Como o “Empurrando Juntas” vai funcionar: Entenda os perfis que criamos

Henrique Parra Parra Filho
Empurrando Juntas
Published in
6 min readMar 17, 2017

Hoje o debate político na esfera pública interconectada é construído em redes sociais que estimulam a polarização e as bolhas de opinião, em uma lógica de audiência que é operada por patrocínios e robôs (bots). A manipulação e a desinformação ajudam a constituir maiorias formadas por um grande número de fakes. Este ambiente não oferece uma possibilidade real para a deliberação política e a tomada de decisões e pior, seus efeitos negativos vêm impactando inclusive nos espaços e instrumentos tradicionais de deliberação (eleições, plebiscitos, referendos etc). Sem alternativa, os governos tentam desenvolver plataformas próprias que, sem algoritmos e uma arquitetura que responda à influência destas redes, tampouco serão capazes de evitar seus efeitos.

O app e a plataforma

O app e a plataforma do Empurrando Juntas deverá ser utilizado por governos, partidos e movimentos sociais para que?.

Os grandes debates políticos nessa ferramenta poderão envolver toda a população, sem a elitização atual dos fóruns e plataformas cívicas, e sem os efeitos da polarização, das bolhas de opinião e de manipulação existentes nas principais redes sociais.

Telas do app móvel do “Empurrando Juntas” desenvolvido no MediaLab Prado em Madrid

O app permite visualizar os grupos de opinião e suas opiniões majoritárias. Nessa base, o Empurrando Juntas criará freios e contrapesos que trazem diversidade para a opinião da maioria e impedem que só um lado domine o fluxo principal de comunicação. O Empurrando Juntas é formado também por uma “plataforma de serviços digitais” que tem as seguintes características:

1) Permitir plugar ferramentas livres de deliberação coletiva e participação

2) Protocolo de identidade distribuído com privacidade (ao estilo do login cidadão)

3) Pushes/notificações de engajamento e ação coletiva direcionada aos Apps móveis

4) Licença aGPLv3, documentação e estratégia de acolhimento de contribuições da comunidade

Essa é a arquitetura: Um aplicativo e uma plataforma em software livre que se conecta com aplicativos crowdsource de participação (Pol.is, All our Ideas etc) e que utiliza notificações push para potencializar o debate informado, a diversidade de opinião e a ação coletiva.

Os perfis da estratégia de gameficação

Criamos 3 perfis de PUSH no Empurrando Juntas:

1. Ativista de minoria

Este perfil social é muito relevante. São lideranças emergentes ou já institucionalizadas (na sociedade civil ou no Estado) e que propõem a agenda pública na luta por direitos. Representam, por afinidade, um conjunto maior de pessoas e opiniões.

Na questão do referendo da Colômbia, se os ativistas pela Paz tivessem conseguido conversar com pessoas de seu grupo de afinidade sobre as questões mais polêmicas do debate, não teria sido diferente o resultado? Sabemos que o poder prévio e os recursos prévios acabam definindo as reais chances de se obter visibilidade nas mídias sociais. A articulação íntima com a publicidade, com o patrocínio de mensagens, com as bolhas de opinião e com a proliferação de robôs são hoje temas que perturbam a diversidade de pontos de vista num debate.

É no meio deste amplo debate que nos parece interessante uma aplicação que distribua poder para ativistas em situação de minoria. Dentro da arquitetura do Pol.is, o nosso ativista é o autor de uma proposta com apoio representativo no seu próprio grupo de afinidade. Assim, vamos proporcionar que os ativistas que não concordam com a opinião majoritária possam abrir um evento e mobilizar diretamente aqueles de seu mesmo grupo de afinidade.

A tese aqui é a seguinte: estas pessoas têm afinidade de opinião [e às vezes relação de confiança] com esta ativista. Por isso, estão abertas a um debate informado e um diálogo com ela. Tal função pode servir para converter opiniões, reforçar a capacidade de mobilização de minorias e criar um fluxo de informação contra hegemônico. Nossa aposta é que esses eventos se tornem momentos sincronizados, até mesmo encontros presenciais. O usuário terá bastante flexibilidade para formatar estes encontros ou bate papos.

Gameficação para furar as bolhas de opinião

Ou seja, embora as principais ferramentas estejam servindo aos ativistas, cada vez mais servem àqueles com grandes recursos de comunicação, criando um ambiente de disputa por visibilidade e de segmentação que induz um debate pouco informado. Está aí uma lacuna a ser preenchida e que esperamos ajudar a responder com esta função, pensando no ativista cuja voz perde importância no confronto com a opinião majoritária, dentro do seu próprio grupo de afinidade.

