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A vida tem trilha sonora

Duas historietas da minha adolescência e muita música pra gente ouvir

Andresa Scucuglia
Celeiro de Palavras
4 min readSep 12, 2018

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Ontem ouvi essa música do Aerosmith:

…e na sequência da playlist no modo aleatório tocou essa aqui do Guns'n'Roses:

Essa combinação me fez voltar na hora para os meus 15 anos, precisamente ouvindo música no quarto de uma amiga do colegial (o atual Ensino Médio). Ela era louca por três bandas: Aerosmith, Guns'n'Roses e Bon Jovi. E isso significa que ela era apaixonada por Steven Tyler, Axl Rose e Bon Jovi...

Ela era a típica adolescente, como as de qualquer época, que cultiva ídolos e tem sonhos vívidos sobre seu futuro com eles. Eu sempre fui o oposto disso, nunca gostei de cultuar os seres humanos além da obra, e ficava tentando "detonar" os ídolos dela, bem… eu também era uma típica adolescente.

Axl Rose, Steven Tyler e Jon Bon Jovi com seus microfones, ícones nos anos 90

Embora eu curtisse Aerosmith e Bon Jovi, eu detestava o Guns’n’Roses. Além de achar o Axl poser demais, não gostava da forma como ele cantava destruindo a pronúncia das palavras. Mas ela o defendia, da mesma forma que defendia o time de futebol para o qual ela torcia.

Eu achava que o culto aos três era ser roqueiro de boutique, muito baseado na aparência. Nessa época, eu variava pouco a setlist. Gostava de escutar rock e preferia ampliar meu repertório nesse estilo, rejeitando todos os outros. Eu tinha os clássicos (Yes, Pink Floyd, Queen, Genesis, AC/DC, Rush, …) e mais uma porção de gente nova produzindo muito (Pearl Jam, R.E.M., Cranberries, Metallica, Green Day, U2, Nirvana, …).

Já disse aqui que quando surgiu o CD de repente tínhamos acesso muito facilitado a tudo que era disco. Virou mesmo uma febre. Foi justamente na mesma época dessa minha reminiscência.

Lembranças sonoras

Comigo ocorre todo tempo: ouço músicas que me levam a momentos, flashbacks. Muitas vezes, nem são momentos marcantes, talvez seja uma memória que eu dificilmente resgataria por outros motivos. Por isso, fico tão fascinada quando acontece "nossa, como fui lembrar disso?".

Há algumas semanas, fiquei ainda mais impressionada com a conexão que ocorreu. Por coincidência, da mesma época da lembrança acima. O Metrô de São Paulo passou recentemente a tocar música ambiente nos trens e quando entrei num vagão tocava uma música que não sei qual é e nem deu tempo de descobrir, mas ao ouvir os acordes eu vi na minha frente o aplicativo Cinemania '94¹! Foi insano.

Microsoft Cinemania '94

Para os mais jovens, o Cinemania era a novíssima versão multimídia de uma enciclopédia de cinema, em um tempo em que a Internet ainda era mato, como dizem. Isso significa que não tínhamos muito conteúdo disponível online ainda, ainda mais com texto, áudio e vídeo. Considerando isso, imagine que eu o devorei, fascinada: aquilo era hype, um luxo.

Esse “programa”, no jargão da época, vinha num pacote, que podíamos comprar com o kit multimídia do PC, e complementava o revolucionário Microsoft Windows 95 (embora rodasse também no 3.11)!

Screen shot do Microsoft Cinemania — nossas vidas nunca mais seriam as mesmas

O pacote provavelmente tinha a missão de trazer às famílias um gostinho da digitização que estava por vir (bye bye, Barsa²) e incluía ainda o Musical Instruments (que era legal demais também), Encarta, Bookshelf, Dangerous Criatures e mais alguma coisa.

Provavelmente a música que ouvi no metrô era da trilha sonora de algum filme, que vinha no Cinemania. Não sei qual era a música, nem de que filme, mas era algo no estilo Henry Mancini.

Trecho de Moonriver de Henry Mancini, da trilha sonora de Bonequinha de Luxo (Breakfast at Tiffany's)

Mais uma vez, sorri por dentro, pensando em quais as chances de eu lembrar desse programa, mais de 20 anos depois.

"Me passou um pensamento aqui pela cabeça e… nossa…"

Identidade sonora

Nessa história aqui, a minha primeira no Medium, eu falei sobre a sensação que tenho quando ouço Iron Maiden ou Legião Urbana. São bandas que ouvi tanto, tanto, tanto, que são meu lar. É o conforto de sentir-se em casa, não me conectam com lembranças específicas, mas comigo mesma. Me fazem lembrar que tantos anos vividos, tanto que a vida mudou, ainda sou a mesma pessoa.

Comigo ocorre muito mais com música, mas é certo que esse fenômeno pode acontecer com qualquer coisa com que a gente faça conexões verdadeiras: músicas, livros, filmes, pessoas, o que for.

Imagem: Redbubble

¹ Dá uma olhada nesse vídeo.

² Para os mais jovens, de novo, Barsa aqui não é o famoso time espanhol com erro ortográfico, mas uma enciclopédia em volumes que as famílias tinham em casa para prover cultura e fonte de consulta para trabalhos de escola.

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Andresa Scucuglia
Celeiro de Palavras

Música, filmes, livros, inovação, a vida, o universo e tudo mais. Sou jornalista e trabalho no Banco do Brasil.