Como minhas lembranças me reconectaram ao presente

Andresa Scucuglia
Celeiro de Palavras

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Pense numa pessoa apegada a recordações. Multiplique por dois, ou três... Essa sou eu. Sempre tive muita dificuldade em me desfazer das coisas, principalmente daquelas que eram frutos da minha criação. Além de ter uma queda por coleções… 😑

Sabe quando você faz exame de saúde ocupacional e tem aquelas perguntas sobre alcoolismo "já sentiu que deveria diminuir o quanto bebe"? Pois é, com esse lance de não me desapegar das coisas, eu já tive esse sentimento de que eu deveria me livrar das coisas. Mas o fato é que nunca consegui dar grandes passos nessa direção.

Quando me casei, deixei muitas dessas preciosidades na casa dos meus pais e recentemente recebi o ultimato de "ir buscar ou jogar fora" meus pertences, pois após uma reforma, não tinham mais onde guardar minhas caixas. Era justo, afinal, já saí da casa deles há 16 anos.

Consegui me livrar de muita coisa, livros da escola, provas, trabalhos… Mas ainda tive que trazer para casa coisas das quais não se dispensa sem um pouco mais de ensaio… coleção de papel de carta, de figurinhas, de selos, de charges e tirinhas recortadas de jornal, brinquedinhos, itens que já duram quase 30 anos!

O ato de conceber

Embora essas coisas tenham uma valor sentimental, minhas posses mais preciosas são os meus desenhos — todos, que sempre guardei bem ao longo dos anos — e meus textos. Criar algo é sempre um ato de trazê-lo à luz. Olhar para uma criação anos depois é recordar o exato momento em que você teve a ideia, saber exatamente o que quer dizer (com o olhar mais puro do autor da coisa), e muitas vezes ter a oportunidade de perceber "nossa, assim era a minha cabeça àquela época?!". Li uma vez uma frase que tem tudo a ver, algo como "nós não nos lembramos dos dias, nos lembramos dos momentos".

Reexaminar o presente

Essa percepção de como você era ou pensava diferente há uns tantos anos é incrível. Ela faz muitas coisas por nós. Para mim, ela abriu caminho para um grande "a-há!". A perspectiva da mudança e da evolução é muito libertadora. Quando jovens tendia a sofrer pelos aspectos negativos, ou que não me ajudavam, da minha personalidade. A aceitação foi muito árdua, nunca plena. "Eu sou assim" e vamos em frente. Então vem o "a-há!" quando você vê que sim, você era assim, mas depois disso já foi muitas outras coisas e — veja só- ainda vai mudar e evoluir muito mais!

Quando você tem registros para te lembrar como seu pensamento, comportamento e visão de mundo mudaram, facilita muito essa reflexão. Não é papo de auto-ajuda, não é frase feita. Tá ali. É muito mais fácil ter essa "conversa" quando a recordação é mais tangível.

Quanto mais longe você conseguir olhar para trás, mais longe você verá para frente. — Winston Churchill

Tenho estado nostálgica desde então, junte a isso o fato de chegar aos 40 este ano, e estar num período de muita reflexão sobre a minha carreira. Passei de um período de baixa, introspecção, e hoje estou me sentindo extremamente bem, melhor do que há muito tempo não me sentia. Um sentimento de plena produtividade, auto-confiança e esperança.

Meu baú

As recordações que guardei dão muitas histórias para contar, a minha história. Minha história escrita, desenhada, colecionada por uma "mania" que eu sempre julguei que precisava combater! A sabedoria popular me ensina — já estava na hora — que um baú repleto de recordações boas nunca é pesado para carregar ao longo da vida. Pelo contrário, quanto mais cheio, mais leve!

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Andresa Scucuglia
Celeiro de Palavras

Música, filmes, livros, inovação, a vida, o universo e tudo mais. Sou jornalista e trabalho no Banco do Brasil.