Quiromancia — Uma Breve Introdução

Atheris L.
CarpeNoctem
Published in
8 min readJan 8, 2022

“ — O desconhecido — disse a voz suave de Faxe na floresta —, o não previsto, o não provado: é nisso que se baseia a vida.”

—A Mão Esquerda da Escuridão

Eu amo escrever, sou fissurada em escrever desde que me conheço por gente, mesmo que não seja naturalmente boa. Além disso, sou quase feral em minhas paixões, consumo tudo que gosto como se no dia seguinte fosse se extinguir. E nos últimos tempos, a pessoa que vos escreve percebeu que nunca havia feito nada realmente esforçado para falar sobre uma das paixões ferais dos últimos anos: quiromancia, vulgo, leitura de mãos.

Minha história pessoal com a quiromancia não é nada grandiosa, mas começa bem cedo em alguma idade entre 7 e 11 onde indo para minha escola no fundamental uma daquelas madames que passam de cidade em cidade com cartazes extravagantes dizendo coisas como trago seu homem de voltar em 3 dias estava lendo a mão das pessoas e o meu cérebro infantil decidiu que sair da escola e ir atrás dela era uma ótima ideia. E depois de ficar completamente encantada com os acertos sobre meu não-tão-grande-passado e coisas grandiosas referentes ao meu destino decidi que definitivamente, algum dia, iria encontrar alguém para me ensinar e também impressionar os outros com minha habilidade.

E cá estou eu, entre uma jornada espiritual precoce, vários livros estranhos e um conjunto de hobbys místicos do qual me orgulho, atendendo a quase 4 anos com quiromancia.

E como falar sobre algo sem começar reconhecendo sua história, evolução e significado?

Não existe um registro exato de quando, onde ou como exatamente a leitura de mãos veio à tona, mas é conhecido que diversos países como China, Tibete, Nepal, Babilônia e Índia já apresentavam estudos sobre padrões nas mãos e seus significados. A considerada primeira obra que visou unir conhecimento do gênero foi “Os ensinamentos do maharshi Valmiki sobre a quiromancia masculina” do guru hindu Valmiki.

A leitura de mãos também foi extremamente famosa na Grécia, inclusive o nome quiromancia vem do grego Χείρων (cheirós), “mão”, e Μαντεια (manteiós), “profecia”. Diz-se que Aristóteles teria descoberto a quiromancia em um altar dedicado a Hermes, contado para Alexandre o Grande e o mesmo ficado curioso sobre seu destino. Existem histórias de que o imperador Júlio César também era muito dotado na arte da quiromancia e capaz de julgar seus soldados pelas mãos!

Depois de ser criminalizado na idade média como bruxaria, a quiromancia caiu em desuso, voltando no século 19 através de sociedades quirologicas que promoveram uma aproximação ainda maior entre a arte com a astrologia, formando as correlações que usamos hoje, por isso, existem várias divisões da mão em montes e dedos nomeados pelos astros.

Diversas etnias roms também foram grandes difusores da arte da leitura de mãos pelo mundo! Tanto que quando pensamos em leitura de mãos imagens de mulheres romani são logo trazidas à tona, porém existe diferença entre a tradição cultural de etnias diversas, os ensinamentos passados apenas entre eles, os esteriótipos e a quiromancia como estudo encontrada em manuais e livros, que é a que posso e busco introduzir aqui. Não pretendo invadir qualquer tradição ou resumir etnias do qual não pertenço a um método oracular.

“Isso parecia colocar o negócio no plano da pura adivinhação do acaso, como as varetas de milefólio e cara e coroa. Não, disse Faxe, absolutamente, não havia acaso. O processo todo, na verdade, era exatamente o inverso de acaso”

—A mão esquerda da escuridão

Agora, história a parte, o que realmente é a quiromancia?

Se você gosta de explicações mais diretas eu diria que quiromancia é uma pseudociência, ela aplica seus próprios métodos de leitura através de correlações, mas não tem uma comprovação ou método científico próprios, é uma crença com um sistema próprio de leitura, um oráculo.

Se voce é mais do tipo que espera que eu explique as coisas como uma velha bruxa mística em uma cabana eu gostaria de dizer que a quiromancia é um dos oráculos mais lindos que já coloquei em prática e que encontrar através da relação entre planetas, linhas e símbolos um direcionamento é uma das melhores coisas da minha vida.

E diria para qualquer um dos casos que gosto muito de uma analogia que li em algum lugar a muito tempo atrás e, infelizmente, não consegui encontrar novamente sobre oráculos: o tempo é como navegar de costas em um rio; conseguimos observar as águas atrás de nós (passado), mas o diversos cursos que esse rio pode seguir mais à frente são desconhecidos; o trabalho do oráculo é analisar essas possibilidades e guiar seu ouvinte nessa correnteza, respeitando também sua capacidade de escolha entre os caminhos.

Esse é o moto da leitura de mãos para mim: a análise simbólica das possibilidades do futuro e maior consciência do próprio passado, vejo na quiromancia um oráculo (quase) completo.

Digo também que não é preciso ser um adivinho, oráculo vivo ou psíquico para trabalhar com a leitura de mãos, obviamente você pode receber visões e se conectar com determinadas energias durante uma leitura, mas qualquer um, vidente ou não, pode se debruçar sobre esse método oracular depois de aprender suas correlações.

Então sem misticismo: você não precisa nascer com nenhum dom para ler mãos, só estudar um bocado e ter uma boa dose de consciência, assim como tarot, i-ching e outros oráculos que exigem ferramentas.

