Imigrantes e refugiados em busca de uma nova oportunidade de vida no Brasil

Vitória Karoline
Cidades e Esportes
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5 min readJun 16, 2018
Comemoração do time do Senegal, campeão da II Copa dos Refugiados de Porto Alegre no dia 3 de junho de 2018 no Beira-Rio, um dos estádios da Copa do Mundo de 2014 — Crédito: Douglas Fritscher

A segunda Copa dos Refugiados de Porto Alegre colocou em pauta aqueles que deixam tudo para começar uma nova vida. Conheça nessa reportagem a história de imigrantes e refugiados que chegaram ao Brasil vindos da Síria, Nigéria, Guiné Bissau, Colômbia, Senegal e Venezuela.

Por Vitória Karoline, Thiago Nascimento e Angelo Pieretti

“Estou aqui e estou recuperando minha dor, esta cicatriz não vai passar, é uma coisa que machucou o meu coração. Quando cheguei no Brasil, falei que estava vivo, que precisava lutar e que não iria desistir”, relata Abdulbaset Jarour, de 28 anos, natural de Aleppo.

Na cidade de Abdulbaset, localizada no Norte da Síria, ocorrem intensas batalhas que já provocaram a morte de milhares de pessoas, sendo algumas delas, amigos e familiares do Coordenador geral da Copa dos Refugiados Brasil e vice-presidente da ONG África do Coração.

“Perdi vários amigos que não conseguiram sair. Morreram na guerra. Agradeço a Deus por ter me dado esse caminho e muito ao Brasil por ter aberto as portas e nos dado uma vida nova. Não foi fácil deixar a minha família, a minha pátria e a minha cultura”, diz Abdulbaset.

O sírio chegou ao Brasil em 2014 como refugiado da guerra na Síria com intuito de reconstruir sua vida mesmo que longe de seus familiares que estão espalhados em sete países diferentes: Canadá, Alemanha, Iraque, Líbano, Turquia, Síria e Brasil.

“Estamos aqui no Brasil lutando para sobreviver, para realmente lutar pelo nosso futuro”, diz Abdulbaset, da ONG África do Coração, entrevistado durante a II Copa dos Refugiados de Porto Alegre, realizada nos dias 2 e 3 de junho nos estádios Passo D’Areia e Beira Rio.

Abdulsaet Jarour nas quartas de final da II Copa dos Refugiados de Porto Alegre no Estádio Passo D´Areia - Créditos Douglas Fritscher

O refugiado relata que em sua cidade de origem tinha uma empresa de eletrônicos e uma empresa de construção junto a sua família. “Aleppo era como se fosse São Paulo no Brasil”, compara Abdulbaset. Com a guerra, parou o curso de Administração.

“Eu sou vítima dessa guerra que ocasionou a morte de mais de 1 milhão de pessoas sírias, crianças, jovens, homens e mulheres. Para mim é uma vergonha para a humanidade que a guerra da Síria ainda continua há mais de anos anos”, desabafa Abdulbaset.

“A Copa dos Refugiados foi criada pois nós queríamos nos reintegrar na sociedade brasileira e usamos uma linguagem universal de união para que isto aconteça, o futebol”, informou o vice-presidente da ONG África do Coração, Abdulbaset Jarour.

Pela segunda vez, uma seleção formada por senegaleses sagrou-se campeã em Porto Alegre. O torneio é idealizado pela ONG África do Coração juntamente com a Ponto — Agência de Inovação Social e Agência da ONU para os refugiados (ACNUR), com patrocínio da marca de arroz Sunrice.

Seleção do Senegal disputou a primeira semifinal contra a Angola na II Copa dos Refugiados de Porto Alegre - Crédito: Thiago Nascimento

Cantor profissional

O nigeriano Lumi, um dos participantes do The Voice Brasil 2016, cantou na abertura da II Copa dos Refugiados de Porto Alegre. Ele chegou no Brasil há 13 anos com uma bolsa de estudos e atualmente é formado em Engenharia Mecânica.

