A cultura afro-brasileira de Rubem Valentim no movimento modernista brasileiro

Redação para Mídias Digitais
Catorze Trinta Ed.5
6 min readJul 1, 2022
(Reprodução: Nutrição Visual)

Músicas, danças, culinária, festas e religião são comportamentos que determinam uma cultura. Na cultura brasileira há muitos traços que foram deixados como herança pelos nossos ancestrais africanos, escravos vítimas do tráfico transatlântico no período colonial. Ao chegar ao Brasil a cultura africana foi influenciada tanto pela cultura europeia quanto pela cultura indigena, assumindo novos traços e características culturais. E, assim, nasce a cultura afro-brasileira, um dos símbolos de luta e caracterização do povo brasileiro como nação.

Embora somente no século XX o termo “arte afro-brasileira” passou a ser utilizado, muito antes disso diversos artistas já faziam referências aos povos africanos e cultura negra em seus trabalhos artísticos. Dito isso, já é sabido a origem e a importância da cultura afro-brasileira, e, por isso, decidimos discorrer sobre as artes visuais dentro dessa cultura, em especial homenageando um artista que foi um marco no período moderno desta cultura.

A exposição “A Mão Afro-Brasileira” (1988) com a curadoria de Emanoel Araújo (1940), que consagraria diversos artistas do núcleo central das artes afro-brasileiras, destaca-se Rubem Valentim (1922–1991), cujo trabalho está presente sua origem afro-brasileira, o qual vamos apresentá-lo durante o decorrer deste artigo.

“Minha linguagem plástico-visual-signográfica está ligada aos valores míticos profundos de uma cultura afro-brasileira (mestiça-animista-fetichista). Com o peso da Bahia sobre mim — a cultura vivenciada; com o sangue negro nas veias — o atavismo; com os olhos abertos para o que se faz no mundo — a contemporaneidade”
RUBEM VALENTIM, “Manifesto ainda que tardio” (1976).

(Infográfico: Ruan Wendell)

Marco do Sincretismo

Nascido no ano de 1922 em Salvador (BA), cidade símbolo da miscigenação afro-brasileira, Rubem Valentim é um marco do construtivismo e do modernismo brasileiro, ainda que, em vida, rejeitasse tais rótulos essencialmente europeus em sua obra. Com um estilo inconfundível, as formas geométricas e as cores vivas são marca de um trabalho que buscou enaltecer a cultura negra do Brasil.

Vindo de família pobre, Valentim foi introduzido ao mundo da arte, segundo ele, pelo ofício de pintor de parede quando, aos dezoito anos, começou a realizar seus primeiros trabalhos artísticos. Formado em Jornalismo pela Universidade Federal da Bahia, iniciou-se no mundo da pintura como autodidata, posteriormente, tornou-se professor assistente no no curso de História da Arte no Instituto de Belas Artes, no Rio de Janeiro e, em seguida, se tornou professor de pintura no Ateliê Livre do Instituto de Artes da Universidade de Brasília — UnB.

A linguagem geométrica característica de sua trajetória tomou forma com a inspiração do artista na cultura popular afro-brasileira, mais especificamente no candomblé, evocando o misticismo e a magia representados no abstracionismo que se estendeu das pinturas às esculturas.

Sem título — Rubem Valentim (1989)

“Em sua obra, eles são reorganizados por uma geometria ainda mais rigorosa, formada por linhas horizontais e verticais, triângulos, círculos e quadrados”

Giulio Carlo Argan, historiador de arte.

É normal encontrar símbolos sagrados, totens e outros objetos de culto religioso relacionados em suas obras, principal forma de reconhecimento do autor, todos abrangidos pela geometria característica e única desenvolvida por ele. É dessa forma que o artista compõe um repertório pessoal, que, aliado ao uso criativo da cor, consegue se abrir a várias possibilidades.

Também é importante destacar que seu trabalho se choca à ideologia modernista construtivista, que busca produzir obras inéditas enquanto foge das tradições já impostas, visando com isso, projetá-las para o futuro.

