. Mentira, exagerei, mas o caminho é quase por aí. Basta olhar uma loja da Farm, Forever 21, Mara Filó, Antix e similares. As que não são assim ou são muito caras ou ainda vão seguir a tendência (ou são aquelas como a GAP e a Lacoste, que você sai usando a marca nos peitos, não sei por que diabos). Eu só queria uma blusa listrada com um tecido que não deixasse um efeito que aparenta ser uma distorção dos meus peitos. Se eu fosse pensar em uma outra mulher que me inspira, seria a Coco Chanel (sem aqueles terninhos), em especial porque ela preferia, antes de tudo, estar confortável.

Por uma blusa de listras que não distorça os peitos grandes, grata.

Não quero caber dentro de rótulo nenhum, e gostaria que a moda respeitasse isso. Ela me classifica sem a minha autorização, e agora ela está me dizendo que o certo é usar esses diabos desses vestidos 3x menores que o comprimento das minhas coxas (tenho pernas gigantes) e que tá tudo ok se eu não gostar de usar vestido com estampa de aviãozinho, porque eu vou ter que usar assim mesmo. Ou eu serei muito bem vinda nas lojas onde não tenho condição de pagar nada.

Welcome to the boho land, mais conhecida como a terra da Farm (onde todo mundo veste P)

Talvez seja uma crise de criatividade das marcas. Talvez preguiça. Talvez seja um problema meu e eu que ache uma costureira e mande fazer minhas roupas, mas quem é que tem tempo e dinheiro pra isso, gente. Eu só queria achar as coisas facinho como quem quer achar um diacho de um top florido cropped encontra. Queria mais opções, feitas para quem gosta de montar um visual, mas que se encontra entre o feminino e o masculino, e não na piscina girly — que respeito muito, mas que não me dá muita opção.

E nem adianta procurar essas roupas da moda “sem gênero”, porque na real elas tem uma modelagem que só fica boa no corpo dos caras, a gente sabe disso. De moletom, já basta os que tenho em casa. Resta saber até quando vão nos dizer que todo mundo têm que se fingir de hippie (porque as marcas mais fortemente boho são as mais caras, o que é uma ironia incrível com o movimento hippie, hahaha) ou nos dar rótulos de “estilo roqueiro” (a.k.a camisa de banda e roupa desfiada), “hipster” (qualquer roupa que custe acima de 200 reais, isso também vale para brechós) ou “boho-saí da praia- chique”.

No momento eu prefiro não comprar nada, obrigada.

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