Ser escritor no Brasil é motivo de piada

Segundo jornal americano (?!)

Robson Felix
Cala a Sua Boca e Pega Logo a Saideira!
3 min readJul 20, 2016

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Eu confesso que (ainda) sinto vergonha ao me dizer escritor.

Não só pela ideia de ser um autor de um livro só, mas também pelo estigma de ser um autor sem leitores.

Mas, é fato que eu não fico confortável quando alguém me apresenta como escritor e eu sabia que os motivos inconscientes extrapolavam a razão.

Uma jornalista do New York Times escreveu em sua coluna que “ser escritor no Brasil é a mais patética das profissões”, alguém leu isso?

Ler esta matéria me ajudou a entender o porquê de meu constrangimento ao me declarar escritor.

A jornalista do renomado diário americano, instrui aos seus leitores escritores, em um tom jocoso que, caso venha ao Brasil sob qualquer pretexto, a não cometer o sincericídio de se dizer escritor, sob pena de ter o seu cartão de crédito recusado na mercearia ou receber como réplica algo como: “não, sério… o que você faz para viver?”.

A perspicaz jornalista lembra que os escritores não estão sozinhos no Brasil nessa decadência de status quo social detectada por ela. Os professores, matemáticos e historiadores, do Brasil, salienta ela, também são muito desvalorizados, creditando este círculo vicioso decadente ao índice vergonhoso de leitura da nossa população média.

Fato!

Mas, ao ler essas verdades sobre nosso país em um jornal estrangeiro fui tomado por um ufanismo irracional e um ímpeto de defender as cores da nossa bandeira dos ataques dos “infiéis ianques”.

Passado o afã inicial, percebi que a moça não estava muito longe da verdade.

Na verdade ela tinha era atingido um nervo exposto.

Continuei lendo a matéria do jornal gringo e qual foi a surpresa ao saber que a jornalista que a publicou é escritora e também brasileira.

Ao ser confrontada com o tom difamatório e jocoso da matéria que escreveu para o jornal americano, a escritora brasileira ilustrou, com números, o que afirmou na reportagem.

Vanessa Bárbara contou ao R7, em entrevista, que venceu um prêmio literário com e mais recente livro que vendeu ao todo 3.000 livros, que custa em média US$15,00 (R$ 34,80).

O valor repassado para o autor é de 5% então, segundo a própria, ela receberia US$ 0,75 (R$ 1,34) por cada cópia vendida.

Pelo livro que ela levou um ano para escrever e mais quatro para vender o total de três mil cópias, ela recebeu em torno de US$ 2.250,00 (R$ 5.220,00).

— Deveria ter destinado meu corpo para a ciência — , diz ela.

Ler essa matéria do The New York Times me fez lembrar de uma história engraçada sobre a profissão de escritor contada por Laurentino Gomes em uma entrevista à Leda Nagle, que ilustra o paradoxo imagético do escritor.

Larentino contou no programa Sem Censura, que ele pressentia uma certa curiosidade de seu porteiro em relação ao que ele fazia para viver, pois o tal homem o olhava curioso em suas raras saídas de casa, mas nada dizia.

Até que um dia ao lhe entregar as contas do mês o porteiro em um ímpeto de coragem perguntou diretamente para Laurentino Gomes:

— O senhor trabalha com o quê?

Larentino, instado à responder a tal pergunta de um milhão de dólares e fisgado pela vaidade de pontuar com o seu dom os motivos de sua introspecção e a origem de parte de sua renda (afinal o homem é um inegável escritor best seller, certo?), dirimindo, de uma vez por todas, as suspeitas de seu porteiro curioso, encheu o peito de ar e respondeu altivo:

— Eu sou escritor!

O porteiro o olhou de uma maneira profunda e compreensiva durante alguns segundos, que lhe pareceram horas, e tomado por uma complacência repentina e sincera diz, com as mãos nos ombros de um de nossos maiores best sellers:

— É… a vida não anda fácil pra ninguém, não é doutor? Mas, vai melhorar. — pontuou o porteiro.

Essa história nos mostra que além motivos de piada nós, escritores tupiniquins, também somos dignos de pena.

Seria cômico se não fosse trágico.

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