between me and you, our little secret

Evelyn Mackus
catching feelings
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4 min readApr 28, 2019

eu me lembro de quando suas mãos tocavam minha cintura porque nunca mais senti nada parecido com a eletricidade intensa que seus dedos me provocavam. mas eu não lembro nitidamente — é vago, quase incômodo e me faz querer censurar meus próprios pensamentos, quase com medo de que tudo aquilo tenha acontecido de verdade

e aconteceu, né?

eu brinco que foi um delírio coletivo. eu sei lá, parece estranho que tenha acontecido, que tenha dado tão certo. tão, tão certo — cê era tudo o que eu mais queria, cê sabe. sabe que o que eu mais precisava era da sensação de queda livre que sua voz mansinha me proporcionava quando dizia que eu era a mulher mais linda do mundo. eu queria tanto tanto tanto cair por você, pra você, em você. e caí.

e eu queria falar que não queria alcançar o chão, mas eu sabia que ia acontecer uma hora ou outra. não imaginava que a queda me incomodasse tanto, no entanto. por que, puta merda, como tá incomodando

é incômodo te relacionar e te usar de desculpa

é incômodo não me envolver e ter como anticorpo o pensamento de “é, mas o que a gente teve me machucou tanto”

eu sei lidar com decepções

só preciso aprender a lidar com os traumas delas

porque é incômodo te ter como referência, padrão e parâmetro de tudo o que eu tento ter na vida. desde um primeiro encontro a um flerte a uma possibilidade de me abrir e dar a oportunidade pra que outra pessoa goste de mim tanto quanto você gostava, ou mais, bem mais

mais a ponto de querer se dedicar de verdade, sabe

mas eu não jogaria isso na sua cara nem com muita má fé

é que me incomoda. me incomoda o quanto eu superei mas não superei de maneira nenhuma. superei o jeito que cê me olhava e não tenho vontade de cruzar com seus olhos que mudam de cor no sol — se eu te trombar na rua eu atravesso, se te ver em um rolê vou embora

mas são essas cicatrizes que me incomodam

o quanto a brecada que cê deu quando eu me joguei de cabeça machucou cada pedacinho da minha alma

e me incomoda também o quanto as coisas não são unilaterais e o quanto eu também te machuquei muito

sabe? cê nunca me disse isso. mas eu penso nas coisas que eu também te disse, porque nada é unilateral, nada. eu não tenho mais 15 anos pra pensar que só eu sofri e eu me lembro muito bem de exigir que você mudasse seu jeito de ser pra me encaixar no que eu queria pra a gente porque eu te amava tanto

tanto, tanto, tanto

e queria tanto que cê ficasse, queria tanto que fizesse sentido você ficar

e eu olho pra esse texto com o coração gelado porque sei que não faz o menor sentido. não fazia, nunca fez e agora parece loucura, parece um delírio, mesmo

mas a gente sabe que não era sobre fazer sentido, né?

era sobre essas suas mãos na minha cintura

era sobre o tom em que eu chamava seu nome, a intensidade dos meus suspiros

sobre as noites conversando sobre coisas que vieram antes da gente, durante a gente, depois da gente, que nunca aconteceram

que nunca vão acontecer

sabe

eu acho que tudo volta a isso

o quanto só a gente sabia de tudo o que aconteceu. ninguém sabia e ninguém estava tão dentro de tudo aquilo quanto a gente. ninguém se jogaria com tanta intensidade quanto a gente. ninguém se apaixonaria tanto por você quanto eu e nem por mim tanto quanto você naquele momento, naquele mês, naquele ano

ninguém viveria tudo aquilo com tanta entrega

e ninguém sentiu o baque com a gente. ninguém, ninguém, independente das narrativas

e isso fica

eventualmente você vai contar de mim pra alguém. ou eu de você, em outra cama, outro contexto, outras conversas

ou não. e também tá dentro de contexto

porque tudo o que a gente viveu, independentemente das consequências, da intensidade, das histórias e do que pessoas que não são a gente imaginaram, permanece exclusivamente entre eu e você. ninguém mais faz parte dessa história.

talvez teu travesseiro, que absorveu meu cheiro após algumas noites acomodando meu cabelo. talvez tua lâmpada colorida que mudou o tom da minha pele por alguns minutos, ou qualquer outra coisa que fazia parte das horas e horas que eu perdia imersa na atmosfera deliciosa que você me apresentava — e eu me jogava

mas só isso. só a gente. é segredo.

e é a confidência mais íntima que vamos dividir sempre, mesmo sendo estranhos, mesmo não nos conhecendo mais. a gente lembra. aconteceu.

e ninguém nunca vai saber tão bem quanto a gente sabe.

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Evelyn Mackus
catching feelings

a sentimental girl de “supersoaker”. chaotic good, doida dos gatos, jornalista e contadora de histórias