Mexer com as linhas da mão de alguém é encarar também um espelho. Se permitir ver o reflexo de como aquela pessoa lidou com o próprio coração, mente e espírito no passado e o como isso impactará no futuro. Ler uma mão é ajudar o consulente a enxergar esse espelho, encarar suas escolhas e os caminhos que elas delineiam em suas palmas. Nada é permanente, mas é preciso de cuidado ao se transmitir esse tipo de reflexo pessoal. Não acredito que o quiromante consiga anular a si 100% e transmitir em absoluto a imagem desse espelho sem que um pouco de si acabe indo junto, mas sempre deve ser o mínimo. Ao trabalhar com um oráculo você é o canal, interfira o mínimo e deixe seus julgamento na gaveta mais próxima.

“Não existe princípio nem fim, pois todas as coisas estão no Centro do Tempo. Assim como todas as estrelas podem se refletir em um pingo redondo de chuva caindo na noite, também todas as estrelas refletem o pingo de chuva.”

— A Mão Esquerda da Escuridão.

E agora, apenas para você não me chamar de megera ou gatekeeper vou introduzir um pouco de como funciona a leitura de mãos em si. O básico do básico. Então, se for usar de showzinho com alguns amigos por favor tenha consciência de dizer que é apenas uma lorota (ou não) que você leu em um blog de mais uma mística maluca por aí, nada demais, e que suas previsões não definem o futuro do pobre coitado.

E se você tiver interesse em ir além de uma breve introdução: vá. Aprender quiromancia não é tão simples e exige muita responsabilidade, assim como qualquer oráculo, então busque muito conhecimento e prática e quando achar suficiente busque mais um pouco.

Chamamos de quiromancia a leitura completa, porém a leitura de mãos pode ser dividida em duas ou três partes: a quiromancia (leitura das linhas da palma); a quirologia (leitura do formato, montes e dedos da mão); e alguns se aprofundam também na dermatóglifia (padrões das digitais e relevos da mão). O recomendado é que se inicie com a quiromancia e depois se aprofunde nos demais tópicos.

Começamos sempre classificando as mãos em dominante e passiva. A passiva irá mostrar tanto o passado como a personalidade e características inconscientes do consulente, enquanto a ativa/dominante mostrará o caminho mais provável para o futuro.

Alguns métodos que você pode optar para definir as mãos:

  • Escolher a mão do futuro baseando-se na mão ativa do consulente (destro — direita, canhoto — esquerda)
  • Diferenciar pelo gênero: em homens lê-se mão direita e mulheres a esquerda como mão do futuro (não gosto particularmente dessa pelo sexismo e binarismo, mas enfim, escolhas)

Depois de definida a mão do passado e futuro a leitura é baseada em identificação das linhas principais e secundárias e várias e várias correlações astrológicas feitas por mapas de quiromancia e subdivisões da mãos.

Deixo aqui uns de presente:

Lara se você estiver lendo isso, obrigada pelos mapas!!

Um brevíssimo exemplo: ciclana tem a linha da carreira (mente) curta, começando cheia de correntes e segue depois retíssima com seu final despontando no monte do sol.

A linha curta nos mostra uma certa dificuldade em prosseguir nos próprios planos, as correntes falam de muitos problemas permeando a área, mas por terminar reta e levar ao monte do sol (astro que fala sobre poder pessoal, riqueza e direcionamento) em breve ciclana conseguirá um foco muito maior em si, nos próprios projetos e isso a levará a um futuro brilhante na carreira, mesmo com toda desmotivação e problemas iniciais.

Deu para entender como funciona? A leitura de mãos é como juntar várias pecinhas de quebra cabeça, ou como eu gosto de dizer, tentar entender as linhas de uma tapeçaria única e específica. Com o tempo você vai pegando o jeito em montar o quebra cabeça pessoal de cada um, assim como vai adquirindo opiniões e maneiras próprias de organizar as peças antes de montar.

E por fim, o último dilema na leitura de mãos é o fator tempo. Uma leitura de quiromancia dura a vida inteira, 6 meses, 3 anos? Qual a data de validade? Tem data de validade?!

Posso te oferecer duas coisas pra ajudar no dilema: as linhas das mãos mudam e maioria usa o tempo de seis meses. Faça o que bem entender (mas com cautela pelo amor do que você acreditar). O fator tempo quase sempre é uma complicação para oraculistas, até porque sua percepção de tempo como algo retilíneo, espiralado, multifragmentado ou o que seja muda também sua forma de leitura. Acredito eu, particularmente, que tanto o quiromante quanto o consulente devem ter ao menos uma proximidade na sua ideia de tempo. Do que adianta eu acreditar que o futuro já está definido e ir buscar um quiromante que me dirá que tenho diversos caminhos a escolher?

“ — Diga-me, Genry, o que sabemos? O que é certo, previsível, inevitável… a única certeza que você tem sobre o seu futuro e o meu?

— Que vamos morrer.”

Por fim, acho que entendi porque nunca escrevi nada concreto sobre essa arte, escrever sobre algo que somos apaixonados é definitivamente mais difícil, existe muito perfeccionismo na tentativa de expressar tanta admiração e é muito simples travar de medo. Mas espero que eu não tenha falado muita besteira e que esse texto seja uma porta (tudo bem se for só uma janelinha) para suas muitas experiências futuras com leitura de mãos.

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Atheris L.
CarpeNoctem

Feiticeira alinhada ao caoismo com interesse em formas de magia relacionadas a morte e cultura moderna. Meu objetivo é conseguir difundir conhecimento.