Carta que nunca será lida

Carta Anônima
Cafe Livros
Published in
3 min readFeb 26, 2018

O primeiro ponto do último parágrafo

Eu não preciso dizer em que momento foi escrita, ou quanto tempo foi necessário para escrevê-la e, muito menos incluir um destinatário.

Essa é uma das tantas cartas que nunca serão lidas, não por terem sido extraviadas durante seu trajeto, ou porque o Rex comeu assim que o envelope passou por debaixo da porta, ou por que alguém jogou fora por achar ser uma besteira.

Essa carta não será lida pelo simples fato de nunca ser entregue.

Meus apelos por liberdade deste corpo e desta vida, não serão vistos. Minha alma que entregue está por um amor desastroso, por medo da solidão não será compreendida, e meus desabafos e frustrações emocionais e físicos, não serão divididas com outro alguém porque a importância será quase que nula. Minha busca pelo fragmento lançado pelo caminho que trilhei, já parece ser um sonho distante, pois já não encontro razão neste plano.

Apenas escrevo para o alívio de meu ser, que repassa ao papel as mensagens tatuadas em minha alma, que ardem e inflamam todas as vezes que são tocadas ou relembradas.

Compartilho nesse envelope branco as lágrimas da madrugada, o desespero que entra sem ao menos bater na porta; todas as vezes que o sol se esconde dando lugar ao céu negro. Uma versão extensa e real de minha alma, meu pavor interno, que pede passagem aos meus pensamentos e aflora o desejo de libertação, por um infinito desconhecido. É a ausência de minha própria metade, o esvair de minha própria luz, o desfalecer de meus próprios desejos, e o enterrar de meus próprios sonhos.

Mas ninguém saberá que essa é uma carta de despedida do meu próprio ser.

Entre vinhos baratos e blues da década de 80 despeço-me de mim, embriagando-me em goles profundos. Mergulho em minhas próprias lamentações e transcendo o limite entre o papel e a caneta, que me proporcionam alívios momentâneos de uma dor profunda, como a nicotina corrosiva que degrada lentamente um corpo de alma já debilitada. Em uma última tentativa, despeço-me de meu ser negro, do monstro na beirada de minha cama, e, no crepitar do fogo lanço-me para uma nova versão de mim. Alguém diferente, forjada pelo anseio de seu íntimo que outrora esteve em silêncio, fundido a uma forma envolvente, completa, segura e ausente deste plano tão mórbido, em busca da luz de minha própria aurora, dando lugar ao novo eu.

A carta que nunca será lida sou Eu: em corpo, alma, mente e coração.

Aquela incompreendida e reclusa que se redescobriu ao dar uma nova chance para seus próprios anseios. A que da noite fazia parte, e na sua escuridão compartilhava suas próprias desilusões. Hoje é uma carta sem destino ou tradução, pois se algum dia existiu o ser que poderia interpretá-la foi lançado junto ao fogo de sua alma.

CONTRIBUA

Gostou? Deixe o seu comentário e recomende!

Faça esse texto ser lido por mais pessoas, clique nos aplausos — eles vão de 1 a 50.

REDES SOCIAIS

Instagram, Twitter

Leia a nossa revista clicando aqui

Participe do nosso grupo no Facebook compartilhe textos e convide os amigos!

OUTRAS INFORMAÇÕES

Revisão: Maykon Miranda

--

--

Cafe Livros
Cafe Livros

Published in Cafe Livros

A história da vida, do cotidiano e aquilo que vivemos.

Carta Anônima
Carta Anônima

Written by Carta Anônima

Autora do ig @carta.anonima. Escritora na revista Café Livros. São apenas uns escritos soltos para o alívio de uma mente conturbada. Sinta-se acolhido(a)!

No responses yet