CINEMA INDEPENDENTE BRASILEIRO: é possível produzir sem incentivos?

Thiago Ribeiro
Carretel Arte & Jornalismo
7 min readMay 5, 2018
Foto: Reprodução/Internet

Você sabe o que é cinema independente? É a produção de um filme com estilo autônomo, com pouquíssimo ou nenhum orçamento para atores, cenários e locações. Esses filmes não costumam ser produzidos para a distribuição em canais convencionais. Em sua maioria, são distribuídos em plataformas de streaming e redes sociais.

De acordo com a Agência Nacional do Cinema (Ancine), o cinema brasileiro bateu recorde de produção em 2016. Mas as produções autorais não conseguem espaço de divulgação. Dentre os 143 filmes brasileiros independentes lançados, 66% não chegam a dez mil espectadores. Mas por que isso acontece? O cinema brasileiro recebe incentivos?

LEIS DE INCENTIVO: É possível fazer filme independente no Brasil sem Leis de Incentivo?

Você já assistiu a um filme totalmente independente? Quantas vezes você foi ao cinema assistir a um filme nacional e NÃO viu no início do filme as logomarcas da ANCINE, da Lei do Audiovisual, e das milhares de empresa patrocinadoras? Pois é, se para filmes nacionais é difícil ser lançado em salas de cinema sem nenhum tipo de incentivo público, como é o cenário então para filmes independentes? Quantos filmes independentes que você conhece foram realizados sem Lei de Incentivo ou algum edital?

Entender alguma coisa ao ler a Lei do Audiovisual na íntegra, por exemplo, é complicado. Até para os profissionais que vivem nesta área sua linguagem é difícil, para o público leigo é totalmente inacessível.

Para entender um pouco mais sobre incentivo a produções independentes, conversamos com o produtor e estudante do Curso de Jornalismo da Ulbra, Felipe Borba e a crítica de cinema, Maressah Sampaio. Nosso grande objetivo é responder algumas perguntas: Quais são as possibilidades para filmes independentes chegarem às salas de cinema? Se os filmes independentes não alcançam bilheterias expressivas, como as produtoras podem financiar seus projetos sem dependerem das leis de incentivo?

A possibilidade de produções independentes chegarem à tela de cinemas é restrita por conta do mercado. Quando um filme consegue o seu espaço, eles precisam se enquadrar em formatos para então o possível sucesso. Para o produtor Felipe Borba, a vantagem do cinema independente é que a liberdade criativa é maior do que se tivesse produzindo para uma emissora, por exemplo.

“Quando o projeto é como o nosso, sem incentivo financeiro nenhum, você tem que contar com a boa vontade das pessoas que se dispuseram e abraçaram aquele propósito e buscar parcerias pra suprir as necessidades”.

Para a crítica de cinema, Maressah Sampaio, as leis não são acessíveis para todos. Há muita burocracia em torno. É difícil que um projeto de iniciantes passe através da lei sem ter alguém já conhecido para ajudar. Isso pode restringir o acesso aos estreantes.

Para os dois entrevistados as leis de incentivo não garantem necessariamente o dinheiro para a obra, é preciso que você tenha uma empresa parceira que te patrocine. Mas a dificuldade realmente está em achar uma empresa que esteja disposta a vincular seu nome a um projeto pessoal.

O ALVOROÇO QUE MOBILIZOU UMA CIDADE

Foto: Reprodução/Internet

Produzir cinema independente no Brasil ainda é um desafio. No município de Alvorada, situado na Região Metropolitana de Porto Alegre, Evandro Berlesi tem a missão de fazer conteúdo com baixo orçamento, contando apenas com a ajuda de ‘’vaquinhas’’ online e empresários dispostos a colaborar. Aos 41 anos, o escritor, cineasta, diretor e roteirista já produziu cinco longas metragens, além de outros trabalhos cinematográficos, mesmo não possuindo nenhuma formação acadêmica.

A sua produtora completa 10 anos em 2018, e já contou até mesmo com a participação de atores conhecidos do grande público em seus filmes, como Luana Piovani e Jairo Matos, que é natural de Alvorada. A Alvoroço foi criada em 2008, quando Berlesi teve a ideia de rodar a comédia romântica “Dá Um Tempo”. Para chamar a atenção do povo do município e captar elenco, Berlesi e a sua equipe da época espalharam por toda a parte cartazes com os dizeres “Alvoroço em Alvorada”. No primeiro momento, as pessoas não compreenderam a mensagem e suspeitaram de alguma ação política ou até mesmo que pudesse ser uma facção criminosa.

“Era ano de eleição, e como não tinha nada no cartaz além da frase, os lados envolvidos na disputa acharam que era uma ameaça ou algo assim. Que iria ter tiroteio (risos). Aí eu tive que me apresentar e explicar o que era realmente o projeto Alvoroço”.

