A palavra foda
Foda. Assim. Curto. Absoluto. Nasceu verbo promíscuo, cresceu na carência de palavras melhores ao longo de séculos, se reproduziu para além de outros vocabulários. Saiu da marginalidade e foi para as casas de família. Foda. É para ser usado quando der vontade — mas que haja critério. Nem tudo é foda. Só aquilo que lhe falta fôlego pra expressar. Quando faltar vontade para consultar o excesso de adjetivos da língua portuguesa. Mas nada é tão funcional. Tudo que é foda precisa ser dito logo. E por isso a palavra é enxuta, para que não sobre tempo. Foda. É o acasalamento da língua com a boca inteira, sem pudor, numa rapidinha que vale por todas as trepadas longas dos adjetivos mais eruditos. Fo-da, apenas duas sílabas. Serve à raiva e ao entusiasmo. Serve à dificuldade e ao orgulho. Existem tantas coisas fodas no mundo, e para todo o resto existe o silêncio, os lábios colados. Foda. Cabe aos tímidos tão bem quanto aos expansivos. Nada no mundo é pouco foda. Ou é foda ou não é. “Foda pra caralho” é uma convenção redundante. Foda é o máximo. Foda é o inesperado. O brilhantismo que tá escancarado, ou a classe que poucos enxergam, porque a sutileza em geral é foda. Uma coisa foda não precisa vir carregada de artifícios. Só precisa ser foda. Algo legal pode enganar e parecer foda quando na verdade é só legal. Assim como algo foda às vezes é mais foda do que parece. Uma foda foda pode ser foda também. Tenho amigos fodas, conheço lugares fodas. Tudo que é foda é imutável, permanece foda pela eternidade. Mas foda é também algo dolorido. Eu diria que é porque muitas vezes é foda ser foda. O erro do homem contemporâneo em achar que o sucesso está no futuro. Ser foda às vezes pode ser hoje. Dá pra ser foda em algumas coisas, mas em outras não. E enquanto não se é, as coisas ficam fodas de serem levadas. O caminho para ser foda um dia é foda. Ou seja antes de ser foda é preciso se foder. Acho que agora entendi.
Originally published at www.cenaseguinte.com.br on April 13, 2016.