#16: esperança

stéphanie
carteiro
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3 min readDec 31, 2020

r.,

que responsabilidade é escrever uma carta na véspera de ano-novo, principalmente por ser a última desse ano tão difícil e depois da sua de natal, que me angustiou com tamanha angústia. tardiamente respondo: não se preocupe, não é nosso papel levar esperanças a ninguém nesse cenário. é papel do imbecil do presidente e dos imbecis dos ministros. mas, sabendo quem eles são, esperança realmente não vai haver tão cedo.

torço para que seu natal tenha sido bom, menos angustiante que a véspera. não tenho muito o que falar do natal, não é uma data com a qual me relaciono de verdade. até tentei ver uns filmes para despertar o espírito natalino, mas não funcionou muito. um, porém, chamou minha atenção. vi aquele a felicidade não se compra, que é um clássico. dentre muitas coisas, a ideia do filme é mostrar a importância do indivíduo para o coletivo, mas não de um jeito ególatra. é como dizer: veja como somos transformadores, como alteramos a vida do outro e do mundo, independentemente do que e do quanto fazemos. e isso é um fato se pensarmos no que estamos vivendo: veja como não respeitar o distanciamento e as medidas de segurança nos levaram a mais de duzentos mil mortos em nove meses. (desculpe, era para ser uma carta um pouco mais otimista.)

é realmente uma pena que todo o pesadelo de 2020 não vá acabar hoje no minuto que o relógio virar 00h. pra nós, brasileiros, acho que os ponteiros vão ficar parados no 23h59 por um bom tempo. nem parece, aliás, que o ano vai mudar. é coisa do passado pensar que amanhã será janeiro, um recomeço cheio de sol e luz, horário de verão, carnaval chegando, cerveja gelada. amanhã vai ser só amanhã, e o que dizer? o jeito é dar boas-vindas a 2021 do jeito que der: de roupa nova ou de pijama, de calcinha vermelha ou sem calcinha, comendo sete uvas na hora da virada ou simplesmente roncando gostoso, como sua tia na belíssima foto que você mandou junto da última carta.

torço para que a sua virada de ano seja boa. torço para que, de algum modo, você esteja acompanhado das pessoas e/ou das coisas que ama. talvez esse seja o único jeito de termos algum tipo de esperança. porque é isso, né? o privilégio que é termos ainda conosco, no ano de uma pandemia, aqueles que amamos. eu já falei daquela música do gil numa das cartas, não? o melhor lugar do mundo é aqui e agora.

torço, claro, para que ano que vem seja melhor. que a vacina venha, que todos nos imunizemos rapidamente para que possamos aglomerar rapidamente (e nos tocar e abraçar e beijar e rir de boca aberta sem medo). isso é, talvez, a primeira coisa pela qual torço: saúde, pra todo mundo. a segunda coisa, claro, é o presidente ser deposto. mas aí deixa de parecer esperança para parecer utópico, do jeito que a carruagem anda. nos concentremos, então, na saúde.

apesar de saber que pouca coisa vai mudar, torço para que 2021 seja uma nova chance para todo mundo olhar em volta e decidir ser melhor do que em 2020. é disso que precisamos, não? (além da vacina e da deposição do presidente, claro.)

beijos desta s. cansada mas, afinal, esperançosa,
s.

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