2. Pessoa ponte de diálogo

O segundo perfil que receberá o “poder” do push é o que temos chamado aqui no time do projeto de “pessoa ponte” ou “ponte de diálogo”.

Aqui está uma reflexão que tem nos deixado realmente empolgados! Imaginem uma temática complexa ou uma consulta razoavelmente ampla. Mesmo decidindo entre “sim e não”, as pessoas acabam se posicionando de maneiras distintas para as inúmeras situações ou frases apresentadas. Olhando de fora, muitas vezes achamos que essas pessoas são “complicadas” ou estão sendo contraditórias. Como podem apoiar frases que muitas vezes parecem opostas?

Estas são as pessoas como elas são! De fato, não há quem tenha adotado um sistema de crenças coerente no todo. Mas a realidade é que as pessoas, cada vez mais, encontram situações concretas e novos fenômenos sociais a desafiar suas certezas e seus sistemas de crenças. Muitas delas se posicionam de maneira contraditória e, utilizando o Pol.is, vão manifestar sua opinião pelos diferentes graus de afinidade com frases de muitos grupos.

Opiniões majoritárias podem ser perigosas, pois é o momento em que uma maioria heterogênea converge para um mesmo fim, uma mesma ideia. Quando este fim é identificado, atualmente as estratégias de marketing centram fogo e os algoritmos das redes sociais amplificam seus esforços, entregando a pauta para esta “ideia majoritária”. Alguns clusters conseguem manter um canal de conversa interna, mas também são influenciados pela opinião da maioria.

Queremos criar um contrapeso. Nestas situações, fazer com que os “pontes consensuais”, aqueles que concordam com uma opinião da maioria e estejam “entre” grupos, com uma afinidade balanceada entre conjuntos distintos de opinião, possam receber atenção.

Conectar os pontes é uma estratégia para trazer diversidade aos grupos

Como funcionará? Suas mensagens serão apresentadas para todos aqueles que concordam com a opinião majoritária e que sejam de grupos próximos mas diferentes desta pessoa ponte.

O que significa isso? Apostar que justamente aqueles que têm opiniões complexas ou contraditórias podem cumprir o importante papel de dialogar com esta maioria emergente e incluir complexidade e diversidade para que seus membros reflitam. Está aí o potencial de reembaralhar os grupos, distender certas polarizações e apresentar opiniões contraditórias em uma linguagem que viabilize o diálogo.

3. Criador da consulta

Para que o Empurrando Juntas se torne uma ferramenta capaz de apoiar deliberações e tomada de decisões por parte de governos, é preciso que os responsáveis pela governança da consulta possam se comunicar e mobilizar os participantes e grupos formados.

Assim, a organização criadora da consulta poderá criar frases — assim como qualquer outro participante — que terão uma metáfora visual diferente (cor, badges etc) e serão apresentadas preferencialmente aos usuários (sempre no começo da fila). Serão conteúdos orientadores ou norteadores (muitas vezes necessários para que se crie uma consulta sobre minuta de projeto, para fazer a avaliação de alguma política ou programa ou para deliberar novas propostas em uma conferência).

Além de poder escrever as frases que aparecerão primeiro aos participantes, o criador da consulta terá o poder de enviar um PUSH convidando os participantes para hangouts que tenham a temática proposta na consulta. Estes hangouts são momentos de transmissão online (com voz e vídeo) no qual qualquer pessoa pode participar diretamente (inclusive não participantes da consulta) e que terão o objetivo de aprofundar o debate e/ou dar respostas às questões e propostas que emergiram nas consultas.

Pushs operados pelas instituições públicas aumentam a incidência nas decisões sobre investimentos públicos

A utilização de aplicativos de consulta/ sonda participativa para identificar pessoas e temas e que possam ser convidados a deliberações mais estruturadas ou contato direto com governantes tem sido recorrente por parte de governos, como experiências passadas do Gabinete Digital do RS, Dialoga Brasil e a atual do VTaiwan deixam claro.

Conclusões

A plataforma de serviços do “Empurrando Juntas” trabalhará inicialmente com esses três perfis identificados, porém as possibilidades são inúmeras. O conceito de usar gameficação para furar as bolhas e trazer diversidade para as discussões online vai requerer acompanhamento da adoção e os efeitos da utilização do app e plataforma, levando a ajustes dos perfis criados e abertura para criação de novos perfis.

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Henrique Parra Parra Filho
Empurrando Juntas

Filho de Jundiaí, da Democracia e da Internet / At @cidademocratica, learning by doing how tec commons can improve (or save) democracy