Entrelinhas #4

Felipe
cinetorio
Published in
4 min readJun 11, 2018
#4

Coletânea de pequenas opiniões a respeito de produções cinematográficas assistidas recentemente.

Não Amarás (Krzysztof Kieslowski, 1988)
IMDB: https://www.imdb.com/title/tt0095467/
★★★★★★★★★
Sinopse

Jovem de 19 anos munido de uma luneta começa a observar a vida da sua vizinha (uma mulher madura), que mora defronte ao seu apartamento. Ele fica obcecado por ela e enquanto observa sua vida sexual (na qual o amor não existe), ele esquematiza subterfúgios para se aproximar dela. Com o tempo ele revela seu amor, mas ela o humilha e algo surpreendente acontece nesta relação.

O filme polonês é extremamente bem construído e tem em seu encadeamento narrativo seu ponto alto. A sequência inicial é tão bem organizada que, em sua construção, nos sentimos parte do voyeurismo do protagonista. Esses temas já foram abordados em filmes como Janela Indiscreta (Alfred Hitchcock, 1954), mas aqui não há o elemento do crime.

O foco então é no desenvolvimento dessa manifestação sexual e suas consequências em detrimento de avanços e retrocessos. Relações interpessoais. Para a psicanálise, normalmente se fala no par voyeurismo-exibicionismo, não sendo caixas fechadas: cada uma apresenta também característica da outra. E isso é representado magistralmente.

Também há nele um ponto atualíssimo. Na ultraexposição da era digital, somos interpelados a interagir dessa mesma forma. A observação pela janela transpassa os mesmos elementos que hoje permeiam os stories e fotos das redes sociais. O sofrimento acaba também sendo o mesmo.

A Armadilha (Srdjan Golubovic, 2007)
IMDB: https://www.imdb.com/title/tt0478813/
★★★★★★✩✩✩✩
Sinopse

Belgrado pós-Milosevic, capital de uma nação que luta para encontrar sua alma, cujo recente passado turbulento deixou muitos em um deserto moral e existencial. Essa é a casa de Mladen, sua esposa Marija e seu filho Nemanja. Quando Nemanja desenvolve um sério problema no coração, os médicos dizem que se faz necessária uma cirurgia em caráter de urgência em outro país. Mas onde obter 26 mil euros? Só quando os pais do garoto desistem da esperança de levantar o dinheiro, um homem entra em contato com Mladen e se oferece para pagar a quantia toda. Mas para isso tem uma coisa que Mladen deve fazer: assassinar o rival dele nos negócios.

O mais bem avaliado filme sérvio nos entrega um Noir bem construído, embora não inovador em trabalhos do gênero. As atuações ajudam no roteiro que, por mais que tenha qualidade, é básico: não há grandes reviravoltas e, as que tem, acabam sendo previsíveis. Exceção para os últimos vinte minutos.

Em alguns momentos, a angústia frente ao assassinato e o não-contato do mandante do crime, somado às cenas em que ele está relatando para a polícia, dão um toque Crime e Castigo ao filme. Logo se desmanchou, mas pessoalmente falando, acredito que poderia ter levado a história para um patamar acima.

O Sonho de Wadjda (Haifaa Al-Mansour, 2012)
IMDB: http://www.imdb.com/title/tt2258858/
★★★★★★★★✩✩
Sinopse

Wadjda é uma menina de 12 anos que mora no subúrbio de Riade, capital da Arábia Saudita. Embora ela viva em uma cultura conservadora, é uma garota cheia de vida, que usa calça jeans, tênis all star, escuta rock-n’-roll e deseja apenas uma coisa: comprar uma bicicleta e disputar uma corrida com seu melhor amigo Abdallah. Mas, em uma sociedade que diz que as bicicletas são apenas para os meninos porque podem ser perigosas para a virtude das meninas, ela enfrentará muitas dificuldades para realizar seu sonho.

Uma pérola escondida em meio ao deserto.

O filme, apenas por seu contexto, já vale o compartilhamento e exibição: a diretora, Haifaa al-Mansour, é a primeira diretora mulher da Arábia Saudita. Em seu primeiro longa, O Sonho de Wadjda, ela nos entrega uma enorme crítica a sociedade saudi-arábico e seu fundamentalismo que resulta na privação da liberdade feminina.

Há tempos não assistia um filme em que sentia afeição pelo(a) protagonista como ocorreu com a Wadjda. A construção da personagem é tão bem feita que até em suas contradições, quando a garota é colocada contra outras e se omite, basta um olhar pesaroso para captarmos sua confusão e culpa.

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Felipe
cinetorio

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