Legado e propósito — Como Florianópolis se tornou uma cidade tecnológica

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Catarina Capital
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5 min readNov 18, 2020

Com quantos anos você encontrou sua vocação? Alguns passam por esse processo ainda na infância, quando desenvolvem alguma habilidade que chama a atenção dos familiares e amigos. Outros passam por essa descoberta durante o período universitário. E está cada vez mais comum encontrar pessoas que resolveram “pivotar” na fase adulta e estão se reencontrando durante o período de transformação digital. Florianópolis se encaixa nessa última categoria: descobriu a vocação após 300 anos.

Estagnação econômica de Florianópolis até a fundação da universidade

Na década de 1950, mesmo com 58 mil habitantes, Florianópolis não era tão ativa economicamente comparada a outros municípios de Santa Catarina, como Joinville e Blumenau. É emblemático que os trechos asfaltados da principal rodovia do estado, a BR-101, compreendiam os trajetos entre Joinville e Curitiba e entre Criciúma e Porto Alegre. Ou seja, a capital não fazia parte da rota econômica da região Sul.

O que diferenciava Florianópolis das demais cidades catarinenses em expansão eram as características naturais, já que aproximadamente 45% do território da Ilha era demarcado como Área de Preservação Permanente. Essa condição geográfica excepcional, e as consequentes legislações ambientais, restringiram a instalação de indústrias na capital, de forma que a economia de Florianópolis se manteve por muitos anos baseada no comércio e na pesca.

O primeiro passo para essa virada foi a fundação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) em 1960. O fortalecimento da academia possibilitou a formação de engenheiros, economistas e outros profissionais em uma Florianópolis que praticamente não tinha empresas privadas e que oferecia como alternativa emprego em empresas públicas de energia elétrica e telefonia.

Com mais profissionais qualificados, houve a expansão do setor de serviços, contribuindo com o crescimento econômico do município e da infraestrutura, como o asfaltamento da BR-101 no trecho de Florianópolis no fim da década de 1960. Gradualmente, novos setores da economia se abriram para a capital ao longo das décadas de 1970 e 1980, como a construção civil e o turismo.

A Ilha do Silício

O estímulo ao empreendedorismo e as primeiras soluções de tecnologia

Nesse contexto, alguns empreendedores tiveram a visão de que a vocação de Florianópolis poderia ser a tecnologia da informação. Afinal, uma indústria limpa, de grande capacidade de expansão e que otimiza o espaço físico, fatores fundamentais considerando as características geográficas e legislações de proteção natural do município.

Um dos empreendedores em questão era Carlos Alberto Schneider, então professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Em 31 de outubro de 1984, ele oficializou a criação do Centro Regional de Tecnologia em Informática, a Fundação CERTI, um centro de tecnologia privado dedicado à pesquisa e desenvolvimento de serviços tecnológicos para automação industrial.

E um dos fatores determinantes para o desenvolvimento do setor em Florianópolis foi, desde o início, a tríplice hélice da inovação: academia, poder público e iniciativa privada. A iniciativa empreendedora da Fundação CERTI teve incentivo econômico do Governo do Estado e a parceria de acadêmicos e profissionais formados pela universidade, a qual tornou-se referência nacional com a implantação de laboratórios e grupos de pesquisa.

Essa convergência de ações beneficiou o desenvolvimento de um ecossistema de empreendedorismo e inovação em tecnologia e levou à criação da Associação Catarinense de Tecnologia (ACATE) em 1986. No mesmo ano, foi desenvolvida a Incubadora Empresarial Tecnológica (hoje denominada CELTA), iniciativa inédita no Brasil que estimulou o setor de tecnologia. Antes atrasada economicamente, Florianópolis passou a ter um ambiente inovador e ser pioneira em uma área extremamente promissora.

A necessidade de validação e o fortalecimento do setor na década de 1990

Mas como em todo teste vocacional, há dúvidas se essa é mesmo a resposta adequada ou se foi apenas um interesse momentâneo. Na década de 90, o contexto econômico nacional colocou o setor em risco, tanto por planos econômicos mal-sucedidos quanto pelo estímulo às importações, afetando as soluções criadas na capital catarinense — que eram baseadas em automações para as grandes indústrias.