Sua carreira como cantor começou em 2006, um ano após a sua chegada, pois o seu visto não permitia trabalhar, então a música ajudou a complementar sua renda. “Eu já cantava como hobby na Nigéria, profissionalmente começou no Brasil”, diz Lumi.

O cantor nigeriano Lumi na abertura da II Copa dos Refugiados de Porto Alegre - Crédito: Thiago Nascimento

Cientista social

Assim como Lumi, o jogador da seleção da Guiné Bissau Arrais Gomes, de 35 anos, veio para o Brasil com uma bolsa de estudos. “Cheguei em 2008 para estudar Ciências Sociais na UFRGS. Atualmente faço mestrado na área de Educação”, relata o imigrante africano.

Arrais Gomes mora na casa do estudante da UFRGS com outros colegas, pois ali não precisa pagar aluguel. Ele viveu durante seis anos em Porto Alegre antes de conseguir visitar seus familiares. Depois de 20 dias retornou à capital gaúcha para concluir sua pesquisa de mestrado.

“Minha família é humilde, mas nunca chegou a faltar nada. Eu estudei e me formei lá e quando surgiu a oportunidade da bolsa, eu vim. Estou querendo ficar um pouco mais no Brasil para continuar estudando. Quando eu estiver preparado para contribuir com o país, eu volto”, diz Gomes.

Em busca de trabalho

Diferente de Arrais Gomes, o colombiano John Fredy veio para o Brasil para trabalhar, pois julga que o seu país esteja com o mercado de trabalho em baixa e que em solo brasileiro as possibilidades são infinitamente maiores. “Eu me sinto em casa aqui”, diz Fredy.

Jhon Fredy do time da Colômbia, falando sobre o mercado de trabalho brasileiro. Créditos: Thiago Nascimento

A preocupação do senegalês Makhou Laye, campeão da II Copa dos Refugiados de Porto Alegre, é poder enviar dinheiro para a sua família que permaneceu em seu país natal. Makhou chegou em Caxias do Sul (RS), na serra gaúcha, em 2013.

“Algumas famílias têm até quatro homens que não conseguem trabalho e por isso fica difícil de viver no Senegal. Nós viemos para o Brasil buscar emprego e quando dá nós mandamos dinheiro para nossas famílias”, informa Makhou, que jogou a Copa respeitando o período de jejum do Ramadã.

Jogadores do time do Senegal no intervalo de um dos jogos da II Copa dos Refugiados de Porto Alegre. Os senegaleses disputaram o torneio respeitando o período de jejum do Ramadã - Crédito: Thiago Nasicmento

A falta de trabalho foi o principal motivo do colombiano César Montolla vir para Porto Alegre. Recentemente ele conseguiu trabalho. Assim que sua situação financeira se estabilizar, ele pretende trazer o restante de sua família para o Brasil.

O capitão da seleção da Venezuela, Andry Romero, de 18 anos, veio para o Brasil com sua família. Ele já trabalha e estuda. “ O povo brasileiro foi sempre muito gentil comigo e com minha família, nunca sofri nenhum tipo de preconceito por ser um imigrante”, diz.

Abdulbaset Jarour e o capitão da seleção da Venezuela, Andry Romero - Crédito: Douglas Fritscher

Em breve estará disponível no site do torneio o álbum de figurinhas da II Copa dos Refugiados de Porto Alegre, realizada nos dias 2 e 3 de junho de 2018, com currículo profissional dos jogadores. O objetivo é ajudá-los a conseguir uma vago no mercado de trabalho.

Leia também reportagem sobre os preparativos da II Copa dos Refugiados em Porto Alegre.

Reportagem produzida durante a disciplina Gestão da Informação: Cidades e Esportes, do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Ritter dos Reis (UniRitter) de Porto Alegre (RS). Supervisão: Prof. Roberto Villar Belmonte.

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Vitória Karoline
Cidades e Esportes

Estudante de Jornalismo na UniRitter, 19 anos e gaúcha.