No vídeo a seguir é possível conferir parte dessa história contada pelas próprias palavras do artista, em entrevista a TV Corcovado no programa ‘Arte é Investimento’:

Legado e persistência

(Praça do Ferreira nos anos 40 — Foto: Nirez/Arquivo Pessoal)

Há cerca de 80 anos, a vaia ao sol na Praça do Ferreira, no Centro de Fortaleza, marcava um momento histórico da cultura cearense. O coro de vaias contra o sol em um forte período de seca se tornou um marco para a reconstrução de um termo que sempre significou indignação, para se tornar um semblante de identidade, gozação e celebração. Rompimento, identidade, algo irreal como vaiar o sol, são características da Sala Vaia presente na exposição “Sempre Fomos Modernos” do Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará (Mauc), onde é possível encontrar algumas das obras de Rubem Valentim.

(Reprodução: MAUC)

No ano de 2022 celebramos o centenário da Semana de Arte Moderna, o marco oficial do modernismo brasileiro. Entre os dias 13 e 17 de fevereiro de 1922, o Theatro Municipal de São Paulo reuniu artistas de diversas áreas, entre escritores, músicos, intelectuais, pintores e escultores. Esse foi um evento que mudou a cena cultural brasileira para sempre, reivindicando entre muitas coisas, a liberdade de expressão artística, o uso de experimentações estéticas em suas obras e a valorização da identidade e cultura brasileira. 100 anos após, chega ao Mauc a exposição “Sempre fomos modernos”, uma celebração aos 60 anos do museu e ao centenário da Semana de Arte Moderna trazendo um catálogo que abraça de forma irônica os devaneios antigos da modernidade diante da atual a sociedade ocidental de guerra, desigualdade e intolerância.

A exposição leva a cartaz dezenas de obras nacionais e estrangeiras que se relacionam pelo rompimento com o tradicionalismo de suas épocas, fator pelo qual o trabalho de mais de 40 anos de Rubem Valentim é reconhecido. Engajado não apenas no conteúdo visual de suas obras, Rubem também assumiu posições políticas, defendeu a união entre povos e nações e a não submissão aos padrões vindos de fora. Hoje vivemos em um país que tem como caricatura principal alguém que ofende quilombolas e escarnece o assassinato de Marielle Franco, uma vereadora negra. É por isso e muito mais, que hoje retomar a obra de Valentim, um artista negro e baiano, e a sua influência Afro-brasileira alinhada com seu caráter político, possui grande poder e significado.

“a arte é uma arma poética para lutar contra a violência como um exercício de liberdade contra as forças repressivas”

RUBEM VALENTIM, “Manifesto ainda que tardio” (1976)

Referências:

Evolução Histórica — Data de acesso: 10/06/2022

Arte Afro Brasileira (uma “pré”-história do conceito) — Data de acesso: 10/06/2022

A linguagem afro-brasileira e universal de Rubem Valentim — Data de acesso: 10/06/2022

RUBEM VALENTIM | IRV (institutorubemvalentim.org.br) — Data de acesso: 10/06/2022

Rubem Valentim: arte, religião e diversidade | FCS — Fundação Clóvis Salgado — Data de acesso: 10/06/2022

MASP — Data de acesso: 10/06/2022

Trajetória artística de Rubem Valentim ganha vida em mostra gratuita no DF | Distrito Federal | G1 (globo.com) — Data de acesso: 10/06/2022

Simbologia africana e ativismo na obra de Rubem Valentim Cultura no Atelier — Data de acesso: 10/06/2022

Rubem Valentim — Obras, biografia e vida (escritoriodearte.com) — Data de acesso: 10/06/2022

O VALENTIM DA PRAÇA PÚBLICA: ARTE, AFRO-BRASILIDADE E ESPAÇO COLETIVO — Revista O Menelick 2° Ato (omenelick2ato.com) — Data de acesso: 10/06/2022

Semana de Arte Moderna de 22 completa 100 anos, mas o que foi o evento? — CASACOR (abril.com.br) — Data de acesso: 10/06/2022

Exposição “Sempre Fomos Modernos” em cartaz no Mauc — Museu de Arte da UFC — M A U C — Data de acesso: 10/06/2022

Guilherme Sousa, 20 anos, graduando do sexto período em Sistemas e Mídias Digitais. Amante dos animais e do Design, atuo hoje como Designer de Experiência do Usuário. Contato: guilherme6285@gmail.com
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Perfil da turma da disciplina de Redação para Mídias Digitais 2019.1 do curso de Sistemas e Mídias Digitais da UFC.