A negligência do Ocidente em relação aos direitos humanos dos palestinos em meio a ocupação israelense e a pandemia da COVID-19

Os Estados Unidos da América (EUA), a maior potência do mundo, negligencia a luta e dificulta o reconhecimento da Palestina. Enquanto a China, concorrente na economia e geopolítica mundial que está em constante avanço, oferece ajuda humanitária e suporte para os palestinos.

Stephanie de Paulo
CARPAS
9 min readApr 14, 2023

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Palestinos carregam os corpos de quatro das nove vítimas relatadas mortas durante um ataque israelense ao campo de refugiados de Jenin, na Cisjordânia, durante seu cortejo fúnebre na cidade de mesmo nome.

A Palestina é frequentemente ignorada ou marginalizada na discussão das relações internacionais, refletindo na desumanização e invisibilidade do povo palestino. Este trabalho visa, chamar atenção para a forma como a discriminação e a opressão dos palestinos são mantidas por mecanismos de dominação (VIOTTI; KAUPPI, 2012: 191), tais como os bloqueios em Gaza, a justificação da violência e a construção da imagem de um inimigo ameaçador, tipos de opressões que não foram anuladas mesmo sob a pandemia da COVID-19, muito pelo contrário, se agravaram.

A cooperação internacional de países do oriente na questão vacinal, Organizações Internacionais Governamentais (OIGs), Organizações Internacionais Não-Governamentais (OINGs), e a ajuda humanitária ao povo palestino são um modelo de como os olhos da sociedade internacional ocidental devem se voltar à um povo tão afetado pelo apartheid. Se compararmos com a Guerra da Ucrânia pode parecer desleal à primeira vista, mas a diferença é gritante, afinal, por que a Guerra da Ucrânia tomou grandes proporções no debate internacional, enquanto a Guerra na Palestina que está ocorrendo há vários anos nunca foi centro no debate?

A criação do Estado de Israel surgiu na era pós-Segunda Guerra Mundial, enquanto a Palestina estava sob comando britânico. Ainda com resquícios do imperialismo do século XIX, a Grã-Bretanha abriu mão da área para a criação dos dois territórios. A decisão, organizada pela ONU, foi potencializada pelo sentimento de culpa das grandes potências após o holocausto, sob mãos dos países Aliados que redesenharam a geopolítica em todo o Mediterrâneo do Leste e da Ásia Central. Consolidou-se no capitalismo global com ajuda de vários países vitoriosos e tornou-se uma potência nuclear.

Sob o Primeiro-Ministro Benjamin Netanyahu (2009-presente), Israel tornou-se um Estado sionista teocrático e uma ameaça permanente à paz da Palestina, pois o país se recusa a cumprir a resolução da ONU que prevê a criação de dois Estados — israelita e palestino — continua a ocupar áreas palestinas, promovendo o genocídio contra a população. Com a evolução do capitalismo global e a consolidação da hegemonia americana, o sionismo começou a atuar como uma inteligência do novo imperialismo em expansão ameaçando a autodeterminação do Estado Palestino.

O número de mortos palestinos foi de 248, incluindo 66 crianças, com mais de 1.900 pessoas feridas por ataques aéreos e de artilharia israelenses. [Mohammed Salem/Reuters] — “Gaza attacks: Fear, finality, and farewells as bombs rained down” artigo por Aljazeera.

As narrativas dominantes e os poderes presentes nas relações internacionais, incluindo as estruturas econômicas e políticas podem perpetuar a desigualdade global, que quando aplicada à questão da Palestina, podemos analisar como contribuir para a opressão e desumanização do povo palestino. A sociedade internacional perpetua a opressão dos palestinos, através do apoio econômico e político ao Estado de Israel, e a falta de condenação aos seus atos de violência, além de compactuar com o estigma a pessoas de origem muçulmana serem vistas como terroristas.

Há posturas inadequadas atrelada ao fato de como a questão da Palestina é retratada pela mídia ocidental e pelos governos ocidentais como um conflito entre dois lados iguais, quando, na verdade, ocorre uma desproporção de poder e violência sendo perpetrada pelo Estado de Israel contra os palestinos, isso mostra o como o único ponto centro dos debates internacionais são países imperialistas (LÊNIN, 1917). É necessário destacar a importância de questionar as narrativas dominantes e os poderes presentes nas relações internacionais para entender e lidar com a questão da Palestina de forma justa e equitativa trazendo-a para o centro do debate.

