Oportunidade de empatia pela química
Após o carvão reinar como principal fonte de energia, o petróleo substitui-o e prevaleceu até hoje como principal fonte de matéria prima para produtos petroquímicos. Devido a sua importância estratégica na sociedade, este tipo de combustível tem grande influência na economia e política territorial, sendo um tema de fácil abordagem interdisciplinar.
Apesar de fundamental, a atividade exploratória do petróleo e utilização de fontes fósseis de energia são frequentemente relacionados à poluição do ambiente e agravamento do efeito estufa. Nesse contexto, o Brasil se insere como produtor de fontes renováveis como cana-de-açúcar, biodiesel, energia eólica e hidrelétricas.
Com tamanha relevância e presença no cenário nacional o petróleo, sua cadeia produtiva e alternativas energéticas podem ser utilizados para incentivar a aprendizagem de tópicos do programa de Química no ensino médio e superior, como o estudo de hidrocarbonetos, propriedades físicas das substâncias, processo de separação de misturas líquidas e reações químicas de produção de biodiesel e álcool. Em virtude da complexidade na matriz química, pode-se inserir conceitos atualmente compartimentados de química orgânica, físico-química, bioquímica e química inorgânica.
O petróleo e fontes alternativas de energia podem inspirar o ensino de Química, como também suprir a comum deficiência no ensino de Química Orgânica na educação química. Ao menos no Brasil, esta deficiência se deve por três grandes razões:
ser desvinculado dos demais conteúdos da química;
ter como foco operações de classificação e nomenclatura de compostos orgânicos;
ser descontextualizado.
A abordagem da Química orgânica inserida em temas de relevância social, como combustíveis, permitiria aos estudantes aprender os conceitos científicos aplicados à aspectos sociais, tecnológicos e ambientais ligados à obtenção, utilização, propriedades e composição de combustíveis, por exemplo. Esta abordagem representa uma grande ruptura com o currículo tradicional, mas apresenta grande potencial de tornar o ensino de química mais relevante para os estudantes. Não se trata de negligenciar os conceitos químicos, mas de tratá-los de forma mais ampla e significativa, de maneira que os alunos possam dar sentido ao que aprendem, possam reconhecer em suas vidas e na sociedade os princípios da química e, dessa maneira, valorizar o conhecimento e a cultura científica.
Além das questões apresentadas, a sociedade passa por mudanças significativas e cada vez mais frequentes devido ao maior tráfego de informações. Os estudantes estão mais atentos a questões cotidianas e, por outro lado, mais carentes de abordagens integralizadas de Química. Portanto, é necessário aplicar uma sistemática de ensino com bases sólidas e discussões sobre os desafios futuros, de modo a permitir que as próximas gerações tenham a percepção mais abrangente das causas desses desafios e também possam desenvolver atitudes e comportamentos favoráveis a construção de desenvolvimento sustentável.
Coerente com essa perspectiva, foram desenvolvidos trabalhos pedagógicos, que ressaltam os benefícios da abordagem socio-científica, entre os quais destacam-se:
a relação das experiências escolares em ciências baseadas em problemas reais,
maior interesse dos alunos pelo estudo de ciências,
desenvolvimento de responsabilidade social,
desenvolvimento da capacidade de verbalização e argumentação,
auxílio à aprendizagem de conceitos científicos e de aspectos relativos à natureza da ciência,
formação para a cidadania, propiciando o desenvolvimento de atitudese valores relacionados a questões ambientais, econômicas, éticas e sociais.
Algumas metodologias de ensino possuem como característica desenvolver soluções para problemas reais de acordo com as experiências escolares, na qual destaca-se o método de estudo de casos como uma das variantes do método de Aprendizagem Baseada em Problemas (Problem Based Learning, PBL), originalmente desenvolvido na Escola de Medicina da Universidade de McMaster (Canadá) no final dos anos 1960.
Na maioria das variantes do PBL, os estudantes devem cumprir algumas etapas básicas, que são: identificação e definição do problema; acesso, avaliação e uso de informações necessárias à resolução do problema; e apresentação da solução. O professor, por sua vez, tem o papel de ajudar o estudante a analisar o problema, buscar informações sobre o assunto, considerar suas possíveis soluções e, sobretudo, incentivar a reflexão sobre as consequências das decisões tomadas.
Contemplando tais aspectos, o método de estudo de casos consiste na utilização de narrativas — os casos propriamente ditos — sobre dilemas vivenciados por indivíduos que necessitam tomar decisões ou buscar soluções para os problemas enfrentados. De acordo com alguns estudos
“ nesse método o aluno é incentivado a se familiarizar com personagens e circunstâncias mencionados em um caso, de modo a compreender os fatos, valores e contextos nele presentes com o intuito de solucioná-lo”.
No contexto do ensino de Química, alguns autores identificaram diversas iniciativas sobre a utilização do método de estudo de casos no ensino superior em revistas como o Journal of Chemical Education, The Chemical Educator, Chemistry Education Research and Practice. Os principais objetivos educacionais almejados com a aplicação de tais propostas foram: introduzir conteúdos específicos; estimular a capacidade de tomada de decisão; demonstrar a aplicação de conceitos químicos na prática; desenvolver a habilidades em resolver problemas; desenvolver a habilidade de comunicação oral e escrita; desenvolver a habilidade de trabalho em grupo; desenvolver o pensamento crítico.
Portanto, as características do método de estudo de casos aliado a necessidade de maior integralização das disciplinas de química na tomada de decisões e conhecimento dos desafios da sociedade moderna, constituem ferramenta importante a ser desenvolvida para o ensino de química. Com a implementação dessa ferramenta pedagógica, é possível obter melhores resultados no aprendizado desta ciência tanto no ensino médio quanto superior. Estes resultados acontecerão devido a contextualização e integração das disciplinas comumente separadas no currículo escolar e elevar o nível de empatia dos alunos pela aplicação do conhecimento científico as dificuldades enfrentadas no cotidiano.