Entrelinhas #2

Felipe
cinetorio
Published in
4 min readMay 26, 2018
#2

Coletânea de pequenas opiniões a respeito de produções cinematográficas assistidas recentemente.

O Sacrifício do Cervo Sagrado (Yorgos Lanthimos, 2017)
IMDB: https://www.imdb.com/title/tt5715874/
★★★★★★★✩✩✩
Sinopse

Steven é um cardiologista conceituado que é casado com Anna, com quem tem dois filhos: Kim e Bob. Já há algum tempo ele mantém contato frequente com Martin, um adolescente cujo pai morreu na mesa de operação, justamente quando era operado por Steven. Ele gosta bastante do garoto, tanto que lhe dá presentes e decide apresentá-lo à família. Entretanto, quando o jovem não recebe mais a atenção de antigamente, decide elaborar um plano de vingança.

É muito bom ver o Lanthimos ganhando cada vez mais prestígio internacional. Não sei qual foi o orçamento desse filme, mas só pelo elenco estrelado e por ser uma produção norte-americana, já imagino que tenha sido maior — isso sempre foi uma questão na obra do próprio diretor, que em diversas entrevistas já afirmou a limitação pela pouca verba nos filmes nacionais. Imagino que desse filme em diante a tendência seja ter mais dinheiro, quero ver como ele se desenrola daqui pra frente com menores limitações.

Não é o melhor filme do diretor, mas com certeza é um bom filme. Sempre fiz pra mim a associação suas produções cinematográficas com o realismo mágico, no mesmo sentido que permeia os livros do Gabriel García Márquez: acontecimentos inusitados no cotidiano e reações/consequências igualmente peculiares. Em O Sacrifício do Cervo Sagrado fiquei com essa mesma impressão.

Ensiriados (Philippe Van Leeuw, 2017)
IMDB: https://www.imdb.com/title/tt6497898/
★★★★★★★★✩✩
Sinopse

Permanecer trancados dia e noite, sem sair, nem mesmo ousar olhar para fora. Esta não é a rotina em uma cadeia, mas sim a vida cotidiana de uma família em Damasco, Síria, durante a guerra. Uma família que vive sob intenso perigo, e que faz o que pode para continuar a vivendo. O apartamento tornou-se uma espécie de bunker, e tudo é organizado de acordo com a escassez. Lá, cada dia é pensado para a existência do próximo.

É um fenômeno comum nas minhas experiências cinematográficas: muitas vezes um drama é mais aterrorizador do que espíritos malignos e vingativos ou um sociopata deixando uma fila de corpos. No caso de Ensiriados (Philippe Van Leeuw, 2017), esse pensamento é elevado ao extremo. Ele é um retrato da vida real em zonas de guerra. Com um tiro, logo no início, ele consegue destruir tudo o que vinha criando.

Sua principal qualidade é conseguir construir um sentimento de claustrofobia: dentro de dez minutos somos apresentados há diversas personagens, todas convivendo em um grande apartamento, reclusas em seu interior fortificado, mas ainda assim tão frágil frente a guerra que ocorre em seu quintal. Mesmo assim, há uma busca pela normalidade cotidiana: enquanto bombas explodem do lado de fora, a matriarca, passado o perigo, tem como primeiro objetivo limpar o pó da casa.

Por fim, é importante ponderar que o filme, por mais que aborde uma realidade síria, é uma produção francesa. E por via de regra, sempre vai haver certo enviesamento no que é transmitido.

O Sétimo Continente (Michael Haneke, 1989)
IMDB: https://www.imdb.com/title/tt0098327/
★★★★★★★★★
Sinopse

Georg e sua esposa Anna percebem o quanto suas vidas são isoladas e monótonas quando sua filha Eva, em uma tentativa desesperada para conseguir atenção, passa a fingir estar cega. A família decide então alterar sua realidade e mudar para a Austrália.

Estreando com um longa propositadamente incômodo, Michael Heneke nos faz submergir dentro do cotidiano ordinário e monótono de uma família de classe média alta austríaca. Por mais que possuam uma boa condição financeira, não conseguem escapar do vazio interior. A primeira a manifestar é a filha, ao fingir uma cegueira em busca de atenção. Curiosamente, a mãe é oftalmologista.

Não é um filme fácil. À narrativa se desenvolve lentamente e em alguns momentos, torna-se tediosa. Como espectador, ansiamos algo drástico no filme que quebre essa constante que gradualmente nos deixa mais angustiado. E quando acontece, ficamos atônicos. No final, não sobram interrogações, apenas no resta uma crua violência.

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Felipe
cinetorio

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