O Poço — A mensagem é obvia, caracol?

“A sociedade é moldada por aqueles que só pensam em si mesmos.” E, no fim, a palavra chave é: cooperação.

Giovanna Perroni
Cinema e Cerveja
3 min readMar 30, 2020

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Título Original: El Hoyo
Direção: Garder Gaztelu-Urrita
Roteiro: David Desola e Pedro Rivero
Elenco: Ivan Massagué, Zorion Eguileor, Antonia San Juan
Gênero: Sci-Fi, Horror, triller
Nacionalidade: Espanha
Duração: 1h30min

Garder Gaztelu-Urrita estréia seu primeiro longa-metragem surpreendendo pela qualidade do material, trazendo aquela mesma sensação que tivemos em 2017 com o terror do, também novato até então, Jordan Peele (Corra!). O mesmo pode ser dito dos atores, pouco conhecidos (no circuito comercial, ao menos), provavelmente serão escalados para outros trabalhos da Netflix, porque se provaram ótimo atores e, pela repercussão da estreia, já são figuras marcadas. Com apenas 592 mil dólares de orçamento, o filme foi um sucesso. Pelas técnicas usadas com excelência em um longa que se passa, praticamente, em apenas um cenário, ainda espero mais filmes do diretor.

Surpreende, também, o roteiro de David Desola e Pedro Rivero (também ficarei de olho neles) que, não apenas critica mas, principalmente, mostra, elucida uma realidade grotescamente desigual e consequentemente desumana. Há quem se incomode com o final “aberto”, mas a pretensão da história não está pautada em uma resolução, um remédio, mas sim no diagnóstico. No entanto, o diretor compartilha o que seria sua interpretação para o final do filme, o qual, segundo ele, foi refeito, uma vez que o primeiro final filmado dava uma “explicação”. Ainda que Urrita diga enfaticamente que espera que a interpretação venha de diferentes formas ao interlocutor, compartilhar a sua, uma vez que é o diretor, já entrega uma resposta. Por esse motivo não a comentarei aqui, espero que você realmente desenvolva a sua, acho que será interessante.

O longa é, o tempo todo, tenso e angustiante: enquadramentos fechados, paleta de cores que alternam entre um azul gelado, um cinza quase chumbo, que tiram totalmente a “vida” daquele ambiente; e um vermelho vibrante que antecipa momentos de perigo eminente — tudo isso cria uma atmosfera profundamente tétrica e pesada . A sonoplastia é igualmente aflitiva, na maior parte do tempo é sutil, você pode até não perceber, mas ela te leva na profundeza daquele tormento. Apesar de não ser uma pessoa especialmente fã de da escolha de incluir gore, admito que é um elemento essencial para a linguagem e estética que compõem a obra. Bem como as inúmeras cenas com comida que são, assim…bem, você que assistiu sabe.

Mas vamos agora para o ponto crucial dessa obra: a crítica. Como mencionei, o filme traz o retrato, os críticos somos nós. Isso é possível porque o desenho não é nada sutil, é completamente bruto e escrachado, o que nos conecta com a mais profunda natureza humana enquanto animais que somos, antes da civilidade social. Através da constante alternância de u andar para o outro, a história nos diz: Agora você esta aqui, depois você estará onde? Bem como a denúncia de uma elite que age com desdém e fria crueldade, fruto de um constante medo em perder os privilégios. Até a ideia de justiça é colocada à prova, uma vez que seu “justiceiro” acaba, em sua jornada honrada, matando grande parte das pessoas que intentava ajudar. Contudo, a palavra do filme é: cooperação. Uma vez que sem cooperação e comunicação, todos os envolvidos naquela situação perdem a todo momento. Isso te lembra de alguma situação atual?

Em sua velocidade predominantemente rápida (o filme tem, inclusive, 1h30m de duração), o longa se desenrola rápido, mas parece se ter passado toda uma vida, dada a enorme quantidade de informações e reflexões que são deixadas ao espectador. Bem, termino por dizer que vocês provavelmente ainda ouvirão falar desse diretor.

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