Filmes que sonham

Pensamentos soltos pela beleza de um cinema brega e imperfeito

Queremos a beleza da imperfeição, da sujeira e da incompletude. Queremos filmes que sonham, acima de tudo. Para além do filme-político, do filme-artístico, do filme-sério, queremos filme-filme.

Reza a lenda que após um longo e naturalista dia de trabalho, nossos filmes chegam em casa, jogam longe o paletó, afrouxam a gravata, põem um belíssimo e colorido vestido festivo e saem para um misterioso carnaval da madrugada. Andam pelas ruas mal iluminadas cantando músicas de esperança, distribuindo sonhos por quem quer que passe a essa hora, deixando rastros de fantasia em cada um dos paralelepípedos por onde se firmam seus pés.

Queremos filmes que abracem a contradição e encontrem personalidade nas limitações do subdesenvolvimento. Um cinema brega, que pouco está preocupado em parecer real, porque a ilusão da realidade não o compraz. Esse cinema quer ser para sempre amador, quer correr nu pela praia e dizer, sem medo, um sonoro e cafona “eu te amo”.

Queremos filmes que contradigam o que é considerado bom gosto, porque o bom gosto foi inventado por alguém e nós por um momento acreditamos. Não queremos os efeitos visuais da última geração, queremos os que dá pra fazer em casa. O universo na tela verde tosca, no sangue de tinta guache, na atuação ciente da farsa. Filmes que olhem pela janela mas que também fechem os olhos para criar o que está lá fora.

Filmes que transpirem uma fantasia própria, porque é necessário resgatar um imaginário que seja nosso e conquistar um espaço fantasioso colonizado pelas possibilidades que vêm de fora. Construir esse imaginário, essa mitologia, esse fantástico, isso também é político.

Filmes que tentem, que errem, que retomem, que acertem, que se equivoquem, que não desistam, que cometam, que instiguem, que abracem o mistério, que perguntem e que nunca respondam. Filmes que não terminem no final.

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