Fugindo Rotinas

Milena Nakata
categoria aleatoria
3 min readJan 27, 2017

Virou a esquina a caminho da sua cafeteria de costume, tinha em mente o pedido de todos os dias, sempre esperando que ninguém estivesse sentado na sua mesa de canto. Nunca tinha filas naquele horário, talvez fosse por isso que ele sempre andava 3km todos os dias para ir até lá. De segunda à segunda, sempre às 8h da manhã. Era um cara de rotinas, desde quando podia se lembrar. Mudanças nunca eram bem-vindas ao seu âmbito, quedas bruscas interferiam na sua convivência pacífica com o meio e as pessoas.

Mais alguns metros e chegaria ao Lounge Café, um pequeno casebre, em uma grande avenida movimentada. Poucas pessoas chegavam a se interessar pelo lugar, a porta de madeira gasta não atraía o mar de engravatados que percorria aquele bairro. Mas para ele, aquele era seu lugar seguro, sua zona de conforto desde quando tinha 16 anos. Perdido em pensamentos e rebeldia, esbarrou com aquele estabelecimento por acaso, em um dia de muita chuva e muitos problemas. A partir daquela data, nunca mais foi a outro lugar.

“O de sempre, por favor.”, há mais de 7 anos fazia sempre o mesmo pedido, com variações de temperatura apenas. Para os dias muito quentes, pedia seu café gelado e para os dias muito frios solicitava a bebida fumegando.

Com um sorriso no rosto, a atendente aceitou o dinheiro trocado e guardou na gaveta do caixa. Sebastian virou-se para o balcão de entrega das bebidas e aguardou chamarem seu pedido. O barista nem precisou procurar pelo dono da bebida que estava preparando, pelo horário e pelo pedido, ele já sabia a quem pertencia. Pegou seu café e caminhou lentamente para a mesa de canto, ao lado da janela.

Parou de chofre quando viu outra pessoa sentada no seu lugar, uma moça de cabelos negros, na altura dos ombros. Seus olhos verdes percorriam as páginas amarelas de um livro antigo, enquanto seus dedos tamborilavam no tampo da mesa, no ritmo da música que saía dos seus fones de ouvido. Ele ficou parado por alguns segundos, sem saber o que fazer a seguir. Era como se alguém tivesse quebrado todo o encanto do seu imaculado refúgio. Sebastian olhou a sua volta e avistou uma mesa vazia do outro lado do salão. Quase correu para alcança-la, mas quando estava prestes a sentar, um casal entrou na sua frente e ocupou os dois últimos lugares vazios.

Tomado por um leve sentimento de desconsolo, deu meia volta e caminhou para a sua mesa de sempre. Antes de chegar até lá, parou em outra mesa e puxou uma cadeira vazia. Colocou-a sutilmente na frente da garota que não perturbou-se da sua leitura.

“Desculpa atrapalhar, mas será que eu posso me sentar aqui?”, ele perguntou apontando para a cadeira que havia acabado de arrumar. Ela mal tinha ouvido o final da pergunta antes de levantar os olhos da sua história e observar que alguém apontava para uma cadeira vazia.

“Claro!”, e com um sorriso sincero, encarou os olhos de Sebastian por alguns segundos enquanto tirava os fones de ouvido, “Está um pouco cheio hoje, né?”

“Acho que eu nunca vi tão lotado…”, concordou Sebastian com um tom cabisbaixo.

“Nem eu… Ah, a propósito, meu nome é Sofia.”

“Sebastian”, e ele nunca se sentiu tão confortável em quebrar sua rotina.

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