A sua opção em produzir um filme com elenco e locações totalmente alvoradenses foi pelo fato do município ter uma fama ruim devido aos altos índices de violência, já naquela época. Por isso, a equipe da produtora passou nas escolas da rede pública de ensino para convidar os alunos a participar dos testes de elenco. Cerca de 100 pessoas participaram do primeiro teste. “Em algumas escolas nós fomos bem recebidos, em outras nem tanto. A nossa ideia inicial era selecionar 30 pessoas, mas no fim foram escolhidas 37. Esse fato fez o filme saltar de 40 minutos para uma hora e meia de duração”.

Com os recursos escassos, Berlesi não imaginava que a sua iniciativa iria tão longe. “Quando eu fui em 2007 no Programa do Jô, as portas se abriram para as pessoas me ouvirem. Então percebi que esse era o momento. Tinha pouca grana, uma mixaria. Fizemos tudo pensando em gastar o mínimo. Só tínhamos um funcionário, que era o cara do áudio. O restante da equipe estava engajado no projeto apenas pela parceria mesmo”, salientou.

Para rodar o filme, o cineasta usou verba própria e também cotas de patrocínio. Porém, isso acabou impondo regras que acabaram limitando-o em alguns aspectos. “O Dá Um Tempo foi rodado rapidamente. Em menos de um mês estava pronto. Conseguimos vender sete cotas de patrocínio, mas a mais alta foi em torno de R$ 2 mil reais. A nossa ideia era rodar o filme em uma escola pública, mas acabou sendo filmado em um colégio particular devido a esse incentivo. Em outro momento, cortamos uma cena em que o personagem principal reclamava dos horários de ônibus. No fim nós tivemos que nos submeter a isso tudo”.

Confira a galeria de fotos dos bastidores dos filmes da produtora:

Fotos: Arquivo Pessoal

Sobre o incentivo fiscal ou editais, Berlesi submeteu apenas uma vez seu filme. Porém, cita que a burocracia atrapalha quem tenta através deste meio. “Se tu quiser entrar num edital, vai ter que escrever várias páginas falando da história. Por que eles não leem o roteiro, então?! Eles querem ler o gênero, tom, premissa, etc. Aí tu faz tudo isso, se inscreve no edital e espera por um longo período, que pode chegar até a um ano. E muita vezes a resposta é negativa. Eu não tenho paciência pra isso”, finalizou.

7 DICAS PARA PRODUZIR O SEU FILME

1. Consuma cinema

Muitos autores consideram que não é preciso ter uma formação para ser um bom roteirista, mas todos concordam que é fundamental consumir aquilo que você está desenvolvendo. Quem vai ao cinema conhece as diferentes narrativas, tem imaginação é bagagem para desenvolver tudo o que deseja.

2. Escreva historias que você conheça

Roteiros são considerados um trabalho que requer imaginação, mas mais do que ter um plano mirabolante na cabeça, sempre que você escreve sobre algo que conheça tudo fica mais fácil. Os personagens estão diretamente ligados ao comportamento humano. A partir do roteiro eles se transformarão. Observe o mundo a sua volta.

3. Pesquise

Depois de ter definido uma ideia para seu roteiro, PESQUISE! Pesquise absolutamente tudo sobre o seu tema. Quanto mais você souber sobre o seu assunto, mais rico será o seu roteiro e não terá espaço para clichês!

4. Escreva muito e em qualquer lugar

Pense rápido! Você já esteve em algum lugar e teve uma ideia fantástica? E logo após isto a esqueceu por que não teve tempo de anotar? Pois é, isso costuma acontecer com muita frequência. Por isso a quarta dica é: sempre escreva e lembre-se de não iniciar seu texto em uma página em branco, vá jogando ideias em um documento sempre que vier a sua mente.

5. Consiga um emprego

Para muitos, o roteiro infelizmente não é a principal fonte de renda. No início da sua carreira busque outras fontes estáveis de renda. Assim, você conseguirá trabalhar em suas ideias de forma mais tranquila.

6. Viva a vida

Se você não tem nada para dizer e não viu nada mais do que um punhado de filmes, sobre o que você vai escrever? Só se pode contar aquilo que se conhece.

7. Persistência é a chave!

É importante aprender a lidar com as quedas e rejeições. Acho que um dos motivos pelo qual os roteiristas são tímidos é que estamos todos sempre suspeitando dos nossos processos, já que ele fracassa com frequência.

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Thiago Ribeiro
Carretel Arte & Jornalismo

27, acadêmico de Jornalismo na ULBRA | Grêmio, doguinhos, Rock, etc