Superpoderes 11: elementais — água

Andre Mazzetto
Ciência Descomplicada
7 min readSep 27, 2017

Na nossa busca por super-poderes com uma pitada de Ciência, chegamos a alguns que podem ser interessantes, pois estão ligados à natureza. Coloque o Bob Marley pra tocar e vamos discutir os superpoderes elementais…iniciando com a água!

Não…não vou falar da Moana, muito menos da Elsa. A série é sobre super-heróis, não princesas da Disney.

O primeiro super-herói que deve vir à sua cabeça quando falamos de água deve ser o Aquaman (ou o Namor, da DC). Ele é talvez o mais injustiçado de todos: ele é o rei de Atlantis, um dos fundadores da “Liga da Justiça”, sendo alvo de piadas (em South Park, Big Bang Theory e até Bob Esponja) sobre o seu super-poder de conversar com peixes. Afinal, o Superman é um alienígena, a Mulher-Maravilha uma amazona, o Flash tem super-velocidade e o Batman…é o Batman. E quem afinal é esse cara que pode falar com os peixes?

Mas, aqui vão algumas razões para você começar a respeitá-lo, como o deus que é:

Suporta a pressão da água

Na maioria das vezes, mergulhar é seguro, mas só se você não descer muito e respeitar as leis da Física. No fim das contas, tudo se resume à pressão. Talvez você nunca tenha notado, mas o ar tem um peso. Ao subir uma montanha, você encontra menos ar (por isso jogadores de futebol reclamam quando vão jogar na Bolívia), consequentemente, menor pressão (sim, o ar pesa!).

Se ao subir a pressão diminui, aos descer, a pressão aumenta, e muito. A água é quase 800 vezes mais densa do que o ar e muito mais pesada. À medida que você mergulha fundo, a força de toda aquela água começa a fazer coisas estranhas com o seu corpo.

A primeira reação, e a mais comum, é a dor no ouvido causado por um desequilíbrio entre o ar dentro dos ouvidos e o ar fora do corpo. Se você for mais fundo, a pressão começará a comprimir os seus pulmões. Mais fundo ainda pode ocorrer a narcose por nitrogênio, também conhecida como “embriaguez profunda”. Devido à pressão, o nitrogênio deixa de ser inerte no nosso corpo e começa a ser dissolvido nos tecidos. Isso interfere na transmissão de impulsos nervosos pelos neurônios. Você está agora bêbado debaixo d’água. Seria o equivalente a tomar 4 taças de martini (eu gostaria de ler o material e métodos desta pesquisa…deve ser, no mínimo, interessante).

Se descer é perigoso, voltar à superfície é mais ainda. Ao reduzir a pressão, o nitrogênio volta a ficar inerte, e se você subir muito rápido, ele pode “sair correndo” pelas suas veias como o gás carbônico naquela garrafa de refrigerante que alguém ficou balançando antes de abrir. A pressão decrescente faz com que as bolhas se expandam, por isso os mergulhadores fazem paradas estratégicas ao voltar para a superfície. Não há roupa ou traje que evite isso.

Ok…talvez o Batman tenha um traje que evite isso…

Além de não sofrer de nenhum destes problemas, o Aquaman ainda se move mais rápido do que as pessoas normais na Terra, pois está acostumado com a resistência da água, que faz a movimentação ser mais lenta e difícil. Já correu na areia? Vai correr no mar (pode ser com a água na altura do joelho) pra ver como é mais difícil.

Comunicação com animais marinhos

Eu juro que não entendo as piadas com isso, porque é algo tão legal que nós já tentamos no passado. Tentamos também utilizar animais marinhos em exércitos. Recentemente, golfinhos, focas e os leões-marinhos treinados pela Força Naval da Ucrânia na Criméia passaram a integrar o exército russo (não, não é piada).

O programa de treinamento havia sido abandonado pelos EUA (que disse que nunca fez isso, mas eu duvido) e pela ex-União Soviética depois do fim da Guerra Fria, mas foi retomado em 2012 pela Ucrânia. É claro que os caras nunca divulgaram como o treinamento é ou foi feito, mas o objetivo era que golfinhos localizassem armamentos submarinos, além de colocar grampos em mergulhadores inimigos. Além das missões como “espiões”, os golfinhos eram treinados como kamikazes (como se eles tivessem escolhido este fim), no melhor estilo terrorista muçulmano, com bombas grudadas no corpo. Como os bichos são inteligentes (mais do que muitos), isso acabou não dando muito certo, pois eles se recusavam a obedecer as ordens.

Eu sei o que você está pensando, e eu também pensei nisso: se eu tivesse que escolher algum animal marinho pro meu exército, seriam tubarões. Adivinha quem tem?

Foi neste momento que o medo do Batman começou…

O Batman tem medo dele

O motivo é simples: por ser o rei dos mares, o Aquaman pode controlar e se comunicar com todas as criaturas marinhas (incluindo o exército de tubarões). Vale lembrar que 2/3 da Terra é, na verdade, mar. Além disso, o Aquaman é um cara complicado e difícil de lidar (nos quadrinhos). Por estas razões, ele tem um super-potencial para se tornar um super-vilão. Moral da história: se o Batman tem medo dele, você já deveria ter saído correndo.

