the jazz singer sendo exibido em um teatro warner

A História de Hollywood pt.2

Como a Era de Ouro da indústria do cinema construiu tudo o que conhecemos hoje

Pedro Guerra
Cinema & TV
Published in
5 min readOct 23, 2013

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No texto anterior pudemos acompanhar a invenção do cinematógrafo, a “criação” de Hollywood e o auge do cinema mudo, com estrelas que brilham até os dias de hoje. Em 1927 uma nova mudança de paradigma surgiria na indústria com o lançamento de The Jazz Singer, o primeiro filme falado da história, fato que aos poucos mudaria a indústria fundamentalmente — abrindo espaço para a construção da Hollywood cintilante, glamourosa e romântica que hoje guarda muitos filmes que aprendemos a chamar de clássicos.

A Era dos Estúdios

Embora The Jazz Singer não fosse um filme realmente falado — tinha apenas alguns minutos de áudio sincronizado —, foi ele o responsável pela mudança de ares nas salas de projeção. Viu-se que com os avanços tecnológicos, a partir daí bastariam apenas alguns anos para que o cinema fosse completamente sonoro.

O teatro de vaudeville, maior concorrente do cinema até então, viu seus dias contados agora que não podia competir com as maravilhas dos filmes musicados. Com isso, muitos dos artistas migraram para o cinema à procura de emprego. Muitos atores do cinema mudo viram suas carreiras arruinadas por causa de suas terríveis vozes, seus sotaques ou ainda porque não conseguiam decorar suas falas. O mesmo cinema que criou as estrelas do cinema mudo fez questão de enterrá-las enquanto contratava dançarinso, cantores e celebridades da vaudeville e do rádio.

O vencedor do Oscar de Melhor Filme O Artista (The Artist, 2011) é uma ótima história sobre esse período, acompanhando o ator George Valentin na transição do cinema mudo para o falado. A personagem é uma estrela que resiste a nova tecnologia e com isso vê sua carreira se apagar enquanto a de seu par romântico, a falante e vivaz Peppy Miller, explode em sucesso nos novos filmes falados. Outro filme que fala sobre essa transição é Cantando na Chuva (Singin’ in the Rain, 1952), de forma bem mais amena, otimista e romântica, é claro, até porque Cantando na Chuva é produto justamente da era de ouro, com a estrela brilhante que era Gene Kelly.

Em paralelo a todo esse movimento artístico, estúdios pequenos começavam a encarar a falência quando se viam sem capital para adaptar-se às tecnologias. Isso fez o poder do Big Eight (os oito maiores estúdios, lembram?) aumentar e acabou por solidificar sua posição como mandantes da cidade do cinema. Por fim, Hollywood pôde investir na novidade do som para esquivar dos sintomas da Depressão durante o momento em que o país mais precisava.

O sucesso dessa era foi construído através do sistema de estúdio, que funcionava num modelo de verticalização de negócios onde os estúdios eram donos de suas respectivas redes de cinema. A distribuição dos filmes era garantida e os estúdios maiores (MGM, Paramount, Warner, RKO e Fox) mantinham as maiores salas de exibição e detinham maiores bilheterias, enquanto os estúdios menores (Universal, Columbia e United Artists) tinham apenas salas pequenas e por isso dependiam de cinemas independentes para distribuir seus filmes. Outra característica importante da era de ouro foi uma tática chamada “block booking” (literalmente, ‘reserva em bloco’), na qual os estúdios vendiam aos cinemas um ano inteiro de exibição de seus filmes. Esse pacote continha alguns filmes importantes e de grande orçamento para atrair os compradores, mas o resto era uma enormidade de filmes de baixa qualidade. Essa técnica de vendas foi usada pelos executivos justamente para encobrir as produções de baixo orçamento e forçar sua venda, já que os pacotes tinham filmes muito importantes para as salas, cuja compra era quase obrigatória.

O Sistema de Estrelas

Outra pedra fundamental na era de ouro foi o sistema de estrelas, que basicamente transformava os atores e atrizes em funcionários dos estúdios. Para quem não sabe, atualmente esse sistema não existe mais e cada artista é contratado pelo tempo de produção de cada filme em que atua. Dentro desse sistema os artistas estavam realmente presos ao estúdio e suas normas. Então cada produtora contratava atores jovens, promissores e bonitos para dar-lhes uma nova imagem pública, às vezes mudando até seu nome (Lucille LeSueur virou Joan Crawford) ou mesmo pagando cirurgias plásticas (foi assim que Margarita Cansino se transformou na bela Rita Hayworth). Tudo para deixar o artista mais rentável. E o pacote incluía até aulas de atuação e lições de canto, embora a ênfase fosse na imagem. Os estúdios também escolhiam em quais filmes o artista ia atuar e quais outras estrelas iria namorar, para aumentar a publicidade. Cláusulas específicas nos contratos proibíam o uso de drogas, o alcoolismo, o adultério e até o divórcio. Quando um escândalo estourava, o estúdio era quem negociava com os tablóides a venda das notícias (e a multa da quebra de contrato por parte do artista pagava o silêncio das testemunhas).

(Para fazer um paralelo com os dias de hoje, basta pensar como a indústria fonográfica trabalha com seus artistas. O mundo da música é repleto de cantores e bandas que são completamente produzidos por executivos através de pesquisas de mercado e tendências culturais, tudo com o objetivo de maximizar a penetração no mercado.)

Os diretores também estavam presos aos estúdios por meio de contratos, o que resultou numa padronização de filmes. Essa pasteurização da técnica chegou a criar estilos distintos entre estúdios. Cineastas famosos da época, como Hitchcock e Orson Welles, batiam de frente contra as restrições impostas pelos estúdios. O conceito de “filme de autor” não existiu em Hollywood até depois da era dos estúdios, mas isso já é assunto para o terceiro e último ato de nossa jornada através da história.

A era de ouro de Hollywood foi responsável por vários dos maiores clássicos do cinema, como …E o Vento Levou (Gone with the Wind, 1939), O Mágico de Oz (The Wizard of Oz, 1939), Casablanca (1942), King Kong (1933), O Falcão Maltês (The Maltese Falcon, 1942) e Cidadão Kane (Citizen Kane, 1941), para citar apenas alguns. Se o leitor procura por clássicos inconfundíveis, filmes que marcaram gerações e que entraram para a história com roteiros, diálogos, interpretações, estética e/ou técnica, o leitor tem o dever de assistir aos filmes já citados e procurar os seus próprios tesouros. Compartilhe seus romances preferidos e diga o que achou dos meus favoritos.

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Pedro Guerra
Cinema & TV

Pseudojornalista, queria escrever tanto quanto sonho.