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Com o avanço das pesquisas e a liberação do uso do canabidiol pela Agência Mundial Antidoping , a busca por esse medicamento no meio esportivo aumentou

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Caleidoscópio

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Medicamento à base de canabidiol é uma alternativa para atletas | Foto: Oliver King/Pexels

O uso de canabidiol (CBD) por atletas de alto rendimento tem ganhado cada vez mais popularidade nos últimos anos. Trata-se de uma substância não-psicoativa presente na planta de cannabis que possui propriedades anti-inflamatórias, analgésicas e tranquilizantes, tornando-a uma opção atrativa para atletas que buscam alívio natural para dores e lesões relacionadas ao esporte.

Evidências científicas emergentes, como um artigo publicado na revista Outside pelo colunista Graham Averill e o estudo “Canabidiol (CBD) e o atleta: alegações, evidências, prevalências e questões sobre segurança”, publicado pela Gatorade Sports Science Institute, revelam que o uso de CBD pode ajudar a reduzir a inflamação, a dor e a ansiedade, além de aumentar o sono e a recuperação muscular. Esses benefícios são especialmente importantes para os atletas, que enfrentam desafios constantes na forma de lesões, fadiga e estresse mental.

Raphael Batista, diretor comercial da Care Club, health center de medicina esportiva no Brasil (espaço que une medicina, fisioterapia, nutrição, preparação física e bem-estar) explica que, desde 2015, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) permite a importação de produtos derivados da cannabis, contanto que os usuários apresentem receituário médico e realizem o cadastramento com a agência. Após adquirir a solicitação, é possível buscar o medicamento na indústria para consumo, já que nem todos estão disponíveis nas farmácias e precisam ser importados. A Care Club possui médicos que estudam os benefícios da substância.

O canabidiol não é mais considerado uma substância proibida pela Agência Mundial Antidoping (Wada) desde janeiro de 2018. Após a agência proibir o uso de corticoides em 2020, hormônio esteróide com propriedades anti-inflamatórias que aumentava o desempenho dos atletas, houve um crescimento na busca por medicamentos naturais que possuíssem o mesmo efeito.

“Então o canabidiol não vai só trazer aquela sensação de alívio imediato da dor, ele entra em dermes mais profundas, trata a lesão e cura”, Deise Maciel, CEO e fundadora da Gaia Hemp Brasil, importadora canadense de produtos com canabidiol

“Os anti-inflamatórios que se utilizam da sensação de frio e calor para alívio das dores são prejudiciais, pois o cérebro não é capaz de comportar informações de dores com sensações de frio e calor ao mesmo. Então, a dor ainda está lá, a lesão ainda está lá, mas o cérebro não consegue sentir“, constata Deise Maciel, CEO e fundadora da Gaia Hemp Brasil, importadora canadense de produtos com canabidiol. Por isso, o canabidiol tem se popularizado entre os atletas, por ser extremamente anti-inflamatório. As lesões de músculo e os edemas são tipos de inflamação que podem ser combatidos com o medicamento. “Então o canabidiol não vai só trazer aquela sensação de alívio imediato da dor, ele entra em dermes mais profundas, trata a lesão e cura”, diz Deise.

No ano em que a importação foi liberada pela Anvisa, a agência emitiu cerca de 15,5 mil autorizações de importação. Em 2020, foram importados cerca de 45 mil produtos à base de cannabis, e, em 2021, os pedidos passaram de 33 mil, com base em dados da própria agência. De acordo com Raphael, cerca de 10% dos 60 mil clientes da Care Club hoje usam ou já utilizaram do canabidiol em algum momento.

Apesar de ter sido liberado, o produto ainda sofre muito preconceito. Nas Olimpíadas de Tóquio em 2020, as primeiras após a liberação do CBD pela Wada, poucos foram os atletas que manifestaram o uso publicamente. A CEO da Gaia Hemp Brasil acredita que ainda é um mercado muito recente, mas que o Brasil está no caminho para a liberação. “Acho que não vai demorar muito para estar bem amplamente legalizado, não no uso recreativo, mas de abrirem as portas para o uso medicinal mais amplo, com mais acesso, principalmente o financeiro. O produto é extremamente caro no Brasil”, explica Deise.