Agora, essa é só para os fortes: você lembra do Homem-Hídrico? Se você é fã do Homem-Aranha, deve lembrar de um ex-namorado da Mary Jane, que devido a um acidente durante uma luta entre o Homem-Aranha e o Namor, se transformou no Homem-Hídrico. Ele culpou o Peter Parker por se tornar “água” e tornou-se um dos mais complicados vilões a serem derrotados pelo aracnídeo. Era difícil de ferir um corpo feito de água, além dos tiros de água tão fortes quanto disparos de armas de fogo.

Em uma luta (meio estranha), o Homem-Hídrico e o Homem-Areia atacaram juntos o Homem-Aranha. Como você sabe, Peter Parker é um cara inteligente. Ele não conseguiria derrotar os dois ao mesmo tempo, então, em um de seus pulos ninja, ficou entre os dois. Antes de ser atacado pulou fora, e aí ocorreu a fusão do Homem-Hídrico com o Homem-Areia, originando o Homem-Lama (não…não é piada, se você duvida, leia Amazing Spider-Man #217–218). Mais fácil manipular lama do que areia e água separadamente, e assim o Homem-Aranha conseguiu derrotar os dois. Nota 10 em Ciências para Peter Parker (como sempre). No fim eles se separaram e o Homem-Hídrico até virou bonzinho, passando a integrar os Vingadores.

A água não está presente apenas na forma líquida…também há o gelo. Aqui temos que mudar de herói. Hora de falar um pouco do Iceman, ou se você prefere vilões, podemos falar do Dr. Victor Fries, o Senhor Frio (já percebeu quantos vilões tem doutorado? Dá medo isso…).

Se você quer se tornar o Iceman, há alguns problemas. As pessoas magras tem mais problemas do que as “gordinhas”. Uma explicação é a camada de gordura, um isolante térmico natural, presente nos “gordinhos”. A gordura também é um péssimo condutor de calor. Outra explicação é o fato de que animais grandes possuem um volume muito maior do que sua área superficial de pele. Com isso, a perda de calor ocorre de forma mais lenta. Isso significa que os mais “gordinhos” perdem calor mais lentamente para o ambiente.

Some a primeira com a segunda e você já pode ser um gordinho feliz no frio. Uma solução para os magrelos é ir para a academia: o metabolismo muscular é maior do que o da gordura, gerando bastante calor. Tá explicado porque a galera “bombada” vive sem camisa…

Forte ou gordinho, você pode até suportar um pouco de frio, mas nem tanto. Nossa temperatura corporal é 37°C. Apenas 3°C a menos e os sintomas de hipotermia vão começar a aparecer. Com 27°C você perde a consciência, com 21°C, está morto. O “problema” é que a nossa temperatura é mantida pelo sistema nervoso central autônomo, o que significa que você não pode “mandar” na temperatura do seu corpo, as reações são automáticas. Quando o ar frio bate na sua pele, os vasos sanguíneos se contraem e o sangue é levado para o centro do corpo, onde estão os órgãos mais importantes que devem ser mantidos na temperatura certa. É por isso que seus dedos estão congelando, mas seu peito ainda está quentinho. Tremer é outra reação: nossos músculos contraem e expandem rapidamente para produzir calor.

Para baixar a temperatura, temos que tirar o nosso corpo do piloto automático. Há uma pessoa que consegue fazer isso: o holandês Wim Hof, o “Homem de Gelo”. Hof é o recordista de tempo em um banho de gelo, ficando 1 hora, 52 minutos e 42 segundos coberto de gelo, só com a cabeça pra fora (não faça isso em casa!).

Win Hof, o Iceman da vida real.

Além disso, Hof também subiu o Monte Kilimanjaro, (5.895 m de altitude) em dois dias…usando apenas um shorts. De alguma forma (ninguém sabe como...poder da mente talvez?) ele consegue manter o sangue circulando nas extremidades, por isso não sofre o congelamento (o que os americanos chamam de “frostbite”). Ele gera mais calor e distribui mais eficientemente que um ser humano normal. Se você estiver interessado, ele tem treinado algumas pessoas para fazer o mesmo — confira no site dele.

Não dá pra concluir se o feito de Hof é devido ao seu treino ou a um “problema fisiológico” que o ajuda a manter a temperatura nas extremidades.

Como vimos, o Aquaman não é tão ruim assim! No próximo texto trataremos de outro superpoder elemental, o do fogo.

Até mais, e obrigado pelos peixes!

Interessado pela série dos Superpoderes? Confira todos os textos neste link!

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Andre Mazzetto
Ciência Descomplicada

Biólogo, um cientista que não é movido a café. Entusiasta da Ciência e da Educação. Editor e autor do blog Ciência Descomplicada.