LiterEUtura

Carnavalhame
carnavalhame
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3 min readMay 3, 2022

Sejamos polêmicos porque o povo gosta mesmo é de uma treta, como já diziam os portais de fofoca sobre o Big Brother Brasil — vejo para fins profissionais, eu juro! A nossa literatura sofre inevitavelmente influência de quem somos, o que sentimos e o que vivemos, por mais distante que a obra seja da nossa realidade, simplesmente porque é impossível descolar o ser humano do autor.

Entretanto, nessa caminhada de leitora crítica e resenhista, já me deparei com situações excessivamente literais; existem autores que não escrevem nada que não seja sobre si mesmos, independentemente se é um romance de época ou uma ficção científica futurista: eles sempre estão lá. Ficcionados, porque é bem mais cool que eles sejam retratados como escritores marginalizados, alcoolizados e fracassados quando a vida real é ligeiramente diferente. Mas a personalidade está lá.

Biografia (autobiografia, no caso) e autoficção são realidades e não, não há nada de errado com isso. O que sempre me incomodou um tantinho foi o fato de pessoas absolutamente comuns acharem que situações absolutamente ordinárias renderiam livros a ponto de escrevê-los de forma absolutamente previsível (repetição proposital, antes que julguem).

Tem livro bom com os autores como protagonistas? Tem, tem livro bom e ruim em todos os gêneros, ué. Mas não consigo evitar de me perguntar se o autor ou a autora em questão sabe construir um personagem. Colocar a si mesmo em todas as situações, ficcionais ou reais, pode revelar não um estilo de escrita, mas uma dificuldade na concepção de um personagem.

Não que seja um problema que o personagem traga algo de nós, até porque, reforço, é inevitável, mas anular o processo de criação de personagem para se autoficcionar em todo seu trabalho pode torna-lo cansativo, previsível e até incoerente.

Um caso que posso citar de uma autoficção muito bem sucedida foi de Julián Fuks, com a obra “A Resistência”; não é nem de longe uma obra que eu, leitora, gosto, mas é uma obra que eu, crítica, admiro muito e sou capaz de apontar inúmeras qualidades (sim, é possível elogiar e admirar obras que não são nossas favoritas, veja só). Em contrapartida, no meu trabalho como resenhista, leitora crítica e parecerista, em curto espaço de tempo me deparei com obras tanto autobiográficas quanto de autoficção que me deram vontade de me encolher em um canto e chorar.

Eu também adoro contar histórias da minha vida, meu perfil do facebook não me deixa mentir. Mas é preciso destacar que literatura é arte e é trabalho; como tal, demanda treino, esforço e estudo. Conceber um personagem é um dos aspectos mais importantes no desenvolvimento de uma ficção. E também é divertidíssimo.

Nada impede um autor ou autora falar de si mesmo, em especial se tiver de fato algo muito interessante para contar, mas nunca se esqueça: literatura é sobre narrativas, sobre humanidades, e nem tudo gira ao redor do umbigo de quem escreve.

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