Do rosa danoninho às questões estéticas presentes em “Pieles”

Gabriel Rios
cinecríticauff
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3 min readOct 17, 2017

Sexo, tara, estupro e pedofilia. Não nessa ordem, necessariamente, e nem sempre tão claros. O rosa e lilás que amenizam — e embelezam — visualmente “Pieles”, de Eduardo Casanova, são os únicos pontos tranquilos do primeiro longa-metragem do diretor. O filme, de 2017, caminha pela vida de diversos personagens com deformidades corporais. Vemos uma casa de prostituição de pessoas disformes, um jovem que nega parte de seu corpo, uma menina com o ânus no lugar da boca, uma mulher com nanismo explorado atrás de uma fantasia, um homem com a pele queimada, uma mulher com a face desfigurada. Ambos escondidos, lidando com a sociedade ocultando suas imagens assustadoras, fazem o espectador pensar sobre o corpo.

Não é de horror que se trata o filme e sim do exagero, tema recorrente nos curtas iniciais do diretor como “Fidel”, “La hora del banho” e “Fumando espero”. Eduardo Casanova chama atenção para a questão estética e insatisfação das pessoas. Além da estética simétrica e do trabalho fotográfico com cores delicadas e em escala, a estética corporal é levada ao extremo. A questão da beleza é invertida e esfregada na cara do espectador o tempo todo. As deformações externas e internas do homem, são uma chamada para o horror ao homem. E não satisfeito em levantar reflexões sobre a perfeição, sobre o tempo — beleza é passageira — e sobre a insatisfação, ele transforma o que até então é visto como exagero em fetiche.

A temática sexual, também recorrente em outros trabalhos do autor, às vezes parecem singelas em meio a tanto choque. Mas estão ali. O sexo é motor para a procura da deformação — referência ao personagem que não se atrai por “mulheres normais” — , é o que abre o filme e o movimenta. A procura pela beleza se costura à eficácia sexual e a busca da felicidade. Os corpos em transa não são perfeitos, mas o querem ser, de forma a botar a perfeição contra a parede e entrelaçá-la com a insatisfação, mesmo que só do lado de cá da tela. O sexo é gatilho para aceitação ao horror do homem, ponto em que o filme trabalha a deformidade interna, e ponto importante para manter o carnal bem próximo de quem assiste.

Outro ponto importante das impressões que causa, é a aproximação. O close-up é utilizado quase sempre para destacar a dor das personagens, como mais um elemento do exagero. É fácil achar frames da face focada em situações dramáticas com expressões delicadas. É possível ver o cuidado em tornar alguns elementos do filme sensíveis em contrapartida a overdose de peles deformadas.

A atuação também é exagerada, o que não é ruim. É dramática o quanto pode. Tem grito, choro — muito choro — mas torna o grotesco necessário. Embora falte o cuidado em aprofundar e melhor trabalhar cada personagem — além de suas dores em relação a estética e as consequências delas — o filme funciona. De fato a narrativa não termina junto aos créditos, tamanha capacidade de irritar quem assiste, é um dedo na ferida. É um susto. Uma reflexão sobre o amor à aparência, com beleza e estranheza.

“… peles se operam, se transformam. Aparência física é nada” (diálogo do filme)

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