Patrick Melrose, TV, 2018

Felipe
cinetorio
Published in
4 min readOct 8, 2018

A composição desse texto traz informações sobre seu enredo, não leia se não tiver assistido.

★★★★★★★★★

Informações técnicas

Título Original: Patrick Melrose
Ano de Lançamento: 2018
Direção: Edward Berger
País de Produção: EUA e Reino Unido
Idioma: Inglês
Duração: 300 min

Sinopse

Baseado na série literária semi-biográfica de Edward St. Aubyn, a trama narra a odisseia angustiante de Patrick Melrose, de sua infância profundamente traumática, ao abuso de substâncias na fase adulta e, por fim, em sua eventual recuperação. O protagonista interpretado por Benedict Cumberbatch é um playboy e aristocrata sarcasticamente engraçado que luta para superar os danos infligidos por um pai abusivo e por uma mãe que tolerava tal comportamento.

Há uma grande quantidade de produções que buscam narrar as consequências, na vida adulta, de acontecimentos ocorridos na infância, sendo que a maioria delas aborda os traumas físicos e/ou psicológicos. De certa maneira, é algo que se tornou usual no mundo da cultura ao mesmo tempo em que na sociedade passamos a discutir com mais propriedade os abusos nas práticas parentais e os efeitos disso para o desenvolvimento.

A produção da minissérie consegue trazer inovações na medida em que a própria estrutura é incomum: são cinco episódios e por mais que haja um fio condutor que interligue eles, na prática, são histórias independentes entre si. Isso se deve ao fato de que cada episódio é a adaptação de um romance da série literária do escritor inglês Edward St. Aubyn.

Em um primeiro momento, somos levados a pensa que o protagonista que dá nome ao seriado e interpretado por Benedict Cumberbatch, é apenas mais um adulto rico e frustrado, que vive em preso em uma eterna adolescência: utiliza diversos tipos de droga; mantém relacionamentos com diversas mulheres, aparentemente majoritariamente uma relação sexual.

Com o decorrer do primeiro episódio e da série de maneira geral, vamos percebemos a essência das suas atitudes, principalmente quanto ao alto consumo de drogas, posto que com um olhar um pouco mais demorado, vemos sob a pele o caráter de fuga que esse uso possui. Patrick é um homem que vive assombrado pelos fantasmas do passado, que apesar de estarem temporalmente distantes, andam em seu percalço, como uma sombra.

O principal elemento que o assombra é a relação com o pai, um homem amargo e cruel que em seus únicos contatos com o filho, o pune, na maioria das vezes de maneira gratuita, como forma de “endurecê-lo” para que “aguente” os golpes da vida. Esses “ensinamentos” são todos violentos e vão todos no sentido de mostrar a criança uma certa misantropia. Já a mãe surge para ele como um porto seguro, mas ela também está inclusa como vítima nesse ciclo de violência, conseguindo escapar através da bebida; se torna nítido o quanto ela não consegue combater a situação, nem por ela, nem pelo filho. Em dado momento, ela o abandona.

A relação pai e filho que já era ruim, piora. Os abusos que antes consistiam em ameaças verbais e castigos físicos, travestidos de lições morais, se tornam abusos sexuais. O primeiro deles vem mascarado de castigo, o que acaba naturalizando os seguintes, tendo a manutenção a partir de ameaças caso conte para alguém.

A produção consegue muito bem mesclar as cenas do passado antigo (infância), o passado recente (nas cenas que mostram o período em que ficou na reabilitação) e o presente, sendo que os flashbacks estão diretamente ligados aos acontecimentos que vive no presente. É interessante que de o período da vida mais estável de Patrick, não é abordado, servindo apenas de prólogo para mais uma das quedas que sofre — depois da morte da mãe e da doação da mansão na Itália. Esse, sendo o momento que nos proporciona com a melhor cena da temporada, na conversa dele com a mãe, em que ele confessa para ela os abusos sofridos e ela afirma que ela também era estuprada por ele, de certa forma catalizando uma catarse silenciosa.

Ao final da história, podemos ver o protagonista confrontando seu passado através de algo que pode ser ou não uma fantasia de enfrentamento ao pai, tendendo ao sim; o discurso é o mesmo que ele internaliza nos momentos de crise, “nenhum ser humano deveria fazer isso com outro”. Talvez seja o necessário para que ele finalmente pudesse superar os fantasmas que o prendiam ao passado, impossibilitando uma estabilidade emocional para colocar a vida nos eixos.

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Felipe
cinetorio

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