Silêncio

marcobrasil
Camorumbi
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2 min readMar 16, 2018

O filme Ela, de Spike Jonze (2014), usa a história de um homem que se apaixona por uma inteligência artificial para falar de solidão. Descrevendo assim, pode parecer que se trate de uma ficção científica daquelas bem futuristas (muito embora já exista muitos casos de homens apaixonados por construtos, como denuncia o primeiro episódio da série documental Dark Net, da Netflix), mas o tema do filme é o sentimento mais universal da humanidade, esteja ela no século XXI, esteja no século I ou quando for. Mostra pessoas sedentas por serem amadas, sem notar que o que praticam é o verdadeiro oposto do amor, já que têm uma visão absolutamente utilitarista do amor. Amo enquanto me serve. Amo enquanto me supre carências.

O podcast Ovelhas Elétricas tem um episódio dedicado a esse filme e entre muitos insights bacanas, Erlan Tostes enfoca um significado profundo escondido na última cena do filme. Não chega a ser um spoiler, por isso descrevo: Theodore, o protagonista, assentado na cobertura de um edifício ao lado de sua amiga Amy, olhando as luzes da cidade que começam a se acender. Sem palavras, ela encosta a cabeça no seu ombro. Em nossa mentalidade fortemente impactada pelos “e foram felizes para sempre” das histórias, um final assim soa altamente insatisfatório, mas isso provém de nossa confusão entre amor e romance. Romance não é a única cura para a solidão. Com nossa visão distorcida do amor, aliás, ele frequentemente não é.

Tostes observa que Amy era capaz de dar algo que Samantha, a inteligência artificial, jamais conseguiria: o silêncio. Se Samantha não atendesse um chamado de Theodore, isso indicaria ausência. Mas se relacionar com alguém sempre disponível e sempre com as palavras exatas que gostaríamos de ouvir é não apenas irreal, é insatisfatório. Apenas uma pessoa de verdade é capaz de ofertar essa dádiva fantástica de estar presente. Estar presente é bem mais importante do que resolver o problema. Frequentemente aquilo de que nós, criaturas feitas à imagem e semelhança de um Deus social, necessitamos, é empatia, solidariedade, um ouvido, um ombro.

Hoje Deus está ao seu lado. Possivelmente, como na maioria das vezes, Ele está em silêncio. Como quem conhece o fim desde o princípio, Ele deixa você encostar a cabeça em Seus ombros para você sentir que por agora isso basta. Ele só quebra o silêncio para sussurrar aos seus ouvidos: faça o mesmo por eles.

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Camorumbi

Cristão, adventista, marido da Tatiana, pai de quatro, advogado, mestrando, são paulino e feliz.