O ecossistema inovador de Florianópolis foi colocado à prova pela primeira vez. Ao buscar novos mercados, as empresas do setor conseguiram criar soluções para a automação bancária, demanda necessária com a alta da inflação. Foram criadas as máquinas automáticas de atendimento bancário, sistemas de leitura de cartões e softwares para processamento de dados.

O setor de tecnologia em Florianópolis expandiu e começou a atender novos clientes e mercados, tornando-se mais dinâmico. Em 1993, houve a inauguração do Parque Tecnológico Alfa, o primeiro do município. Localizado no bairro João Paulo, o espaço materializou a criação de um ambiente voltado à inovação.

Alguns anos depois, em 1998, houve a implantação de outra incubadora, a MIDI Tecnológico, que consolidou o modelo catarinense e o tornou referência nacional. A criação da Fundação de Apoio à Pesquisa de Santa Catarina (FAPESC), com objetivo de fomentar as atividades de ciência, tecnologia e inovação, mantinha firme a tríplice hélice da inovação. Era a confirmação de que o setor havia passado no teste de validação e estava fortalecido.

Com a base pronta, a virada de século marca a consolidação do setor

Se a década de 1980 marcou o pioneirismo e a década de 1990 foi a validação, as bases do setor estavam prontas para a expansão ao longo da década de 2000. É algo que ficou evidente no projeto do Sapiens Parque, elaborado em 2002 para abrigar com infraestrutura os empreendimentos e projetos inovadores. O objetivo da parceria entre o poder público e a Fundação CERTI era o desenvolvimento regional, indicando que a vocação de Florianópolis era seguir pelo setor de tecnologia.

As iniciativas se multiplicaram com o projeto Sinapse da Inovação, com a criação do Parque Tecnológico ACATE, com aceleradoras como a Darwin Startups e com programas para criação de startups. Além de uma ou duas empresas inovadoras, um ou outro empreendedor ou empreendedora com grandes ideias, Florianópolis se tornou, definitivamente, um ecossistema que estimula a inovação e o empreendedorismo.

É nesse contexto que se estabelece a Catarina Capital, gestora de referência em produtos financeiros relacionados a tecnologia e empreendedorismo. É um player com atuação estratégica no cenário de Florianópolis e de Santa Catarina, destacando-se como uma iniciativa para captar ainda mais recursos para esse ambiente e fazer a ligação entre o mercado de capitais e o ecossistema de inovação e tecnologia local.

Tecnologia como principal setor econômico de Florianópolis e futuro promissor

Mesmo com população consideravelmente menor do que outras metrópoles do país, Florianópolis tornou-se referência em tecnologia pelo ecossistema de inovação que favorece a criação de startups e de soluções para problemas das mais variadas áreas. As empresas de tecnologia que se instalam no município contam com um ambiente muito empreendedor, oferta de mão de obra qualificada e incentivos fiscais.

Tanto que Florianópolis tem a maior densidade de empresas do setor de tecnologia, com cinco empresas a cada mil habitantes, superior a São Paulo, e a maior densidade de startups do país, refletindo um cenário de muitas ideias e iniciativas sendo colocadas em prática. A geração de empregos segue acelerada, com 23 mil pessoas trabalhando em empresas do setor em Florianópolis.

Como consequência, o setor de tecnologia tornou-se a principal atividade econômica de uma cidade que há algumas décadas não tinha sua vocação muito clara. As perspectivas indicam que o setor seguirá estimulando a economia da capital catarinense, contando com o fortalecimento da tríplice hélice da inovação e instituições catalisadoras como a Fundação CERTI e a ACATE. Por isso, a Catarina Capital atua para transformar o ecossistema de inovação em Santa Catarina, permitindo que mais empresas possam desenvolver e expandir a sua vocação na área de tecnologia.

Por Gabriel Duwe de Lima.

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Multi-asset class investment manager and advisory/M&A firm in Brazil focusing exclusively on technology related companies, from startups to listed corporations.