O preço do canabidiol varia bastante conforme a posologia e o fabricante. O produto vendido no Brasil costuma custar entre R$250,00 e R$2.500,00. E o que dificulta o acesso é que o Sistema Único de Saúde (SUS) ainda não disponibiliza o medicamento, a não ser em casos extremos em que não existem outras alternativas, como nas epilepsias da Síndrome de Dravet, Lennox-Gastaut e no Complexo de Esclerose Tuberculosa.

Mesmo sendo um remédio caro, o consumo de produtos à base de cannabis medicinal nas farmácias brasileiras apresentou alta de 304% em 2022. Os dados são de um levantamento feito pela Associação Brasileira da Indústria de Canabinóides (BRCANN), com informações da IQVIA. Os fatores que contribuíram para esse aumento incluem uma redução de 35% no preço médico, um aumento na concorrência da venda desses produtos e indica um crescente interesse dos pacientes pelo tratamento. Além disso, há um amplo investimento em pesquisas sobre os benefícios que o canabidiol traz a saúde, sendo a Universidade de São Paulo (USP) a maior em produção científica mundial sobre o tema, de acordo com a análise “Global Trends in Cannabis and Cannabidiol Research from 1940 to 2019”.

Quem são os atletas que usam?

Apesar de não ser possível estimar um número exato de atletas que usam o CBD atualmente, existem aqueles que defendem a causa e que compartilham suas experiências abertamente. De acordo com pesquisa realizada em 2020, pelo vice-presidente sênior de Saúde e Desempenho do Atleta do Ultimate Fighting Championship (UFC), Jeff Novitzky, 80% de um total de 170 lutadores do maior evento de MMA entrevistados fazem uso do produto.

“No começo eu fui usando mais por conta das dores, da fadiga muscular e do cansaço do alto rendimento. Mas ele teve vários outros benefícios que eu realmente fiquei surpresa, como nas questões psicológicas e no recuperativo. Até a minha intolerância à lactose diminuiu”, Edwarda de Oliveira Dias, paratleta olímpica de badminton e vôlei sentado

Edwarda de Oliveira Dias, de 23 anos, é uma voleibolista e badmintonista paralímpica da seleção brasileira que usa o remédio. A atleta possui uma medalha de ouro mundial, duas medalhas de bronze nas paralimpíadas, duas de ouro e três de prata nos Jogos Parapan-Americanos, sete de ouro e três de prata em campeonatos nacionais.

Ela buscou o canabidiol pois estava cansada de remédios que a dopavam e prejudicavam durante os exames: “A gente atleta quando vai viajar só vê um monte de cartela de Dorflex na mochila das meninas”, relata. Na época, Duda ainda ficou um pouco receosa por causa do preconceito, pois ainda era uma descoberta muito recente, mas que se espantou com os resultados. “No começo eu fui usando mais por conta das dores, da fadiga muscular e do cansaço do alto rendimento. Mas ele teve vários outros benefícios que eu realmente fiquei surpresa, como nas questões psicológicas e no recuperativo. Até a minha intolerância à lactose diminuiu”, expõe a medalhista mundial.

Outro caso é o do jogador de futebol Marcelo Brozovic, volante da Seleção da Croácia na Copa do Mundo 2022, que criou a própria linha de creme com CBD. O atleta lançou um creme regenerador para articulações e músculos. “Como atleta profissional, me deparo constantemente com um grande esforço físico e utilizo diariamente produtos para regenerar e relaxar os músculos. É por isso que decidi desenvolver este produto exclusivo para atletas de elite e pessoas comuns com dores musculares, criando minha própria marca, a MB77”, escreveu o jogador em suas redes sociais.

Embora ainda haja muito a ser aprendido sobre os efeitos e a segurança dos produtos com canabidiol, muitos atletas acreditam que ele pode ser uma ferramenta valiosa para melhorar a saúde e o desempenho esportivo. “Pra mim não é mais remédio, é suplemento”, afirma Duda.

Confira a seguir uma lista de atletas nacionais e mundiais que utilizam o canabidiol:

Fonte: Redes sociais dos atletas

Reportagem produzida para a disciplina de Fundamentos da Reportagem do curso de Jornalismo da FABICO/UFRGS

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