Por qual razão grupos separatistas ucranianos têm todo apoio das grandes nações do mundo para lutarem pela autodeterminação do povo e do Estado, enquanto grupos de resistência palestinos são vistos como terroristas perante a mídia internacional? O tratado da ONU os ampara, pois a criação de Israel se deu visando a autodeterminação (em tese) de um estado judeu e o outro árabe. Então, por que uma é acatada e acolhida pela comunidade internacional, enquanto a outra é criminalizada? Mais uma vez o anti-arabismo está em jogo mostrando a grande seletividade da sociedade internacional, que insistem em uma abordagem pluralista do Estado de Israel ao invés de reconhecer o Estado da Palestina, mesmo sem este reconhecimento, as grandes nações não optam pela abordagem solidarista, pois há uma obrigação dos Estados de intervir para garantir direitos humanos (JACKSON; SORENSEN: 2007).

A abordagem da sociedade internacional apresenta duas respostas a essas questões. A ocupação israelense resulta em violações graves dos direitos humanos dos palestinos, incluindo violência, desalojamentos e restrições de movimento, isso tem sido objeto de críticas internacionais por violações dos direitos humanos, visto que durante a pandemia da COVID-19 as políticas de saúde pública tem sido afetada pela ocupação israelense e pelo bloqueio nas fronteiras. A situação de saúde pública na Palestina é precária, afetada pela falta de investimento em infraestrutura básica, recursos financeiros e medicamentos. O sistema de saúde da Palestina é ineficiente e está sob pressão devido às condições políticas e à ocupação israelense, que implica a falta de acesso à água potável e à energia elétrica afetando diretamente a qualidade dos serviços de saúde. O que é ainda pior na Faixa de Gaza, que tem sido sujeita a bloqueios constantes e às operações militares por parte de Israel. A falta de equipamentos e instalações adequadas, bem como a escassez de médicos e enfermeiros qualificados, torna ainda mais difícil para a população obter acesso a atendimento médico de qualidade.

Não é possível alegar falta de cooperação entre as autoridades israelense e palestina porque a negligência do Estado de Israel é imensa, a situação dos palestinos durante a pandemia de COVID-19 foi complicada devido a uma série de fatores como a ocupação israelense e as políticas restritivas, incluindo o bloqueio e a limitação do acesso à saúde e à assistência humanitária, têm agravado a crise sanitária e econômica.

O bloqueio de Gaza, imposto por Israel, e a falta de liberdade de movimento restringem a capacidade dos palestinos de se deslocarem para procurar trabalho, acessar serviços de saúde e comprar bens essenciais. A economia da Palestina já enfrentava dificuldades antes da pandemia, e a pandemia aprofundou ainda mais essas dificuldades, com muitos palestinos perdendo seus empregos e sua renda. A infraestrutura de saúde palestina já enfrenta desafios significativos, incluindo a falta de equipamentos e medicamentos, já que a pandemia aumentou a pressão sobre essa infraestrutura, também tem sido usada como pretexto para restringir ainda mais a liberdade de movimento e o acesso à assistência humanitária.

No entanto, há uma luz no fim do túnel. A cooperação internacional e a ajuda humanitária têm sido fundamentais para melhorar a situação de saúde na Palestina. Alguns países têm enviado medicamentos, equipamentos médicos e profissionais de saúde para fortalecer o sistema de saúde local, os principais são: China, Egito e Rússia. Ainda há muito a ser feito, mas a atenção crescente e o apoio internacional oferecem esperança de melhorias futuras na saúde pública da Palestina. Vários países e organizações internacionais têm enviado ajuda para a Palestina em forma de vacinas contra a COVID-19.

Na tarde do dia 8 de dezembro, o Presidente da China Xi Jinping se reuniu com o Presidente da Palestina Mahmoud Abbas in Riyadh. Imagem por: Ministry of Foreign Affairs of the People’s Republic of China

Alguns exemplos incluem a União Europeia, a Organização Mundial da Saúde, a China, a Índia, a Rússia, o Irã, a Turquia, o Egito e a Arábia Saudita. Alguns países também têm enviado vacinas via iniciativas multilaterais, como a COVAX, que visa garantir acesso equitativo a vacinas contra a COVID-19 para todos os países, além disso, vários grupos humanitários e organizações não-governamentais também estão trabalhando para fornecer ajuda na forma de vacinas e assistência médica na Palestina.

A China tem participado de negociações internacionais sobre a questão palestina, incluindo reuniões da Liga Árabe e da ONU, e junto ao Egito doaram 500 mil doses de vacinas para a Palestina. As vacinas foram produzidas no Egito por meio de uma parceria entre a Holding (do Egito) para Produtos Biológicos e Vacinas (VACSERA) e a empresa bio-farmaceutica chinesa Sinovac, de acordo com Khaled Abdel-Ghaffar, o ministro da Saúde do Egito e ministro do ensino superior durante uma cerimônia ocorrida na sede da VACSERA em Gizé, Egito, no dia 20 de fevereiro do ano passado. Além dos países citados, as Organizações humanitárias e ONGs tem alertado para a necessidade de ajuda financeira e humanitária para ajudar os palestinos a enfrentar a pandemia.

“Palestinian officials have accused Israel of preventing a vital first shipment of 2,000 coronavirus vaccines intended for frontline health workers from entering the blockaded Gaza Strip.” (THE GUARDIAN; 2021: February 16th)

Tradução: “Autoridades palestinas acusaram Israel de impedir uma primeira remessa vital de 2.000 vacinas contra o corona vírus destinadas a profissionais de saúde da linha de frente para entrar na Faixa de Gaza bloqueada.” (THE GUARDIAN; 2021: 16 de fevereiro)

Estes, também pedem ao governo israelense para levantar as restrições impostas, a fim de permitir que os palestinos tenham acesso à saúde e assistência humanitária, já que o bloqueio impede até que palestinos tenham acesso à realização de tratamentos médicos, provocando até mortes evitáveis. Enquanto Israel foi um dos países com maior taxa de cobertura vacinal global, ficando na frente até de super potências como os Estados Unidos, a cobertura da vacinação contra a COVID-19 na Palestina tem sido desafiante devido a uma série de fatores, como o governo israelense e as políticas restritivas dificultam o acesso dos palestinos às vacinas. O governo israelense é responsável por fornecer vacinas para os palestinos na Cisjordânia ocupada, mas o acesso tem sido limitado devido à falta de cooperação e a problemas logísticos.

O bloqueio de Gaza, imposto por Israel, dificultam o acesso às vacinas na Faixa de Gaza, como a Sputnik V, da Rússia, proibida de entrar em Gaza deixando escasso para a linha de frente de saúde aproximadamente 2mil doses, além disto, Israel tem intensificando os ataques durante a pandemia, os principais alvos dos bombardeios são locais públicos como: escolas, hospitais e prédios residenciais. Todavia, a ajuda financeira e humanitária é necessária para ajudar os palestinos a enfrentar a pandemia e é importante que as restrições sejam levantadas para permitir acesso à saúde e assistência humanitária.

Funcionários de saúde palestinos em uma tenda de testes de detecção do coronavírus, na terça-feira em Khan Yunis, na Faixa de Gaza.DPA VÍA EUROPA PRESS (EUROPA PRESS)

“Em 2021, um acordo entre o governo de Israel e as autoridades palestinas para enviar mais de 1 milhão de vacinas foi cancelado, segundo a ministra da saúde e da autoridade palestina Mai al-Kaila as primeiras 100 mil doses enviadas por Israel tinham prazo de vencimento mais próximo do que havia sido negociado e o governo de Israel já havia afirmado que os imunizantes estavam próximos do vencimento sem estipular um prazo ou declarar publicamente qual seria exatamente a data da validade.” (FOLHA DE SÃO PAULO, 2021: 18 de julho).

A Autoridade Nacional Palestina (ANP) tem feito esforços para obter vacinas, mas tem enfrentado dificuldades devido à escassez global de vacinas, problemas financeiros dificultando a aquisição de vacinas, e o bloqueio imposto por Israel. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e outras organizações internacionais têm fornecido vacinas e assistência técnica para melhorar a cobertura de vacinação na Palestina. Além disso, vários países também têm doado vacinas para a ANP. A Palestina teve uma das menores taxas de vacinação na região árabe, no entanto, isso vem melhorando devido aos esforços (inter) nacionais para aumentar a cobertura de vacinação e ainda, a ANP declarou que já vacinou mais de 50% da população adulta. Mas, a ajuda internacional e a cooperação com o governo israelense são cruciais para melhorar a cobertura de vacinação na Palestina, já que são os únicos a terem fácil acesso à Palestina.

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Stephanie de Paulo
CARPAS

Graduanda em Línguas Estrangeiras Aplicadas (UnB). Pesquisadora em Literatura Especulativa (ProIC), poliglota, tradutora e amante da cultura pop